Por Laura Comparato Cardoso – estagiária de consultoria no IDIS
Durante o Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais 2023, discutiu-se sobre diferentes modelos de financiamento e seus riscos calculados para obtenção de retornos transformadores, tema da mesa moderada por Andrea Hanai, gerente de projetos no IDIS, e composta por Fabiana Prianti, Head da B3 Social, Marcel Fukayama, Head de Global Policy na B Lab Global e Co-fundador da Din4mo e da BlendLab, e Rodrigo Hübner Mendes, Fundador e Superintendente do Instituto Rodrigo Mendes.
Incorporando o tema da ousadia, os palestrantes discutiram a necessidade de inovar no setor social para potencializar o impacto do investimento social privado e fomentar o desenvolvimento do país. Algumas das modalidades discutidas, tais como o investimento social privado voltado para o fortalecimento institucional das organizações, o modelo de blended finance, e o investimento em endowments, focam na ampliação do impacto socioambiental e assumem riscos de forma planejada.
A B3 Social é uma organização exclusivamente grantmaker, ou seja, que apoia financeiramente outras organizações da sociedade civil. O seu modelo de filantropia estratégica tem como propósito o combate às desigualdades sociais no país através de aportes institucionais para demais organizações e para endowments, diversificando o seu portfólio de investimento.
Com base na construção de uma relação de longo prazo e de confiança com as organizações beneficiadas, seguindo o princípio de trust-based philanthropy, a B3 Social é capaz de mitigar potenciais riscos associados ao repasse de recursos. Para amenizar o processo de saída do investimento, que pode resultar na interrupção de projetos a ele associados, a organização prioriza uma retirada gradual e busca fortalecer institucionalmente as organizações, contribuindo para a sua autonomia financeira.
Um outro modelo de financiamento inovador é o blended finance, uma forma de investimento misto no qual o capital filantrópico é muitas vezes utilizado para mitigar o risco sistêmico da estrutura, atraindo um maior volume de capital comercial em benefício de causas sociais.
Foi a partir da percepção da dificuldade de famílias das classes D e E para financiarem moradias dignas que surgiu um projeto de blended finance. Foi criado um fundo piloto de R$5 milhões, sendo 60% de capital comercial e 40% de capital filantrópico, capaz de mitigar o risco financeiro. O investimento filantrópico cobre o nível de inadimplência esperado nos empréstimos realizados para as famílias, o que leva a uma redução das taxas de juros e torna os empréstimos mais acessíveis para populações em vulnerabilidade socioeconômica.
Para Marcel Fukayama, o blended finance faz parte de uma mudança de paradigma econômico. Para ele, o comportamento empresarial brasileiro estaria migrando de uma lógica de mitigação de externalidades negativas para uma lógica de geração de impacto positivo. Essa é a lógica necessária para que o Brasil consiga colocar em prática um plano de transição ecológica, baseado em uma estratégia de economia verde e de economia de impacto, e o modelo de blended finance é uma boa alternativa para a viabilização dessa transição.
Por fim, o investimento em fundos patrimoniais – endowments – também é um modelo de financiamento ousado, permitindo uma estabilidade financeira de longo prazo e um planejamento mais ambicioso. Os endowments surgem como alternativa a um modelo de captação muito centralizado em projetos, o que gera incertezas financeiras não só para a própria organização, mas fragiliza o setor como um todo.
O Instituto Rodrigo Mendes é uma das organizações pioneiras na criação de fundos patrimoniais no Brasil e tem por missão a educação inclusiva. Seu endowment está fundamentado em três pilares: (i) visão de longo prazo e uso somente do rendimento real do fundo para perenização do direito à educação para todos; (ii) governança baseada em agilidade e transparência, tendo como elemento estruturante um Comitê de Investimentos voltado para apoiar as decisões em torno da alocação dos recursos no mercado financeiro; e (iii) engajamento através de um Conselho Curador, responsável pelo estabelecimento de metas de captação e atração de investidores.
Rodrigo Mendes conclui: “Toda pessoa pode gerar um legado. Essa herança varia em amplitude e relevância. […] Os endowments têm uma beleza inerente em sua intenção de perenização e longevidade”.
Em suma, foram apresentados três modelos de financiamento capazes de gerar impacto social positivo de longo prazo e mitigar potenciais riscos. É preciso OUSAR para adotar estratégias inovadoras de financiamento, como o blended finance ou o investimento em endowments, assim como, estratégias de fortalecimento institucional de organizações da sociedade civil através de uma instituição grantmaker. Como recado final, o campo filantrópico precisa ter mais OUSADIA para alavancar modelos de financiamento inovadores a fim de promover o desenvolvimento socioambiental no longo prazo, uma vez que as lacunas de desenvolvimento no país são abissais.