Advocacy Fundos Patrimoniais

O IDIS lidera uma iniciativa de advocacy, trabalhando em rede para promover o desenvolvimento dos fundos patrimoniais (endowments) no Brasil. A Coalizão pelos Fundos Filantrópicos é grupo multisetorial composto por 100 membros, entre organizações, empresas e pessoas que apoiam a regulamentação dos Fundos Patrimoniais Filantrópicos no país. Foi lançada em junho de 2018

Conheça aqui esta história:

Visão geral

Até recentemente, não havia legislação que apoiasse a criação de Fundos Patrimoniais Filantrópicos (Endowments) no Brasil. Consequentemente, poucos estímulos existiam e havia apenas um pequeno número de fundos dessa natureza para apoiar Organizações da Sociedade Civil (OSCs). A existência de uma lei para os Fundos Patrimoniais se mostrava relevante para o desenvolvimento deste mecanismo no país. Para isso, em parceria com outras organizações, o IDIS liderou um movimento de advocacy com uma forte produção de conhecimento local, reunindo instituições e profissionais em torno desta causa. Oito anos após o início deste processo, em janeiro de 2019, uma lei foi finalmente promulgada.

Dada a importância dos Fundos Patrimoniais para o crescimento da filantropia em muitos países, esta conquista deve proporcionar um grande impulso à cultura de doação do Brasil.

Contexto

Apesar de Fundos Patrimoniais serem um mecanismo bem conhecido e usualmente aplicado em países da Europa ou América do Norte, eles estão apenas começando a serem implantados em outros lugares.

Alguns dos maiores Endowments do mundo podem ser encontrados nos Estados Unidos e no Reino Unido. Exemplos dos mais relevantes são a ‘Fundação Bill e Melinda Gates’, com um patrimônio avaliado em mais de US $ 50 bilhões, o fundo patrimonial da Universidade de Harvard, avaliado em mais de US$ 37 bilhões e o fundo da Wellcome Trust, avaliado em mais de US$ 30 bilhões.

Nas economias emergentes, essa também emerge como uma tendência com exemplos como a ‘Fundação Mohammed Bin Rashid Al Maktoum’, nos Emirados Árabes Unidos, com US $ 10 bilhões, e na Índia, a ‘Fundação Azim Premji’, que soma US$ 21 bilhões.

No Brasil, até 2019, não havia legislação que regulamentasse esse tipo de mecanismo, ainda que houvesse alguns poucos fundos estabelecidos, como da Fundação Bradesco e da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, ambas ligadas a uma instituição financeira quando fundadas. Até então, não havia um ambiente legal favorável à criação de Fundos Patrimoniais Filantrópicos, tornando a alternativa pouco atraente a investidores.

Realizações

Para mudar este cenário, o IDIS, representante da Charities Aid Foundation (CAF) no Brasil, assumiu o tema como prioritário em sua agenda e buscou criar uma rede de apoio para o desenvolvimento de uma lei nacional de Fundos Patrimoniais. Os pilares inovadores deste movimento incluem uma estratégia dupla de educação e de advocacy. Neste sentido, o IDIS adotou as ações-chave listadas:

1. Lançamento do livro “Fundos Patrimoniais – Criação e Gestão no Brasil”, em 2012, com o apoio da Fundação Vale e da Fundação Ford.

Foi o primeiro livro a abordar esse assunto no Brasil e continua sendo uma referência para organizações, filantropos, acadêmicos, gestores de fundos e reguladores.

2. Criação de grupo de estudos e realização de encontros, que resultaram na elaboração de uma proposta de lei para Fundos Patrimoniais Filantrópicos, com base nas melhores práticas internacionais.

Entre 2012 e 2013, o IDIS criou o Grupo de Estudos de Endowments com o GIFE, a Endowments do Brasil e o JP Morgan. O grupo contou com 90 membros, entre advogados, executivos do Terceiro Setor, promotores públicos, acadêmicos, entre outros.

3. Desenvolvimento de publicações sobre Fundos Filantrópicos.

Em 2016, em parceria com a Levisky Negócios & Cultura e PLKC Advogados, com patrocínio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), da Petrobras e da Caixa Econômica Federal, o IDIS lançou uma série de guias sobre o tema – 1. ‘Conceitos e benefícios dos Endowments como mecanismo de financiamento à cultura’2 – ‘Orientações e informações ao poder público: aspectos de regulação e tributação’3 – ‘Orientações práticas para implementação de Endowments em instituições culturais’. Também foi traduzido um livro importante sobre filantropia e doações – ‘Filantropização via Privatização’ (PtP) – de autoria do professor Lester M. Salamon, da Universidade John Hopkins, além da produção de diversos artigos sobre o tema.

