Por que é importante que o terceiro setor se comunique com a Geração Z?

Por Luisa Lima e Lavínia Xavier

A cultura de doação é caracterizada pelo hábito das pessoas em contribuir com recursos, tempo ou talentos para causas e organizações que beneficiam a coletividade. Sua construção é um processo gradual, moldado ao longo do tempo pelas mudanças, novas demandas socioambientais e, sobretudo, pela participação ativa da sociedade e sua confiança de que essas doações farão, de fato, a diferença.

A juventude desempenha um papel essencial na edificação dessa cultura, trazendo consigo energia, criatividade e perspectivas inovadoras sobre formas de engajamento cívico e filantrópico. O estudo ‘Future of Giving’, conduzido pela sparks&honey, aponta que os jovens buscam mais significado em suas doações e desejam apoiar organizações que gerem impacto sustentável a longo prazo, indicando que o propósito e o sentimento de contribuir positivamente têm mais valor para o grupo do que para qualquer outra geração.

O acesso à informação instantânea pela internet e redes sociais aproxima os jovens aos eventos e desafios globais. Além disso, a educação e sensibilização sobre essas questões estão cada vez mais presentes no cotidiano. À medida que as novas gerações naturalmente desenvolvem uma consciência mais aguçada das questões socioambientais que afetam o mundo, tendem também a desempenharem um papel mais ativo na construção e manutenção de uma cultura de doação de longo prazo.

A Pesquisa Doação Brasil 2022, promovida pelo IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social e realizada pela Ipsos, revelou que 84% dos jovens pertencentes à faixa etária de 18 a 27 anos, conhecida como ‘Geração Z’, efetuaram algum tipo de doação em 2022. Esse dado demonstra um aumento significativo em relação ao levantamento de 2020, no qual 63% dos respondentes dessa mesma faixa declaravam ter realizado doações. As formas mais comuns de doação incluem a contribuição de bens materiais (76%), seguida por doações em dinheiro (43%) e doações de tempo/trabalho voluntário (30%). A Geração Z tende a doar proporcionalmente mais por meio do trabalho voluntário do que o restante da população e menos em dinheiro. Essa discrepância pode ser atribuída à menor renda média desse público se comparado a gerações mais maduras.

A pesquisa também revela que os jovens que fazem doações têm uma tendência significativa a promover ou contribuir de alguma forma para campanhas de arrecadação ou mobilização. Este dado foi confirmado por 7 em cada 10 jovens doadores em 2022, sendo que 20% deles afirmam ter feito isso em mais de uma ocasião. O grupo também demonstra um otimismo maior em relação às Organizações Não Governamentais (ONGs), quando comparados à população em geral. Entre os jovens, 73% concordam que as ONGs desempenham um papel fundamental no combate aos problemas socioambientais, e 83% concordam com a afirmação de que ‘as ONGs dependem da colaboração de pessoas e empresas para obter recursos e funcionar’.

Além disso, mais do que o presente, na Pesquisa Doação Brasil 2022, 52% dos doadores da Geração Z não apenas afirmaram planejar continuar suas doações, como também acreditam que doarão mais em comparação com o ano anterior. Essa abertura indica uma oportunidade para as organizações filantrópicas de se envolverem com a Geração Z.

Algumas iniciativas já compreenderam o potencial da juventude no engajamento com causas socioambientais. Nos Estados Unidos, a DoSomething, autodenominada como um centro de ativismo que inspira os jovens a mudar o mundo, conseguiu motivar milhões deles em todos os estados norte-americanos e em mais 189 países a agirem em prol das questões que afetam suas comunidades. De acordo com a própria organização, esses esforços resultaram em conquistas como o registro de 415 mil novos eleitores nas eleições americanas.

Outro exemplo é a parceria entre o TikTok e a iniciativa britânica Blue Cross, dedicada ao bem-estar animal. A organização recebia uma doação de 1 dólar para cada vídeo compartilhado com a hashtag #PetBFF. A campanha atingiu mais de 500 bilhões de visualizações apenas durante seu ano de lançamento, em 2019. No Brasil, é interessante notar que as mídias sociais desempenham um papel relevante nas decisões de doação, com 25% dos jovens admitindo sua influência nesse processo, em comparação com 17% da população geral. Entre as plataformas mais influentes para o público estão o Instagram (89%), Facebook (37%) e TikTok (13%).

