Por Renato Rebelo, diretor de Projetos do IDIS
Nota-se nesse assunto uma certa dificuldade de tornar materiais ações e medidas para que o ‘social’ se fortaleça na cultura de empresas e seja, enfim, perene na sociedade. Conheça uma possível solução
A B3 (Bolsa de Valores no Brasil) anunciou no ano passado que passaria a ter novas regras para o seu Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE). As mudanças do ranking partiram principalmente de uma pressão por parte de investidores para que as empresas avaliadas passassem a estar cada vez mais atentas a ações “ESG” (em português, ações “ambientais, sociais e de governança”).
Outra novidade, foi que a B3 passou a publicar abertamente as notas das organizações participantes do índice. E assim aconteceu no final de janeiro deste ano, quando a bolsa divulgou a lista completa com notas gerais e por dimensões – capital humano; governança corporativa e alta gestão; modelo de negócio e inovação; capital social e meio ambiente – das 73 empresas avaliadas.
Entre as 10 primeiras colocadas, a dimensão com menor média de avaliação foi a de capital humano, que averigua questões como diversidade e direitos trabalhistas por exemplo; seguido pelo índice de capital social, responsável por tópicos como investimento social privado e relações com a comunidade. Ambos representando, não apenas, mas essencialmente o “S” dentro de “ESG”.
Nota-se nesse assunto uma certa dificuldade de tornar materiais ações e medidas para que o “S” se fortaleça na cultura de empresas e seja, enfim, perene na sociedade. Uma pesquisa da BNP Paribas (ESG Global 2021) revelou que 51% dos investidores consultados consideraram o “S” o mais difícil de analisar e incorporar às estratégias de investimento. Outra análise, feita pela Global Reporting Initiative (GRI) em parceria com o Deutsche Bank, mostra que apenas 14% das classificações “sociais” compiladas pela GRI são direcionadas a investidores. Em contraste, 97% das classificações ambientais e 80% das classificações de governança têm investidores como seu público principal.
O que as empresas brasileiras deveriam fazer, então, para evoluir na pauta social em suas práticas ESG?
A resposta não é simples, e tampouco é única. Entre os caminhos, há na agenda ESG uma grande oportunidade para repensar a maneira como as empresas dialogam, planejam e alocam o seu investimento social levando em conta sua capacidade de promover transformações sociais atreladas ao alinhamento com o negócio.
O que acontece é que nem sempre as empresas possuem em suas políticas os recursos necessários para lidar com pautas do “S”. E quando elas não suprem lacunas como essa – e o governo também não, é ali onde estão atuantes as organizações da sociedade civil (OSCs). Neste contexto, as empresas devem envolver mais as OSCs em suas iniciativas e, mais do que isso, aprender com elas. Devem colaborar para o desenvolvimento de projetos, manutenção das instituições e criar linhas de investimento direto, uma vez que as OSCs podem ter mais influência e capacidade de execução e transformação junto aos beneficiários do que as empresas.
Por exemplo, no Brasil vemos com nitidez que nos momentos mais difíceis os problemas se concentram nas populações mais vulneráveis, seja na precariedade do sistema ou na falta de trabalho e renda. Ao mesmo tempo, são também nesses atores onde encontramos as chaves para as soluções. Lição disso são as mobilizações gigantescas conduzidas por líderes comunitários em momentos emergenciais, como as realizadas pela CUFA (Central Única de Favelas) que garantem desde necessidades básicas como alimento até fomento ao empreendedorismo nas favelas em todo o país.
Esse é um ponto que não pode mais ser invisível. O Censo GIFE 2020 registrou, inclusive, um crescimento de 11 pontos percentuais na quantidade de investidores sociais focados no ‘fortalecimento da sociedade civil’ em relação ao levantamento de 2018. Ao invés de criar projetos novos e internos à empresa, por que não fortalecer e amadurecer cada vez mais organizações que já estão há anos trabalhando e pensando nessas mais variadas questões?
Este artigo foi publicado originalmente pelo Valor Econômico no dia 02/05.