4. Criação de estratégia de advocacy com parceiros da sociedade civil e do setor privado ligados à filantropia.

O grupo definiu princípios fundamentais para uma boa legislação que beneficiaria as OSCs, a filantropia e os investidores sociais. Estes incluíram:

> Ampla abrangência, contemplando diversas causas sociais e organizações sem fins lucrativos que podem constituir Fundos Patrimoniais Filantrópicos

> Existência de incentivos fiscais

> Regras de governança e transparência baseadas nas melhores práticas internacionais

5. Reuniões com representantes do Congresso e autoridades governamentais em vários departamentos, incluindo a Secretaria Geral da Presidência, representantes da Câmara dos Deputados, Senado Federal, BID, BNDES, Ministério da Educação, Cultura e Economia.

Ao longo de seis anos, o IDIS sediou eventos e promoveu diálogos que resultaram em 11 projetos de Lei no Congresso Nacional que buscavam regulamentar os Fundos Patrimoniais no Brasil.

6. Criação e coordenação da Coalizão de Fundos Filantrópicos, fortalecendo as etapas finais do movimento pela regulamentação dos endowments.

Lideradas pelo IDIS e com assessoria jurídica do PLKC Advogados, organizações relevantes se uniram como apoiadoras do movimento: Associação Paulista de Fundações (APF), Cebraf, GIFE, Humanitas 360 e Levisky. Com a adesão de mais de 60 organizações, a Coalizão foi lançada no Congresso Nacional em 2018.

Desafios

O caminho que levou à aprovação da legislação foi longo e imprevisível e o IDIS precisava estar preparado e, ao mesmo tempo, ser flexível. Em 2018, por exemplo, uma infeliz catástrofe – o incêndio que destruiu mais de 90% dos arquivos do Museu Nacional do Brasil –, foi um catalisador para a ação do governo. Michel Temer, presidente na época, assinou uma Medida Provisória para garantir que museus, universidades, outras instituições públicas e organizações sem fins lucrativos possam se beneficiar da criação de Fundos Patrimoniais, melhorando sua sustentabilidade no longo prazo. O IDIS, em nome da Coalizão, divulgou uma nota pública declarando apoio à medida e destacando a importância da inclusão de todas as causas e organizações sociais na abrangência da Lei.

O sucesso de uma ação de advocacy depende, em grande parte de agilidade organizacional. Identificar representantes-chave do governo que poderiam impulsionar a iniciativa é muito importante, mas a capacidade de responder rapidamente a oportunidades que surgem no processo com alternativas concretas, é crucial. Paula Fabiani, diretora-presidente do IDIS esteve sempre diretamente envolvida e foi realizado um investimento dedicado ao tema nos últimos 3 anos para contribuiu com o sucesso da estratégia.

O que foi alcançado

No início de 2019, oito anos depois do início da atuação do IDIS, o governo brasileiro aprovou a Medida Provisória, transformando-a na Lei 13.800, a “Lei dos Fundos Patrimoniais”.

> A regulamentação impulsionará a criação de Fundos Patrimoniais, em especial as OSCs culturais, como museus e orquestras, que se beneficiarão de incentivos fiscais.

> Liderada pelo IDIS, a coalizão se mostrou uma forte estratégia com a adesão de cada vez mais apoiadores da sociedade civil. O tema tornou-se um compromisso fundamental da sociedade civil, a coalizão hoje conta com mais de 70 parceiros e apoiadores para a causa representantes de todos os setores.

> A Lei estabelece as bases para um impacto de longo prazo. Se as maiores fortunas do Brasil doassem 1% de seus ativos para fundos patrimoniais, teríamos US $ 1,2 bilhão destinado a causas.

Aprendizados

> As organizações devem estar atentas a eventos externos que podem gerar oportunidades de apoio político – neste caso, a tragédia do incêndio em um museu;

> Conquistar a aprovação de uma nova lei leva tempo. Uma ação de advocacy bem-sucedida depende de agilidade e perseverança, assim como de disponibilidade ao longo do processo para responder a eventos e oportunidades à medida que surgem;

> Construir uma base sólida de conhecimento, com referências internacionais, é importante;

> Criar uma ampla coalizão foi o aspecto crítico inovador que levou ao sucesso.

 

*Estudo de caso originalmente publicado no WINGS – Worldwide Initiatives for Grantmaker Support: Impact Case Studies: Promoting an enabling environment for philanthropy and civil society.