Por aqui, a organização TETO, dedicada à melhoria das condições de moradia, se destaca por seu sólido programa de voluntariado que atrai muitos jovens e universitários, inclusive com um pilar específico voltado para grupos escolares. O ambiente escolar e universitário desempenha um papel significativo na motivação dos jovens a fazerem doações e se envolverem em causas sociais, conforme também demonstra a Pesquisa Doação Brasil. 18% dos respondentes da Geração Z afirmam serem influenciados por campanhas realizadas em seus locais de trabalho, escolas ou faculdades, em comparação com 14% da população em geral.

Esses exemplos evidenciam como a conexão com a juventude e a como a identificação de tendências de comportamento podem gerar resultados, criar oportunidades para o envolvimento ativo do grupo, fortalecendo o terceiro setor e criar uma cultura de doação mais robusta.

É verdade que, apesar de alguns exemplos promissores, ainda são relativamente escassas as organizações e iniciativas do terceiro setor que têm se empenhado ativamente na captação e comunicação direta com o público mais jovem, especialmente no Brasil. Isso pode ser atribuído a diversos fatores, incluindo desafios específicos na identificação das melhores estratégias de comunicação para a Geração Z, bem como a limitação de recursos humanos nas organizações, que frequentemente operam com equipes enxutas.

No entanto, é fundamental que se reconheça a relevância da oportunidade que o terceiro setor possui para envolver mais pessoas e angariar mais recursos ao direcionar seus esforços de comunicação para a Geração Z. É necessário observar de perto o comportamento, as motivações e as tendências desse grupo.

É importante que o terceiro setor brasileiro esteja atento e aberto a se adaptar e se conectar efetivamente com a Geração Z, aproveitando todo o seu potencial. O compromisso dessa geração com causas sociais, aliado à sua proficiência tecnológica, abre novas portas para a inovação e para gerar um impacto significativo. Os jovens de hoje representam o futuro do terceiro setor, e não deveriam precisar esperar para que seu potencial seja reconhecido e demandado.

Geração Z doa mais tempo e dinheiro para causas; pauta é destaque na TV Cultura

Dados sobre os hábitos de doação da Geração Z, revelados na Pesquisa Doação Brasil 2022, demonstram que eles também estão doando. Enquanto, em 2020, 63% deles diziam ter realizado algum tipo de doação, em 2022 o número chega a 84%, igualando-se à média nacional. Os destaques de doação nesse recorte estão principalmente para doadores de bens (76%) e trabalho voluntário (30%).

O tema foi destaque em uma reportagem veiculada na TV Cultura.

“A Geração Z atua de várias maneiras, ela não faz apenas a doação financeira. Ela doa muitos bens e faz bastante trabalho voluntário”, diz Paula Fabiani, CEO do IDIS.

Confira o vídeo da matéria na integra:

Pesquisa Doação Brasil e hábitos da Geração Z são destaques no Valor Econômico

A Geração Z revelou ser socialmente mais consciente e engajada com as causas socioambientais, de acordo com os resultados da Pesquisa Doação Brasil 2022. O comportamento do grupo em relação às doações foi destacado em uma reportagem do jornal Valor Econômico.

Neste ano, a pesquisa se aprofundou nas percepções e práticas dos jovens em relação às doações. A Geração Z demonstra possuir uma visão mais positiva das ONGs em comparação com a população em geral e também é mais influenciado pelas redes sociais a contribuir com ações sociais.

“Os jovens possuem uma visão mais positiva e são mais otimistas em relação ao trabalho das ONGs. Isso me faz ficar otimista quanto à formação de uma cultura de doação no país”, afirma Paula Fabiani, CEO do IDIS.

Confira a matéria na íntegra. 

 

Analisando a Geração Z | Pesquisa Doação Brasil 2022

Por Maurício de Almeida Prado, Diretor Executivo da Plano CDE

“Falhamos em deixar um Brasil melhor para nossos filhos, mas conseguimos deixar filhos melhores para o Brasil”. Com essas palavras o executivo Fábio Barbosa definia, em uma entrevista para a revista Carta Capital, suas expectativas com uma geração que seria supostamente mais consciente de seu papel frente a questões sociais e ambientais do que a dele.

Mas será que as novas gerações têm mesmo uma postura diferente? Uma das formas de entender essas diferenças é olhando para uma questão muito importante em sociedades de todo mundo: a disposição para fazer doações e o envolvimento com a filantropia. Para isso, nada melhor do que analisarmos os dados e evidências levantados pela recém-lançada pesquisa Doação Brasil, coordenada pelo IDIS e realizada pela Ipsos Brasil.

