CO-FUNDING, UMA ESTRATÉGIA DE SINERGIA NO INVESTIMENTO SOCIAL

9 de junho de 2010

Em artigo, Marcos Kisil, presidente do IDIS, apresenta o co-funding, uma nova forma de contribuir para a transformação social, em que investidores sociais se unem para atuar de maneira estratégica e sinérgica.

Marcos KisilA realidade social brasileira é complexa, as demandas sociais são muitas e os recursos privados destinados a atendê-las são limitados. Diante desse cenário, a criação de parcerias sustentáveis para tornar os investimentos sociais mais eficientes é urgente. Um dos mecanismos para isso é o co-funding, uma forma de fazer de investimento social, que começa a ser adotada no Brasil, com o objetivo de aglutinar recursos e esforços, de forma inteligente, em prol de projetos comunitários.

Mecanismos

Existem três maneiras de realizar co-funding. No primeiro caso, duas ou mais organizações decidem alocar recursos em uma mesma comunidade, mas com objetivos distintos. Assim, por exemplo, uma instituição está preocupada em apoiar os idosos e a outra, as crianças. O fato de existirem dois projetos na comunidade permite uma sinergia local. Os programas podem incitar ações como valorizar a participação comunitária, o desenvolvimento da liderança local ou melhorar o relacionamento entre as organizações que estão recebendo dinheiro. Isso não quer dizer mais ou menos recursos para cada uma delas. É uma oportunidade de se travar um diálogo entre elas para desenvolver as ideias de forma complementar e gerar benefícios sociais decorrentes de oportunidades conjuntas de desenvolvimento, embora com objetivos diferentes.

O segundo tipo de co-funding acontece quando existem dois projetos com foco de atuação similar, mas com preocupações finais diferentes. Para exemplificar, podem-se imaginar duas entidades interessadas em crianças com idades entre 4 e 5 anos, sendo que uma deseja melhorar sua infraestrutura física e outra a qualidade da educação por meio da capacitação dos profissionais. Apesar de serem projetos financiados e gerenciados por grupos distintos, eles se somam no interesse da criança: um novo espaço para uma nova escola de qualidade.

O terceiro movimento ocorre quando duas organizações estão de acordo com o mesmo projeto e, portanto, juntam esforços para realizá-lo. Trata-se da mesma comunidade, do mesmo grupo etário e da mesma proposta de mudança. Nessa situação, existe uma boa simbiose entre os dois doadores. As organizações desde o início trabalham juntas para a fase de diagnóstico situacional, planejamento, desenvolvimento da proposta de trabalho, preparação de orçamento (que contempla claramente o papel de cada um no financiamento das ações), ou no todo do projeto, quando somam seus recursos.

Fruto do acaso

Em geral, quando uma dessas três situações ocorre no Brasil, ela é fruto de um processo casuístico, não planejado. Isso porque a maioria das organizações que atuam como investidores sociais tem o hábito de desenvolver seus próprios projetos – e, especialmente, se elas têm origem empresarial. É comum ver a entidade “A” financiar sua ação, conforme suas necessidades e para apoiar sua imagem institucional. O problema desse tipo de iniciativa é que é facilmente descontinuada. Quem vai querer continuar o financiamento de um programa ou projeto que está ligado à imagem de outra empresa que o apoiou financeiramente antes?

Quando duas organizações trabalham juntas, por outro lado, não existe a “propriedade” do projeto. Como decorrência, as chances de que a ideia seja sustentável e consiga obter novos financiamentos são ampliadas.

Bons exemplos

Algumas experiências de sucesso no co-funding começam a despontar no cenário nacional. O caso mais comum é quando entidades unem-se em torno de uma determinada causa. Aí, existe um conjunto de doadores que não aparecem individualmente, pois estão reunidos não para projetar seu nome ou bandeira de interesse, mas para fazer da causa objeto da sociedade.

Uma área que vem aglutinando múltiplos atores é a educação. O Movimento Todos pela Educação, por exemplo, tem o apoio do Banco Real, da Dpaschoal, da Odebrecht, da Fundação Itaú Social, da Gerdau, do Instituto Camargo Corrêa, da Fundação Bradesco e da Suzano, entre outros. O Fundo Juntos pela Educação, por sua vez, foi criado em 2004, pelo Vitae, Instituto C&A e Instituto Arcor Brasil. Nesse caso, o interessante é que o Vitae saiu da iniciativa, mas os outros dois continuaram, comprovando a sustentabilidade do projeto.

3 passos para o co-funding

Para pensar em co-funding é necessário identificar investidores sociais que estão atuando com o mesmo foco, com especificidades comuns (seja a causa, a área geográfica ou a forma de intervenção) e com o interesse genuíno em ações colaborativas e em parceria. São 3 os passos para uma ação efetiva:

1) Acordar o objectivo: é fundamental definir os propósitos do investimento. Eles devem ser amplos o suficiente para angariar apoiadores, mas específicos o suficiente para ter ações concretas. É importante que as ações estejam alinhadas e claras para o parceiros para que os resultados esperados sejam alcançados.

2) Buscar escala para cumprir os objetivos: é preciso considerar que impacto se está buscando e os fatores críticos de sucesso, avaliar a capacidade de financiamento dos parceiros e, se não for suficiente, avaliar o que pode ser feito.

3) Medir o successo: estabelecer mecanismos para mensurar o êxito da iniciativa em relação aos objetivos propostos, incluindo medidas intermediárias de processo que irão indicar se o projeto está ou não na rota correta. É importante também avaliar como se desenvolve a parceria por meio do co-funding. Os investidores devem apresentar uma posição comum em relação à entidade receptora dos recursos de ambas.
Alguns fatores críticos de sucesso são:

  • Objetivos, métodos e valores comuns e claros;
  • Honestidade em relação ao interesse dos diferentes doadores, da entidade receptora dos recursos, da comunidade a ser atendida em suas necessidades e em todo o processo decisório.
  • Tempo suficiente para acordar a logística e funcionamento da iniciativa;
  • Disponibilidade para comprometer recursos;
  • Persistência na implantação;
  • Relacionamento e fortalecimento das relações pessoais;
  • Comunicação constante e clara.

 
Tendo todos os esses processos e elementos em mente na hora de fazer co-funding, a probabilidade de provocar uma transformação social positiva nas comunidades é alta. Estão todos convidados a tentar!