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IDIS na COP30: o papel da filantropia frente à crise climática

O IDIS marcou presença na 30ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas com quatro representantes: Paula Fabiani, CEO do IDIS; Guilherme Sylos, diretor de prospecção e parcerias; Luisa Lima, gerente de comunicação e conhecimento; e Marcelo Modesto, gerente de consultoria na área ESG. Eles participaram de dezenas de eventos e debates relacionados ao enfrentamento às mudanças climáticas e justiça social.

Paula Fabiani também esteve presente na Blue Zone, espaço onde ocorrem as negociações oficiais e as plenárias da Cúpula dos Líderes. Ela também participou de um encontro

O time também esteve presente em debates diversos que foram desde mecanismos de mercado financeiro para enfrentar os desafios climáticos, como no World Climate Summit & Investment, até encontros com organizações da sociedade civil, como Casa IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas e PSA – Projeto Saúde e Alegria, que trouxeram a voz dos territórios e das comunidades.

DIA DA FILANTROPIA

Entre os destaques está a realização do Dia da Filantropia, evento paralelo à COP30, organizado conjuntamente por CAF – Charities Aid Foudation, GIFE, IDIS, Sitawi, Latimpacto e WINGS, com apoio da RD Saúde. O encontro reuniu quase 150 pessoas, entre representantes de OSCs, investidores sociais, empresas, redes e poder público.

Ao longo do evento, os debates giraram em torno de como a filantropia pode ser uma alavanca estratégica para enfrentar desafios estruturais, como pobreza, acesso à saúde, educação e proteção de direitos, sem perder de vista a urgência climática e a centralidade da Amazônia nesse contexto. Em diferentes falas, os participantes ressaltaram que não se trata apenas de ampliar recursos, mas de qualificar a forma como eles são investidos, com foco em impacto de longo prazo e fortalecimento de organizações locais.

“A experiência desse evento com tantos parceiros mostrou uma enorme potência de compartilhamento de saberes e redes. Foi uma tarde de lembrança constante de que ainda temos um enorme trabalho pela frente, mas também inúmeras possibilidades de evolução”, ressalta Paula Fabiani, CEO do IDIS.

 

PÓS COP-30

A COP30 trouxe discussões importantes e também evidenciou lacunas no debate sobre financiamento e filantropia para o clima.

Agora, a Sitawi Finanças do Bem, IDIS, GIFE e Latimpacto se reúnem para compartilhar uma análise conjunta: o que foi debatido nos espaços oficiais e eventos paralelos, quais temas ganharam força, o que poderia ter avançado mais e os principais aprendizados do Dia da Filantropia, o evento que promovemos em Belém durante a COP30.

Não perca o nosso evento “Pós COP-30: tendências e próximos passos na filantropia pelo clima” que acontece no dia 9 de dezembro, gratuitamente, ao vivo pelo Zoom.

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Quando o poder muda de mãos: o que a American Evaluation Association 2025 revelou sobre o futuro da avaliação

Decolonização, equidade e resiliência na transformação da prática avaliativa

Por Denise Carvalho e Daniel Barretti, Diretora e Gerente de Monitoramento e Avaliação do IDIS, respectivamente

A Conferência da American Evaluation Association (AEA) 2025, realizada em Kansas City, nos Estados Unidos, de 10 a 14 de novembro, reuniu mais de 2.000 profissionais da avaliação sob o tema “Engaging Community, Sharing Leadership” (“engajando a comunidade, compartilhando a liderança”, em tradução livre).

Foram mais três dias de conferência entre plenárias e sessões temáticas, versando sobre conceitos, teorias, métodos e causas das mais diversas no campo da avaliação. O IDIS esteve presente no evento com a participação de Denise Carvalho, diretora de Monitoramento e Avaliação, e Daniel Barretti, gerente de Monitoramento e Avaliação. A participação não foi apenas uma busca por atualização, mas uma imersão em discussões que ressoam profundamente com os desafios reais que enfrentamos na prática diária.