No estudo, que ouviu mais de 1.500 pessoas em todo o País, podemos comparar as respostas do público da faixa etária de 18 a 27 anos – que costuma ser classificado como Geração Z – com o restante da população.

 

A Geração Z e as doações

Geração Z é nome dado ao grupo de pessoas nascidas entre os anos de 1995 e 2010. Como a pesquisa “Doação Brasil” foi realizada apenas com maiores de 18 anos, usaremos o recorte de 18 a 27 anos para esta análise.

O primeiro achado deste estudo é que os jovens da Geração Z estão doando mais do que há dois anos.  Na pesquisa recém-lançada, coletada em 2022, 84% dos jovens da Geração Z disseram ter feito alguma doação no último ano, frente a 63% na pesquisa de 2020. Isso demonstra um crescimento expressivo da prática de doação por esta faixa da população.

As doações mais realizadas foram de bens materiais (76%), seguidas por dinheiro (43%) e doação de tempo/trabalho voluntário (30%). Interessante notar que a Geração Z doa proporcionalmente mais em forma de trabalho voluntário do que o restante da população (30% contra 26%) e faz menos doações em dinheiro (43% contra 49%) do que a população em geral). Essa diferença pode ser explicada pela menor renda média deste público frente as gerações mais velhas, sendo que a maior doação de tempo pode indicar uma oportunidade para as organizações filantrópicas.

 

Jovens acreditam mais na sociedade civil e confiam mais na ONGs

Quando perguntados sobre quem deveria ser responsável pelas soluções dos problemas sociais e ambientais no Brasil, os jovens da Geração Z conferem maior responsabilidade às ONGs e empresas do que à população em geral, que atribui um peso maior ao governo para resolver essas questões (indicam as ONGs 91% contra 84% da população/indicam as empresas 96% contra 92% da população).

É no entendimento do papel das ONGs na sociedade e na confiança em sua atuação que a Geração Z apresenta as maiores diferenças em relação ao restante da população. Elas concordam mais que as ONGs são necessárias para ajudar no combate aos problemas sociais e ambientais (74% contra 67%), entendem melhor que a ação das ONGs leva benefícios a quem realmente precisa (74% contra 58%) e compreendem melhor o papel das ONGs na sociedade (73% contra 65%).

Também demonstram claramente uma maior confiança nessas organizações, uma vez que concordam mais com a afirmação “A maior parte das ONGs é confiável” (39% contra 31%), com que “ONGs dependem da colaboração de pessoas e empresas para obter recursos e funcionar” (83% contra 75%) e confiam mais na transparência da atuação das ONGs (39% contra 31%).

No estudo “Conservadorismo e questões sociais”, realizado pela Plano CDE para a Fundação Tide Setubal, foram levantadas algumas hipóteses que explicariam a desconfiança de parte do público conservador mais idoso em relação às ONGs. Os entrevistados relataram em pesquisas qualitativas uma dificuldade de confiar em ONGs que não conheciam direito, com certa generalização de uma imagem negativa dessas organizações. Porém, quando mencionadas ONGs que eram próximas fisicamente e conhecidas dos entrevistados, como as da igreja do bairro, estas eram apontadas como merecedoras de confiança por esse público. Havia certa dicotomia entre a imagem da ONG distante e intangível e a imagem da ONG local, próxima, tangível e confiável.

Mais do que dar transparência ao trabalho das ONGs através de relatórios, parece haver a necessidade de uma aproximação com esses públicos, que já consolidaram uma imagem de desconfiança de algo que, muitas vezes, aparece como distante e incerto. Trazer esse público para perto, com envolvimento direto nos projetos, poderia ser uma forma de aproximação para diminuir essa desconfiança e aumentar as doações.

Por outro lado, a maior confiança em ONGs por parte da Geração Z traz uma enorme oportunidade para o campo da filantropia amplificar sua participação na sociedade civil, não apenas com a captação de recursos, mas também com o envolvimento direto dessa parcela da sociedade em seus projetos.

 

Uma geração que doa com menos desconfiança

Quando olhamos as visões da Geração Z sobre a doação em geral, percebemos também uma relação de menor desconfiança do que no restante da população. Eles concordam menos com as frases “Não tenho confiança no que vão fazer com meu dinheiro, se doar” (37% contra 45%) e “Algumas doações beneficiam pessoas que não merecem esta ajuda” (43% contra 53%).

