Modelo canaliza recursos de privatizações e concessões públicas para OSCs

11 de dezembro de 2014

Processos de privatização ou de concessão de serviços públicos costumam envolver bilhões de dólares. Imagine se uma parte desses recursos fosse destinada a fundos que financiem organizações da sociedade civil (OSCs). É isso o que propõe o professor Lester Salamon, diretor do Center for Civil Society Studies da John Hopkins University.

Ele falou sobre o assunto durante a mesa de encerramento do 3º Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais, que ocorreu em 6 de novembro, em São Paulo, com organização do IDIS e do Global Philanthropy Forum (GPF).

“Há um esforço mundial para criar fundações comunitárias, mas isso é prejudicado pela falta de capital”, disse Salamon, para então começar a expor o funcionamento daquilo que chama de “filantropização por meio da privatização” (Philanthropication Through Privatization).

“Em alguns países, havia muito capital em empresas estatais que viviam do dinheiro dos cidadãos quando foram privatizadas”, observou o professor, autor de um detalhado estudo sobre diversos casos em que a privatização foi acompanhada da criação de fundações.

Um dos exemplos mais conhecidos é o da Volkswagen. Quando a montadora alemã foi privatizada, na década de 1960, criou-se a Fundação Volkswagen com parte dos recursos da venda empresa. “Encontramos 539 casos pelo mundo, que mobilizaram um total de US$ 135 bilhões em bens para o setor social privado”, disse Salamon.

Mas a ideia já não seria um tanto datada, uma vez que as ondas de privatização atingiram seu pico nos anos 90? O professor contesta esse dado. “O ano de 2012 foi o terceiro da história em privatizações, e há planos massivos de privatizar bens públicos”.

O Brasil, por sinal, tem muito a se beneficiar com a estratégia. Paula Fabiani, diretora presidente do IDIS e moderadora da mesa, lembrou que “em 2013, o governo anunciou que espera obter U$ 600 bilhões com concessões nos próximos 10 anos; se pensarmos em destinar 1% disso a fundações, estamos falando de U$ 6 bilhões, o que resolve o problema da sustentabilidade do setor”.

O economista José Guimarães Monforte, por sua vez, lembrou que participou de privatizações brasileiras na década de 1990, mas que, naquele momento, não foi possível destinar parte dos recursos para fundações com finalidade públicas. “O processo foi feito por necessidades de caixa do estado”.

Monforte ponderou, ainda, que Brasil oscila entre momentos de maior preponderância do mercado ou do intervencionismo estatal e que, no momento, estamos nesse último ponto de grande presença do Estado.

Falando de um intenso processo que acontece no momento, a advogada portuguesa Cristina Paula Baptista abordou o caso de seu país: “As privatizações estão aumentando a concentração de recursos, já que as empresas estão sendo compradas por grandes grupos privados”. Ela afirmou que seria importante “conseguir canalizar parte dos recursos para instituições, de modo que o rendimento do capital possa financiar o desenvolvimento social”.

Cristina ressaltou, ainda, que o “PtP é um conceito revolucionário, pois coloca para a sociedade civil um instrumento de acumulação de capital financeiro para desenvolver capital social”.

O mexicano Jorge Villalobos, presidente executivo do Centro Mexicano para a Filantropia, também disse que tal instrumento pode ter grande impacto nos países latino-americanos. “Os Estados Unidos têm a cultura de retornar os lucros privados à sociedade, o que criou um poderoso sistema de fundações, enquanto na América Latina dá pra contar nos dedos tais casos”, disse Villalobos.

Salamon lembrou ainda que algumas das fundações surgidas no modelo PtP “estão entre as mais transparentes do mundo, devem respostas ao público porque surgiram com recursos públicos, e, por isso, servem de modelo para todos”. Segundo ele, várias dessas fundações foram constituídas pelo modelo de endowments (ou fundos patrimoniais), o que dá mais segurança para o investidor e uma maior certeza na boa utilização dos recursos. A necessidade de uma legislação específica para os endowments, suja tramitação corre no Congresso, é uma das bandeiras do IDIS. Saiba mais aqui.