A conferência contou com uma extensa programação, a começar por diversos workshops profissionais. O workshop de dois dias, liderado por Charmagne Campbell, gerente de Insights de Dados e Testes de Operações Centrais do UK Health Security Agency, e Michael Q. Patton, membro da American Evaluation Association, por exemplo, foi voltado ao desenvolvimento de avaliações de base comunitária, liderança compartilhada e princípios de engajamento.

 

Eixos de transformação na avaliação

Longe de ser um evento de celebração de consensos, a conferência revelou uma profissão em um ponto de inflexão, confrontada com crises de financiamento, burnout de equipes e a urgência de redefinir seu propósito e suas ferramentas. As sessões que acompanhamos, desde plenárias a painéis específicos, delinearam um caminho de transformação que, em nossa análise, se articula em cinco eixos interconectados: a decolonização da avaliação; a operacionalização da equidade; a construção de resiliência institucional em contextos de incerteza; o uso da arte e da criatividade, e de modelos qualitativos, como instrumento de revelação; e a emergência do financiamento climático como um novo e crucial domínio.

A decolonização da avaliação foi abordada como um pilar fundamental, não de maneira abstrata, mas como uma demanda ética e prática para a profissão. As discussões aprofundaram a crítica às abordagens avaliativas convencionais, muitas vezes enraizadas em epistemologias ocidentais que perpetuam vieses e excluem saberes indígenas e locais. Além disso, foi ressaltada a necessidade de questionarmos quem define o sucesso, quem se beneficia da informação e, crucialmente, quem detém o poder na relação avaliador–avaliado.

Na sessão “Engaging Communities and Sharing Power in Decolonizing Evaluation” (“engajando comunidades e compartilhando poder na avaliação decolonial”, em tradução livre), foram apresentados os “12 Princípios da Decolonização” como um guia para desmantelar essas estruturas, focando aspectos epistemológicos, práticos e éticos, como a soberania comunitária e a reflexividade. No entanto, a conferência não se esquivou das tensões: como honrar a soberania de uma comunidade quando o financiamento do projeto vem de um fundo externo, com seus próprios indicadores e expectativas? A mesma sessão também articulou essa desconexão, mostrando que fundos e comunidades frequentemente vivem em mundos diferentes, com o primeiro vendo “beneficiários” e o segundo sentindo “decisões impostas”. A decolonização, portanto, exige uma redistribuição radical de poder, que se manifesta, por exemplo, na alocação de orçamento para o “tempo comunitário” e na flexibilidade para que as comunidades cocriem os designs avaliativos.

É nesse ponto que a equidade operacionalizada se torna indispensável. A decolonização, para ser mais do que retórica, precisa de ferramentas concretas que traduzam princípios em prática. O Equitable Evaluation Toolkit, desenvolvido pela Ecotrust em parceria com a consultora Imani Austin, foi um dos destaques nesse sentido. Após anos de reflexão sobre como a avaliação tradicional reproduzia desigualdades, a Ecotrust lançou um conjunto de seis ferramentas que permitem integrar a equidade em cada etapa do processo avaliativo. Entre elas, destacou-se o “Activity Budget”, uma inovação que destina uma linha orçamentária explícita para o “tempo comunitário”, reconhecendo o valor do engajamento e da participação. Ferramentas como o “Equity Lens” (um conjunto de perguntas reflexivas) e o “Partner Engagement Questions” (para envolver parceiros no desenho) também foram apresentadas, com exemplos práticos de sua aplicação em projetos como Indigenous Agroforestry Network e Green Workforce Academy. A Ecotrust demonstrou que a equidade não é um checklist, mas um processo contínuo de aprendizado, que exige transparência e realismo sobre as limitações, mas que, em última instância, constrói confiança e legitimidade.

