Tecnologia tem o potencial de trazer mais eficiência ao terceiro setor, mas seu uso exige senso crítico e atenção à diversidade
Artigo originalmente publicado na Folha de S. Paulo, 13/06/2025
Por Paula Fabiani, CEO do Idis (Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social) e destaque no Prêmio Empreendedor Social 2020
Os desafios sociais e ambientais que enfrentamos exigem respostas à altura de sua complexidade. Diante de crises interligadas —mudanças climáticas, desigualdades sociais, insegurança alimentar e acesso precário à saúde e educação— a busca por soluções precisa ir além dos caminhos tradicionais.
A IA (inteligência artificial) desponta como uma aliada estratégica, capaz de potencializar ações, ampliar o impacto e acelerar transformações sociais urgentes.

Dado Ruvic/REUTERS
Na última semana, tive a oportunidade de participar do Google.org Impact Summit, em Londres. O evento reuniu lideranças do setor social, filantrópico e da tecnologia para discutir como a IA pode contribuir com causas de interesse público.
Entre os casos apresentados, vimos exemplos concretos de como a tecnologia vem sendo usada para prever desastres naturais, apoiar estudantes, acompanhar gestantes e monitorar a coleta de lixo. Cada uma dessas aplicações mostrou que o potencial da IA vai muito além do setor privado, mas pode promover o bem comum.
Em um dos seus movimentos desse uso sustentável, o Google.org está aportando US$ 30 milhões para organizações que promovem e utilizam IA. No entanto, esse potencial ainda é pouco aproveitado por organizações sociais e filantrópicas.
O uso dessa tecnologia pode representar ganhos significativos de eficiência: desde o aprimoramento de processos internos até o monitoramento de resultados e o fortalecimento da tomada de decisões. Também há oportunidades para reduzir a burocracia entre doadores e organizações, melhorar a comunicação e ampliar a transparência.
Mas para isso, é necessário investimento —não apenas financeiro, mas em capacitação, infraestrutura e mudança cultural. Boa parte do terceiro setor ainda carece de recursos financeiros, técnicos e humanos para incorporar a IA de forma estratégica.
Como então aproximar essas organizações do universo tecnológico, que é disruptivo, acelerado, orientado a dados e pautado por uma lógica de escala? Essa foi uma das reflexões centrais do evento: é preciso criar pontes entre mundos que falam línguas diferentes, mas que, juntos, podem produzir soluções inovadoras.
No IDIS (Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social), esse desafio virou prioridade. Em nosso planejamento estratégico, colocamos a ampliação do uso da tecnologia como um dos pilares para os próximos anos.
Uma das iniciativas em andamento é a construção de uma parceria com a Simbi, startup brasileira de impacto social, para desenvolver uma plataforma automatizada de gestão de portfólio de projetos.
A ferramenta permitirá o acompanhamento em tempo real de indicadores, execuções orçamentárias e alinhamento com os objetivos filantrópicos e corporativos das organizações apoiadoras. É uma aposta na inteligência dos dados a serviço do impacto.
Ao mesmo tempo, é preciso ter consciência dos riscos e limitações da IA. Tecnologias podem reproduzir —e até intensificar— desigualdades, especialmente quando operam com base em dados enviesados. Além disso, o uso massivo de energia para treinar e operar modelos de IA levanta alertas sobre seu impacto ambiental. Há também preocupações éticas, morais e sociais que não podem ser ignoradas.
Por isso, o capital humano continua sendo insubstituível: é preciso senso crítico, sensibilidade e diversidade para orientar o uso da IA em direção a resultados positivos e equitativos.
As possibilidades de convergência entre tecnologia e impacto social são promissoras. Organizações e profissionais precisam se adaptar a essa nova realidade que está transformando o mundo em que vivemos.