Esse artigo foi publicado originalmente na Folha de S.Paulo, em 06/12/2024
Por Paula Fabiani, CEO do IDIS
O setor de filantropia no Brasil está passando por um momento de transformação, impulsionado pela crescente demanda por soluções sociais inovadoras e pela necessidade de nova postura diante dos desafios estruturais e conjunturais do país.
O cenário econômico e social, agravado por policrises cada vez mais imprevisíveis, porém constantes, escancara desigualdades agudas, enquanto acelera mudanças nas expectativas sociais e no comportamento de investidores.
Desde que a filantropia atravessou o oceano e ganhou roupagens abrasileiradas, seu foco deixou de ser definido por uma única pessoa e passou a ser determinado pelas prioridades nos territórios.
O setor é desafiado a repensar suas práticas, a partir do que realmente vem sendo demandado pela população. Não há mais espaço para uma filantropia sem pluralidade de vozes.
Inovação é um dos pilares dessa transformação. A atual filantropia exige cada vez mais ousadia, transparência e engajamento estratégico para desenvolver metodologias, parcerias e ecossistemas que possibilitem soluções perenes.
Exemplos disso são modelos como fundos filantrópicos e filantropia comunitária, que buscam superar o imediatismo e adotar estratégias de médio e longo prazo para um impacto social positivo mais sustentável e replicável.
Porém o setor ainda enfrenta muitos nós. Um dos maiores obstáculos é a resistência à mudança dentro do próprio ecossistema. Coragem para inovar envolve, principalmente, enfrentamento de resistências culturais e estruturais, tanto dentro das organizações filantrópicas quanto na sociedade.
Outro desafio importante é governança. Há uma crescente demanda por maior transparência e responsabilidade por parte das instituições filantrópicas.
Doadores, organizações e público em geral esperam ver resultados tangíveis e medidos, o que pressiona organizações a adotarem práticas mais robustas de gestão e prestação de contas, com avaliações sobre o retorno dos valores doados.
Além de tudo isso, o cenário político brasileiro impõe barreiras. A falta de políticas públicas claras e de incentivos fiscais eficientes para doações limita o alcance de muitas iniciativas filantrópicas.
Em contrapartida, a filantropia tem potencial de influenciar essas políticas e promover mudanças, atuando em sintonia com o setor público e as necessidades das comunidades atendidas.
No futuro (não tão distante), espera-se que o papel do investidor social no Brasil evolua de uma postura puramente financeira para uma posição de liderança estratégica.
É essencial que o investidor do futuro compreenda que deve atuar como facilitador de rede, articulador de parcerias intersetoriais e defensor de causas que promovam inclusão, equidade e sustentabilidade. Ele também deve ter a coragem de financiar projetos ousados e apoiar ideias transformadoras.
O futuro da filantropia no Brasil depende da capacidade do setor de se adaptar e inovar em um ambiente em rápida mudança. Para tanto, será necessário vencer resistências, adotar novas abordagens e, acima de tudo, manter um foco claro na missão de reduzir desigualdades e promover o bem-estar coletivo.
Assim poderemos devolver, principalmente aos jovens, a capacidade de sonhar um outro país.