No entanto, a implementação de práticas decolonizadas e equitativas exige uma base institucional sólida, o que nos leva ao terceiro eixo: a avaliação em contextos de incerteza e a construção de resiliência. As experiências do LSU Social Research Evaluation Center e do University of Mississippi Center for Research Evaluation foram um alerta para a fragilidade da profissão. Ambas as instituições enfrentam a descontinuação simultânea de múltiplos projetos federais (como o Fuel Louisiana, ameaçado por cortes da NSF), demissões e um impacto significativo na moral da equipe. A pergunta central era: como planejar e conduzir avaliações quando não se sabe se um programa existirá em 12 meses? A resposta não está apenas em “ter um plano B”, mas em construir uma capacidade institucional de sentir múltiplos futuros e se adaptar. Aqui, o foresight, ou a antecipação estratégica, mostrou-se crucial. Longe de ser uma tentativa de prever o futuro, o foresight é uma abordagem para preparar-se para múltiplos cenários, identificando sinais fracos de mudança e desenvolvendo planos de contingência. A LSU e a University of Mississippi, por exemplo, estão diversificando ativamente suas fontes de financiamento e simplificando processos para sobreviver.

A complexidade dos contextos atuais, marcada por incertezas e pela necessidade de decolonizar e promover equidade, também exige que a avaliação vá além das métricas tradicionais. A arte, como instrumento de revelação, emergiu como o quarto eixo de transformação. As sessões sobre o tema argumentaram que, muitas vezes, quanto mais quantificamos, menos vemos. As métricas, embora essenciais, podem ocultar verdades, nuances e significados que são essenciais para uma compreensão completa do impacto. Exemplos históricos, como as fotografias de Dorothea Lange e Gordon Parks, ou as visualizações de dados de Du Bois, foram citados para ilustrar como a arte pode desafiar narrativas dominantes e revelar o que os números não contam. A arte permite valorizar os near wins – aqueles quase-sucessos que, embora não atinjam as metas quantitativas, geram aprendizado e transformação qualitativa. Em um cenário de cortes de financiamento, a arte pode ser uma ferramenta poderosa para comunicar o valor de um projeto que “falhou” em termos de métricas, mas cultivou capacidades locais e aspirações comunitárias. A arte, assim como a decolonização e a equidade, desafia a cultura de especialistas e expande as perspectivas, valorizando saberes e expressões marginalizadas.

Além da arte como instrumento que transcende as métricas quantitativas, vale ressaltar o olhar para abordagens mais qualitativas, mais acessíveis e que, portanto, possibilitam maior engajamento das partes e maior equidade nas práticas avaliativas.

Um exemplo é uma abordagem avaliativa apresentada por Marcia Mundt, da Northeastern University, financiada pela USAID e testada entre 2023 e 2025, que visou avaliar a efetividade da assistência internacional americana em iniciativas promotoras da participação feminina na política, na formação de coligações multipartidárias e na integridade de processos eleitorais. A metodologia prevê a estruturação de uma cadeia de causalidade, articulando inputs, outputs e efeitos de curto, médio e longo prazo. A cadeia de causalidade é traduzida em questionários aplicados três vezes ao ano ao longo de dois anos. A chave metodológica está em captar, de maneira mais precisa, até onde, na cadeia de causalidade, a iniciativa chega ou, em outras palavras, quais os elos fortes e frágeis da cadeia, de modo a propiciar ações mais direcionadas e assertivas para a maximização dos impactos positivos de determinada intervenção.

Em outro case, a organização da sociedade civil Education Training Research trouxe um conjunto de seis estratégias que visam à promoção de avaliadores culturalmente responsivos e, consequentemente, de uma prática avaliativa mais equitativa e representativa de espectros populacionais historicamente marginalizados. A ideia central é que a constituição de um time de avaliadores diversos e preparados para lidar com a complexidade, a incerteza e a diversidade do mundo atual se reflita nos resultados almejados e alcançados de uma avaliação. Em suma, o conjunto de seis estratégias proposto passa pelo avaliador compreender-se como um sujeito ativo no processo avaliativo e que, portanto, invariavelmente exerce influência sobre o processo e os resultados de uma avaliação. Isso posto, as estratégias visam compreender justamente qual o perfil do avaliador e seu grau de ingerência, combinados gerenciais, tais como transparência, mecanismos de valorização, possibilidades de engajamento, envolvimento e reconhecimento da equipe; incorporação de contextualização e criticidade como parte da identificação dos impactos gerados, tais como fatores individuais, físicos e relações de poder como fontes geradoras de mudança para além da intervenção; e, por fim, a adoção de práticas regulares garantidoras das estratégias precedentes.

