Por Thérèse Hofmann Gatti Rodrigues da Costa, doutora em Desenvolvimento Sustentável pelo CDS/UnB, coordenou a etapa de capacitação do Programa Brasil Voluntário do Ministério de Esportes na Copa do Mundo 2014.
Ser voluntário é um ato de mão dupla, pois você doa e recebe na mesma proporção. A pessoa doa o próprio tempo, o conhecimento que tem, a experiência em determinado assunto. E, ao ser voluntário, há ganhos na oportunidade de interagir com outras pessoas, de receber outros conhecimentos e de ter como retorno a vivência de uma nova experiência. Mais do que tudo, ao ser voluntário, cada um tem a satisfação de simplesmente fazer o bem.
Em 2013 e 2014, o Brasil recebeu dois grandes eventos mundiais de futebol, que foram a Copa das Confederações e a Copa do Mundo. Para fazer frente ao grande número de visitantes que o País estimava receber, o governo federal da época organizou ações de voluntariado público para atuar em áreas externas aos estádios de futebol e com ações mais diversificadas, do que se estabeleceu ser o programa de voluntários da FIFA no Brasil. Estando à frente do Decanato de Extensão da Universidade de Brasília, naquele momento recebemos a proposta de ser parceiros do Ministério do Esporte no desafio de organizar a capacitação do programa Brasil Voluntário.
Apresentamos ao Ministério do Esporte, em conjunto com o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia, um projeto integrado de ensino, pesquisa e extensão para a capacitação dos voluntários. As metodologias desenvolvidas, tanto para a ensino a distância (EAD) quanto para a capacitação presencial, foram inovadoras e inéditas à época. Os projetos propiciaram várias inovações em termos de capacitações em grande escala: ensino a distância, capacitações presenciais simultâneas, logística de organização das atuações, desenvolvimento de material didático sobre o tema, metodologia inovadora e a certificação digital inédita, nos moldes estabelecidos pelo Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), que foi disponibilizada pela Universidade de Brasília.
O desafio que tivemos ao coordenar a capacitação, primeiro nas seis cidades-sede (Salvador, Brasília, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife e Fortaleza) da Copa das Confederações e depois nas 12 cidades-sede (Belo Horizonte, Brasília, Cuiabá, Curitiba, Fortaleza, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo) da Copa do Mundo, foi de uma complexidade ímpar. A experiência adquirida com estes dois eventos nos habilitou a encarar outros desafios posteriores de forma muito mais serena.
Tivemos grandes aprendizados e contamos com parcerias inestimáveis das universidades públicas, estaduais e federais de cada uma das cidades-sede. Foram sete universidades parceiras na Copa das Confederações e 17 na Copa do Mundo. Grupos de voluntários ligados a movimentos religiosos somaram-se a nós, sendo também parceiros fundamentais para o sucesso dos eventos.
Inestimável, e super acertada também, foi a parceria que fizemos com o Corpo de Bombeiros de cada cidade sede. Capitaneados pelos oficiais do Corpo de Bombeiros de Brasília, a atuação na capacitação em primeiros socorros e segurança realizada presencialmente em cada cidade – e que contou com a atuação direta dos oficiais das corporações locais – foi um sucesso total. As capacitações de Ensino a Distância, realizadas no portal Brasil Voluntário em plataforma moodle especialmente, customizada para os eventos e depois as capacitações presenciais, permitiram aos cidadãos uma formação não só para atuar nas Copas, mas para a vida. Nas palavras de vários voluntários, registradas em vídeos ao longo das capacitações, toda a experiência adquirida naquele momento já vislumbrava que poderia ser utilizada para outros momentos da vida deles.
A idade mínima para participar nos eventos da Copa foi de 18 anos. Tivemos cidadãos das mais diferentes idades, engajados nos eventos. Famílias inteiras se disponibilizando para atuar, pais e filhos fazendo a capacitação em conjunto, foram momentos realmente indescritíveis.
Creio que como um dos legados temos o sentimento de um momento de cidadania plena. Quem foi capacitado para ser voluntário e atuou nas Copas vivenciou uma grande satisfação de poder fazer o bem, de ajudar turistas, de conhecer pessoas diversas nos eventos, de poder mostrar para o mundo que o brasileiro é acolhedor, cordial, honesto, profissional e que ama o país.
Percebo que houve uma grande e positiva exposição da Lei do Serviço Voluntário. Cito a lei 9.608 de 1998, vigente à época e desconhecida de muitos até aquele momento, que abriu caminho para outras atuações posteriores e para o aprimoramento da legislação sobre o tema.
Apesar de várias tentativas de estigmatizar o voluntário à época, por conta de questões políticas daquele momento, tentando associar o voluntário a um ’otário‘, o que vimos foram milhares de cidadãos conscientes do seu papel e com autoestima muito elevada, rechaçando qualquer pecha que pudesse menosprezar a importância do papel que estavam desempenhando.
A Pesquisa Voluntariado no Brasil 2021, em sua terceira edição, legitima o trabalho de milhares de voluntários na construção de um Brasil melhor, tanto no presente, quanto para as gerações futuras.
Este artigo integra uma série de conteúdos escritos à convite dos realizadores da Pesquisa Voluntariado no Brasil 2021, com intuito de analisar e enriquecer os achados do estudo. Não nos responsabilizamos pelas opiniões e conclusões aqui expressadas.
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