Texto publicado originalmente na Folha de S.Paulo
Por Paula Fabiani, Luisa Lima e Marina Negrão
O 18º Relatório de Crises Globais do Fórum Econômico Mundial preconiza que “choques simultâneos, riscos profundamente interligados e a erosão da resiliência estão originando o risco de uma policrise – onde crises díspares interagem de forma que o impacto global excede em muito a soma de cada parte”.
A crise climática está conectada ao agravamento da fome e ao aumento de refugiados. A guerra na Ucrânia amplia o debate sobre o uso de energia fóssil, e a crise sanitária deflagrada pela pandemia de Covid-19 levou países a repensarem estruturas de distribuição de renda, moradia, acesso a saneamento básico e a própria cooperação internacional.
Os problemas interagem entre si, estão entrelaçados. É uma crise múltipla, cujas partes se retroalimentam e avança com uma velocidade e escala nunca antes experimentadas.
Este cenário foi o ponto de partida para a nova edição do Perspectivas para a Filantropia no Brasil, publicação anual do IDIS, que explicita os movimentos que são importantes para o agora, que se destacam e para os quais filantropos, investidores sociais e todos aqueles que atuam neste campo devem estar atentos.
Não por acaso, a primeira perspectiva da lista, que traz oito achados, revela como a filantropia começa a responder de forma integrada, propondo-se a contribuir para mudanças estruturantes.
A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, por exemplo, é um movimento composto por mais de 350 representantes do setor privado, setor financeiro, academia e sociedade civil, que têm como objetivo articular múltiplas causas e facilitar ações para promover o uso harmônico, inclusivo e sustentável da terra no país e assim viabilizar a transição para a nova economia.
A seis anos do prazo para o cumprimento da Agenda 2030, proposta pela ONU, crescem os compromissos públicos. Governos assinam tratados e cartas de intenção. Empresas divulgam metas, adotam novos modelos de negócios e reorientam suas práticas de investimento social para gerar transformações positivas.
Os detentores de grandes fortunas declaram que parte do que possuem será destinado à promoção da justiça social. Neste cenário, um risco: os ‘washings’, termo em inglês que significa ‘lavagem’ e que foi adotado para denominar discursos falsos e pouco ancorados em fatos.
Ou seja, compromissos assumidos podem não passar de promessas vazias, que não se concretizam ao longo do tempo. No Brasil, é crescente também iniciativas filantrópicas regionais, mais atentas às demandas dos territórios onde atuam, com uma abordagem mais sensível às particularidades locais.
O momento do país, que busca voltar a ter protagonismo na agenda ambiental, também é explorado. Mesmo organizações que atuam em temas específicos como educação ou cultura se veem estimuladas a olhar para sua relação com o meio ambiente e mudanças climáticas.
O relatório chama atenção ao fato de a filantropia beneficiar também a infraestrutura do Terceiro Setor, investindo em ações que promovem a melhoria do ambiente regulatório, apoiando a geração de dados e ações para incidência coletiva, como a Coalizão pelos Fundos Filantrópicos, que teve papel importante para a conquista da primeira legislação sobre Fundos Patrimoniais no Brasil.
Outros aspectos abordados são a adoção de processos de avaliação de impacto por empresas e sua contribuição à Agenda ESG, a importância da diversidade em conselhos e o uso da Inteligência Artificial por organizações sociais.
A recém-lançada publicação apresenta uma fotografia mais nítida do horizonte do investimento social e é um convite à reflexão e à ação. Uma contribuição dos profissionais do IDIS para um futuro resiliente e sustentável em todas suas instâncias.