Finalmente, todos esses temas convergem no domínio emergente do financiamento climático, o quinto eixo de discussão. A urgência da crise climática exige um volume massivo de financiamento, muito além do que a filantropia pode oferecer. O capital privado, com seus trilhões de dólares em ativos, é essencial, mas enfrenta uma lacuna crítica: a falta de expertise em Impact Measurement & Management (IMM). O Climate SMILE Playbook, em desenvolvimento pelo Bezos Earth Fund (com contribuições da Rockefeller Foundation e da BHP Foundation), foi apresentado como uma solução para democratizar o acesso ao financiamento climático, fornecendo um framework para investidores que buscam impacto climático. O playbook reconhece que a avaliação climática não é “mais do mesmo”; ela exige um paradigma diferente, que não apenas meça a redução de emissões, mas que prepare para uma transição justa e comunique o risco climático de forma prospectiva (integrando, portanto, foresight). A “transição justa”, um conceito central no financiamento climático, conecta diretamente com a decolonização e a equidade, pois reconhece que a descarbonização afeta desproporcionalmente comunidades pobres e marginalizadas, exigindo diálogo, redistribuição e decisão compartilhada. Assim, o clima se torna um integrador poderoso, exigindo que a avaliação incorpore todos os eixos de transformação discutidos na conferência.

A plenária de encerramento nos convocou a refletir sobre como gerar significado para as comunidades beneficiárias a partir das avaliações, como questionar sistemas de opressão e refletir sobre nossas próprias suposições e práticas, na perspectiva de não sermos somente operadores da avaliação, mas também aprendizes, ouvintes e cocriadores de novas abordagens.

A Conferência da AEA, portanto, não ofereceu soluções fáceis, mas um convite à reflexão profunda e à ação corajosa. Decolonização requer equidade operacionalizada, que, por sua vez, exige resiliência institucional. A resiliência é fortalecida pelo foresight, que nos ajuda a navegar a volatilidade, enquanto a arte revela os significados que as métricas ocidentais ocultam. E o clima, como um desafio global e integrador, demanda a aplicação de todos esses princípios. É um chamado à realização de uma “auditoria de poder” nas avaliações conduzidas, a pensar a adaptação e a aplicação de novas ferramentas, a desenvolver cenários de futuro e a explorar como a arte pode nos ajudar a comunicar o valor de near wins. A verdadeira transformação não acontece em plenárias, mas nas conversas difíceis, nos orçamentos renegociados e na coragem de implementar, mesmo com imperfeições, os princípios de uma avaliação verdadeiramente engajada com a comunidade e com a liderança compartilhada.

Vem aí ‘Dia de Doar 2025’: participe e doe para o Fundo de Fomento à Filantropia

Desde 2013, acontece o Dia de Doar no Brasil, e neste ano, a 12ª edição será no dia 2 de dezembro. O objetivo é incentivar o país a ser mais generoso e solidário, mobilizando pessoas físicas, empresas e campanhas comunitárias para arrecadar recursos e aumentar o impacto positivo das organizações do terceiro setor.

O movimento desempenha um papel fundamental ao mostrar que todos podem participar, fortalecendo a cultura da doação no cotidiano das pessoas.

Neste ano, convidamos você a contribuir para o Fundo de Fomento à Filantropia. Ao doar, você apoia o contínuo fortalecimento do investimento social privado e da cultura de doação no Brasil.

Os rendimentos do fundo patrimonial são revertidos em impactos positivos e concretos para a sociedade, sendo utilizados para o fortalecimento da filantropia e da cultura de doação, por meio de pesquisas, campanhas e outras ações; para advocacy por um ambiente regulatório mais favorável ao terceiro setor; para a promoção de publicações e eventos, como o Fórum de Filantropos e Investidores Sociais; e para a articulação de atores e parcerias para o desenvolvimento do setor, incluindo os endowments criados e a Coalizão. Além disso, os recursos também são utilizados para catalisar iniciativas estruturantes que multipliquem o Investimento Social Privado (ISP) e ampliem seu impacto, entre outras atividades.

