Por Stephany de Lucena Costa, estagiária de projetos no IDIS
Afinal, como é possível construir pontes dentro do processo de monitoramento de projetos? Essa foi a pergunta que Ana Fontes, fundadora da Rede Mulher Empreendedora (RME) e do Instituto RME; Jessie Krafft, CEO da CAF America; Letícia Born, diretora associada da Co-Impact para a América Latina e no âmbito global; e o moderador Wesley Matheus, secretário de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas e Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento e Orçamento, buscaram responder em uma das plenárias do Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais 2025.
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O monitoramento e a avaliação aparecem não apenas como instrumentos burocráticos ou de controle orçamentário, mas, sobretudo, como ferramentas de cuidado, acompanhamento e aprendizado. Para isso, é fundamental que o fluxo avaliativo abandone a lógica top-down, isto é, de imposição de financiadores e tecnocratas, e seja reconstruído em uma perspectiva bottom-up. Isso significa que os saberes e desejos do público-alvo, bem como da sociedade civil, precisam ser considerados em todo o processo. Como destacou Ana Fontes, a inclusão dos beneficiários, com indicadores “menos duros” e mais próximos da realidade vivida, colabora para gerar impacto e consolidar ciclos de prosperidade.
Também se evidencia a necessidade de construir pontes entre financiadores e executores. Letícia Born chamou a atenção para o risco de comprometer investimentos quando se olha apenas para a “falta” de resultados imediatos. Como afirmou a própria Letícia:
“A gente precisa entender que transformação sistêmica leva tempo, e que se a gente ficar olhando só para o que não aparece no curto prazo, corre o risco de comprometer o investimento. Às vezes, o impacto está sendo construído, mas não é imediatamente visível. E aí entra a importância da confiança entre quem financia e quem executa”.
Em contraste com a ideia da “avaliação monstro”, proposta por Karen Mokate no artigo Convirtiendo el “monstruo” en aliado: la evaluación como herramienta de la gerencia social (2002), que define avaliações pautadas pelo controle e pelo teor de auditoria, a construção de relações mais harmônicas entre as partes fortalece os projetos. Isso passa pela criação de elos de confiança que permitam ajustes ao longo da execução, tornando o monitoramento um processo dinâmico de aprendizado e não apenas de fiscalização.
CONSTRUINDO A AGENDA PÚBLICA: O PAPEL DAS OSCS
Importa destacar ainda que os fluxos de monitoramento e avaliação não devem ser observados apenas no terceiro setor, mas também no primeiro – o Estado –, já que as organizações sociais têm papel fundamental na formulação de políticas em rede. Entendidas como políticas públicas construídas por meio da articulação entre Estado, sociedade civil e outros atores, elas ganham densidade quando as organizações atuam como policy entrepreneurs. Ou seja, como empreendedores de políticas que mobilizam capacidade técnica, redes de influência e legitimidade social para introduzir temas na agenda pública e incidir diretamente sobre decisões governamentais.

Como lembrou Jessie Krafft, tais organizações “preenchem buracos vazios”. Em suas palavras, “bom, o que nós estamos buscando agora é ver como diferentes organizações e doadores podem nos ajudar a preencher algumas dessas lacunas, mas também dado o fato de que o USAID […] basicamente desapareceu”. Ana Fontes complementou, mostrando como as pesquisas anuais sobre empreendedorismo feminino, realizadas pelo Instituto RME, já serviram de base para políticas de crédito e gênero. Assim, monitoramento e avaliação, quando bem estruturados, deixam de ser meros relatórios e se tornam alavancas de transformação pública.
Esse debate se amplia ainda mais quando observado sob a lente internacional. Krafft ressaltou os cortes recentes da USAID e a redução de financiamentos internacionais, somada a crises políticas e conflitos em diversas regiões, que criam um ambiente de incerteza para o terceiro setor. Ao mesmo tempo, cresce o movimento de doações individuais e locais, revelando novas possibilidades de sustentabilidade. Nesse cenário, a tensão entre financiamento restrito e irrestrito mostra-se decisiva: quanto maior a flexibilidade, maior a capacidade de resposta das organizações diante de crises e maior também o potencial de promover transformações sistêmicas de longo prazo.
Diante desse panorama, torna-se evidente que a construção de pontes por meio do monitoramento é não apenas viável, mas necessária, e que é possível “esperançar”, mesmo em tempos de incertezas político-sociais. Para isso, é imprescindível compreender que a criação de pontes não deve se restringir apenas a grandes organizações, financiadores ou ao poder público, mas envolver toda a sociedade civil. Nesse contexto, o monitoramento bottom-up mostra-se essencial para gerar informações valiosas, que devem retornar às comunidades beneficiárias e a todos os envolvidos em cada projeto, fortalecendo o empoderamento local. Essa forma de monitoramento só se sustenta quando há valorização dos saberes e atores locais, reconhecendo que o compartilhamento de informações, especialmente em contextos desiguais, é também uma poderosa estratégia de fortalecimento comunitário.
Por fim, como lembraram os palestrantes em suas falas finais, “esperançar” também significa aceitar riscos e cultivar confiança. Isso exige a construção de uma cultura filantrópica colaborativa, que valorize aprendizado, diálogo e corresponsabilidade, em vez do medo de não alcançar metas imediatas. Assim, monitoramento e avaliação deixam de ser meros mecanismos de cobrança para se converterem em verdadeiras pontes de transformação, tanto para as organizações sociais quanto para a sociedade em seu conjunto.
Fotos: André Porto e Caio Graça/IDIS.





No dia 24 de junho, haverá entre 6 e 7 opções de minicursos disponíveis na programação com cerca de 6h de duração cada um. Denise Carvalho, Gerente Sênior de Monitoramento e Avaliação no IDIS, especialista na metodologia SROI (Social Return on Investment ou Retorno Social sobre o Investimento) e Daniel Barretti, também gerente de projetos no IDIS, ministrarão minicurso sobre esse tema.
No artigo intitulado ‘Avaliação de Impacto para Inclusão Produtiva: Metodologias, Desafios e Limitações’,
O lançamento da Revista aconteceu na sexta-feira, 27 de outubro, e Paula Fabiani participou como mediadora na mesa ‘Avaliar é preciso: casos práticos de avaliação de programas e políticas’ ao lado de Sérgio Firpo, Secretário de Monitoramento e Avaliação de políticas públicas e Assuntos Econômicos; Paula Pedro, Diretora-Executiva no J-PAL LAC; Wesley Matheus, Diretor Colegiado da Rede Brasileira de Monitoramento e Avaliação e João Paulo Bittencourt, Gerente de Educação no Albert Einstein, voluntário do Instituto Proa e coautor do relato “PROA INDEX: avaliação fidedigna na formação profissional online de jovens.





