Você já ouviu falar em Investimento Social Privado? O termo é um sinônimo do que conhecemos como filantropia estratégica, uma prática que passou por transformações ao longo do tempo.
Até o século XIX, a filantropia ainda era um conceito bastante ligado às doações esporádicas e assistencialistas feitas por famílias de alto poder aquisitivo ou por igrejas. Enquanto isso, entre as empresas, em plena revolução industrial, pouco se falava sobre o assunto.
Apenas por volta de 1950 é que surge o conceito de responsabilidade social corporativa, que passa a considerar a empresa como corresponsável pelo contexto socioambiental em que está inserida e sugere a atuação de forma intencional para soluções externas, buscando compensar algum dano causado à sociedade; e internas, buscando promover práticas éticas, sustentáveis e socialmente responsáveis dentro da própria organização.
No fim década de 1980 o assunto ganha força com o crescimento da pauta da sustentabilidade, que é muito mais ampla, e considera o equilíbrio das dimensões ambiental, social e econômica.
Já no final do século XX, por fim, surge o conceito de investimento social privado (ISP), propondo que os recursos alocados em projetos socioambientais não sejam mais encarados como despesas, mas como investimentos que trazem retornos – tanto para a organização, quanto para sociedade, comunidade e meio ambiente. Quando a camada de intencionalidade passa a fazer parte das decisões sobre doação, passamos a nos referir à filantropia estratégica.
Neste texto, você entende o conceito de investimento social privado e mais sobre sua evolução.
O que é o investimento social privado e por que é importante?
O investimento social privado (ISP) é, resumidamente, a destinação voluntária e estratégica de recursos em benefício da sociedade. Esses recursos não são necessariamente apenas financeiros, podendo incluir mão de obra, tecnologia, produtos, inteligência, entre outros.
Também são variadas as formas de realização, já que a prática pode acontecer por meio do desenvolvimento de iniciativas próprias – por exemplo, quando uma empresa decide criar um projeto de educação para pessoas em situação de vulnerabilidade. Ou pelo repasse de recursos para ações e projetos desenvolvidos por terceiros, como o apoio a uma ONG ou coletivo que já esteja engajado em uma causa e já possua projetos estruturados nesse sentido.
Quando uma empresa decide implementar ações de ISP, ela geralmente procura identificar áreas em que suas ações podem ter o maior impacto positivo possível. Isso significa escolher áreas em que a empresa tenha expertise, recursos ou uma presença significativa, para que suas contribuições sejam mais eficazes e possam gerar mudanças relevantes. Para identificar pontos de sinergia entre o negócio e as oportunidades de investimento social, é necessário conhecer os principais indicadores sociais e ambientais dos locais em que a empresa atua, os elementos chave de sua cadeia de produção, o perfil do beneficiário do programa, entre outros aspectos relevantes.
Ao realizar um investimento social estratégico, a empresa se compromete com a sustentabilidade de seus entornos, apoiando, inclusive, ações que podem estar alinhadas com agendas globais, como os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).
O mecanismo não é apenas benéfico para causas e organizações apoiadas, mas para as empresas que o praticam. Alinhar o posicionamento da marca a causas sociais comunica uma mensagem positiva para a sociedade, reforça os valores e o propósito da empresa, além de promover sua aproximação com a comunidade em que atua.
A pesquisa Edelman Trust Barometer 2022, que mede a confiança das pessoas nas instituições, mostrou que, no Brasil, valores e posicionamentos das empresas são determinantes para pessoas comprarem ou defenderem marcas (65%), para escolherem um lugar para trabalhar (58%), ou para investirem em empresas (60%).
Outro estudo, a Pesquisa Doação Brasil 2022, que avalia o comportamento do doador individual brasileiro, demonstrou que mais pessoas passaram a considerar empresas como corresponsáveis pelas soluções dos problemas do país. 92% dos respondentes concordavam com a afirmação naquele ano, comparado a 82% na edição de 2020 e 34% em 2015.
O Investimento Social Privado tem a ver com o ESG?
Continuando a evolução da discussão sobre responsabilidade empresarial, no início do século XXI foi cunhada a sigla ESG (a partir das iniciais em inglês de ‘Ambiental’, ‘Social’ e ‘Governança’). Ela se tornou muito importante porque traz para a conversa os investidores financeiros, que passam a considerar em suas decisões o alinhamento de uma empresa às boas práticas nas três dimensões. Torna-se um critério para estabelecer o valor da companhia. Novamente, segundo o Edelman Trust Barometer 2022, 88% dos investidores avaliam o posicionamento ESG das empresas tão rigorosamente quanto outros indicadores.
E o que isso tem a ver com ações de ISP? O investimento social privado é justamente um caminho para que empresas atinjam metas e compromissos ESG. Por meio da filantropia estratégica, as empresas podem direcionar recursos para projetos, organizações da sociedade civil (OSCs) e iniciativas que contribuam para o desenvolvimento socioambiental da comunidade. Como entendemos que o ISP atua alinhado ao negócio, a agenda ESG torna-se uma aliada na formulação dessas práticas, mensurando e mitigando riscos não financeiros.
Investimento Social Privado no Brasil
Por aqui, a prática de Investimento Social Privado é encontrada em muitas empresas, mas ainda há muito espaço para crescimento. Dados do Censo GIFE 2022-23 revelam um panorama interessante. Em 2022, o valor total investido pelas organizações respondentes foi de R$ 4,8 bilhões. Em 2021, o volume foi de R$ 4,4 bilhões, ou seja, houve um crescimento significativo.
No entanto, os números ainda não se equiparam a 2020, quando o valor alcançou R$ 6,1 bilhões, o maior desde o início da série histórica. Há uma explicação para isso. O pico, em grande parte, pode ser atribuído ao contexto da pandemia. A crise sanitária teve um impacto direto nas estratégias de investimento das empresas, levando a uma ampliação nos recursos destinados a projetos sociais. Temos assim, um indicativo do potencial de ISP que podemos perseguir.
Mesmo com esse ponto fora da curva, os números de 2021 e 2022 são maiores do que a média anterior à pandemia, indicando uma tendência geral de crescimento do Investimento Social Privado no Brasil. Com isso, temos diante de nós uma oportunidade de reflexão e busca por novas abordagens para impulsionar o Investimento Social Privado.
O IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social é uma organização social independente fundada em 1999 e pioneira no apoio técnico ao investidor social no Brasil. Nossa atuação baseia-se no tripé geração de conhecimento, consultoria e realização de projetos de impacto, que contribuem para o fortalecimento do ecossistema da filantropia estratégica e da cultura de doação.
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