Cada doação contribui para o fortalecimento da sociedade civil e para a redução das desigualdades no Brasil, em uma causa que não é apenas nossa, mas de todo o setor. Venha com a gente!

Faça sua doação e saiba mais sobre o Fundo de Fomento à Filantropia:

Conheça também outros fundos patrimoniais que recebem doações de pessoas físicas.

Territórios em conexão: intercâmbios fortalecendo fundações e institutos comunitários no Brasil e no mundo 

É no território que o conhecimento ganha corpo e sentido: cada experiência, cada encontro e cada gesto coletivo se transformam em aprendizagens vivas, que não apenas ajudam a solucionar desafios locais, mas inspiram novas formas de pensar e agir no mundo. É nessa perspectiva que o Programa Transformando Territórios (TT) atua, fortalecendo e apoiando as Fundações e Institutos Comunitários (FICs) de base territorial no Brasil. Durante o ciclo do programa de 2024 e 2025, uma das principais estratégias adotadas pelo TT foi incentivar intercâmbios entre FICs participantes e com organizações estrangeiras. Ao todo, foram realizados 6 intercâmbios que envolveram 10 organizações e mais de 30 lideranças, em 4 países e 7 estados brasileiros.

 

Entre as premissas está a criação de um ambiente fértil para que essas organizações floresçam e aprendam continuamente. Nesse caminho, os intercâmbios se revelam como uma estratégia potente de desenvolvimento: ao conectar diferentes FICs no Brasil e no mundo, permitem que cada uma reconheça em si e no outro novas formas de avançar, traduzindo experiências em aprendizagens coletivas que ressoam para muito além do território visitado. A prática da troca amplia repertórios, provoca reflexões e gera a confiança necessária para que o aprendizado se transforme em ação concreta, fortalecendo tanto as organizações quanto o ecossistema da filantropia comunitária territorial.

Em 2025, o Programa Transformando Territórios participou de um intercâmbio com a Comunidad de Organizaciones Solidarias (COS), apoiado pelo Connecting Communities in the Americas (CCA). Paralelamente ,acompanhamos algumas FICs do programa em processos de intercâmbio,  também viabilizados pelo CCA. Esse movimento acontece em um momento especial de fortalecimento das trocas e aprendizagens dentro do coletivo de FICs, que tem se tornado cada vez mais participativo por meio de grupos de trabalho e iniciativas conjuntas. Nesse contexto, apenas no primeiro semestre, realizamos quatro intercâmbios entre organizações do grupo e, além disso, promovemos um encontro presencial de lideranças do TT na FEAV (Fórum de Entidades Assistenciais de Valinhos) em Valinhos, interior de São Paulo, um marco simbólico para o coletivo, por acontecer justamente no território de uma das próprias FICs. 

O “arrumar a casa” – antes e depois do encontro

Assim como quem se prepara para receber uma visita querida, os intercâmbios mobilizam as organizações anfitriãs a revisitar as próprias práticas e repensar o que desejam compartilhar com terceiros. Esse movimento de “arrumar a casa” vai muito além da logística: torna-se um momento de autoavaliação, em que as organizações revisitam apresentações institucionais, organizam documentos e práticas e promovem a aproximação de grupos do território em novas combinações e olhares compartilhados. Esses gestos, que parecem simples, têm efeitos profundos e duradouros: fortalecem a identidade institucional, ampliam a articulação comunitária e geram aprendizados que continuam reverberando mesmo após a despedida dos visitantes, contribuindo de forma concreta para o desenvolvimento da organização.

Fundação Comunitária de Cajamarca em Maceió 

 

Carlos Jorge, presidente da Mundaú Mundo, participou do intercâmbio do CCA com a Fundación Comunitária de Cajamarca, no Peru, e também da visita ao Instituto Comunitário de Sergipe (ICOSE), dentro do intercâmbio triplo de FICs apoiado pelo CCA. Para ele, essas experiências fazem as organizações ressignificarem o próprio papel no território e despertarem um olhar renovado para as oportunidades já presentes no ecossistema das FICs. O relato dele evidencia como os intercâmbios funcionam como uma ação estratégica de fortalecimento institucional: ao praticar a alteridade, as organizações não apenas aprendem com o outro, mas também se enxergam de maneira mais nítida, reconhecendo potencialidades e fragilidades, e transformando esse processo em motor de desenvolvimento.