Outros aspectos que demonstram maior confiança nas doações por esse perfil mais jovem é que eles concordam menos com as frases “Eu acredito que é melhor dar dinheiro diretamente a quem precisa sem intermediários” (36% contra 46%) e “Eu penso que não devemos dar dinheiro, mas alimentos e bens” (45% contra 53%). Há claramente maior confiança em intermediários (que podem ser entendidas principalmente como as ONGs) e mesmo na real necessidade do beneficiário — quando veem menos problema em dar dinheiro do que as outras gerações, que, proporcionalmente, preferem doar alimentos e bens, com certa desconfiança de seus usos quando da doação realizada em dinheiro.

Fica aqui o desafio de aproveitar a oportunidade criada pela maior confiança em doações e nas próprias ONGs dessa parcela da sociedade para se criar uma cultura de doação focada nesse público.

 

Por que os jovens doam e quem os influencia?

As principais motivações dos jovens nas doações estão ligadas a três fatores: os objetivos/temáticas das causas, participação cidadã e a aspectos pessoais/emocionais. Logo, vemos como principais respostas: acredito nessa causa que ajudo (94%), seguida pelo sentimento de fazer a diferença (89%) e do entendimento de que todos devem participar da solução dos problemas sociais (88%). Na sequência, temos “Porque me faz bem”, com 88% das respostas, e “Porque me ajuda no meu desenvolvimento como pessoa”, com 76%. O que mais diferencia a Geração Z é que, para esse grupo, as doações são menos motivadas por motivos religiosos (44% contra 55% da população em geral).

As principais influências dessa geração na hora de doar são: familiares e amigos, grupos religiosos e abordagens na rua – o que é similar à população em geral. Porém, para a Geração Z há uma importância maior de influenciadores/redes sociais do que para a população em geral (25% contra 17%). A rede social que mais influencia esse grupo a doar é o Instagram (89%), seguido pelo Facebook (37%) e TikTok (13%).

As causas que mais receberam doações dessa geração foram: crianças (38%), seguidas por combate à fome (26%), população de rua (20%) e situações emergenciais (19%). As causas/públicos que mais diferenciam essa geração em relação ao restante da população são: população de rua (20% contra 15%) e causa animal (9% contra 5%).  Quando perguntados sobre seu envolvimento além das doações, 62% dos jovens dessa geração já se envolveram em outras ações sociais, para além das doações realizadas.

A maior importância das redes sociais para o engajamento desse público deve subsidiar as estratégias das ONGs em sua comunicação.

Por outro lado, quando vemos que quase dois terços dos jovens (62%) já se envolveram com a filantropia para além das doações, reforçamos a ideia de uma geração com maior potencial de participação no campo.

 

O papel socioambiental das empresas importa muito para essa geração

Quando olhamos para as percepções dessa geração em relação ao consumo e às práticas das empresas, notamos que esse perfil declara rejeitar mais a compra de produtos de empresas envolvidas com práticas inadequadas do que a população geral (83% de rejeição contra 77%).

Já um estudo sobre a Geração Z realizado pela consultoria Deloitte em 2023 aponta que os jovens dessa geração consideram que suas empresas estão evoluindo em questões de diversidade e impacto socioambiental. Porém, a maioria ainda percebe que suas empresas não estão fazendo o bastante nessas frentes.

Seja como consumidores ou colaboradores, os jovens da Geração Z demonstram estar atentos à atuação das empresas, impondo um desafio para que as organizações acelerarem suas atuações em ASG (ambiental, social e governança).

 

Conclusões

A análise dos dados da pesquisa “Doação Brasil”, no recorte dos jovens da Geração Z, demonstra maior entendimento do papel da sociedade civil por esse público, com empresas e ONGs tendo uma importância similar a governos na solução dos problemas socioambientais. Mais do que isso, vemos uma relação de maior confiança no trabalho das ONGs e destinação de suas doações e um interesse no envolvimento direto com seus projetos. A comunicação com essa geração deve considerar a importância das redes sociais para esse público nas estratégias de engajamento e captação. Por fim, temos essa parcela da população com um olhar mais crítico frente a atuação das empresas – o que deve ser um ponto de atenção às estratégias ASG dessas organizações.

Os achados deste estudo apontam para caminhos interessantes de planos de ação focalizados no público jovem que apresenta uma pré-disposição maior em participar de filantropia – uma grande oportunidade de alavancarmos a cultura de doação em nosso país.