“Com as trocas de aprendizagem que a CCA conseguiu oferecer a 36 organizações em 9 países, vemos um ecossistema crescente e interconectado que pode superar os desafios que trabalhar sozinho não consegue. Tem sido incrível ouvir as histórias de como os líderes comunitários estão inspirando uns aos outros e compartilhando estratégias e ferramentas para que cada um trabalhe de forma mais eficaz em seu próprio território.”, comenta Lisa Schalla, Diretora de Projetos do Connecting Communities in the Americas Connecting Communities in the Americas

 

Ao receber a visita do programa Coterráneos (Chile), a equipe do TT realizou a primeira visita ao Fundo Comunitário Perifasul M’Boi, após a aprovação do novo estatuto que formalizou essa FIC como uma organização independente. Esse marco, foi simbólico não apenas pela conquista institucional, mas também por possibilitar que o Coterráneos conhecesse de perto um território de São Paulo conduzido por uma FIC recém-constituída e relacionasse essa vivência ao processo que estão desenvolvendo com as FICs do Chile. 

Equipe da Coteráneos em visita ao Fundo Comunitário Perifasul M’boi

Outro marco relevante ocorreu em Paraty, quando o Instituto Comunitário de Paraty (ICP) recebeu a equipe da Fundacíon Punta de Mita. A visita coincidiu com a Festa do Divino, celebração profundamente enraizada na cultura local, e ganhou força ao envolver a comunidade em uma gincana tradicional, criando um espaço genuíno de troca entre organizações e comunidade. Para o recém-formalizado ICP, foi a oportunidade de se mostrar à cidade, afirmar  a identidade local e fortalecer o reconhecimento junto a diferentes atores sociais.

 

Territórios e diálogos

A diversidade da América Latina e a singularidade que cada FIC nos levaram à expressão: “conheça uma FIC e você terá conhecido apenas uma FIC”. Essa variedade é, na verdade, fonte de riqueza e potência. A multiplicidade de histórias e contextos, somada a desafios comuns e a semelhanças nos cenários políticos e econômicos, torna os intercâmbios ainda mais valiosos. Eles celebram a diversidade dos territórios e, ao mesmo tempo, constroem pontes de aprendizagem que inspiram, aproximam realidades e abrem caminho para a circulação de saberes locais e a criação de novas tecnologias sociais.

 

“A participação de FICs em iniciativas como essa é essencial. Muitas vezes, o trabalho cotidiano nos coloca em um ritmo intenso, que nos distancia do olhar estratégico e da troca genuína. Intercâmbios como o do CCA nos tiram desse modo automático e nos lembram que há muito a aprender com quem está do outro lado da ponte. Eles nos renovam, nos provocam e nos conectam — como organizações e como pessoas”, compartilhou  Cristine Lenz, do ICOSE.

 

Como aponta Cristine, sair do ritmo acelerado e adotar uma nova perspectiva nos convida a vivenciar aprendizados transformadores, capazes de impactar a forma como as organizações atuam. Em outros territórios, encontramos organizações que, mesmo em contextos distintos, enfrentam dilemas semelhantes e nos inspiram a enxergar soluções novas e a ressignificar nossos próprios desafios.

 

Aprendizagens que transformam

Chamamos os intercâmbios de metodologia porque eles não acontecem de forma casual: são pensados e praticados como um processo estruturado que integra preparação, vivência e sistematização de aprendizados. Essa intencionalidade transforma encontros em conhecimento aplicado, fortalecendo tanto cada organização individualmente quanto o ecossistema das FICs como um todo. 

O que essa trajetória nos mostra é que os intercâmbios se consolidam como uma estratégia de fortalecimento, pois reúnem, em um mesmo movimento, a oportunidade de olhar para dentro e de abrir-se ao novo. Ao preparar-se para receber ou visitar outra organização, as FICs revisitam práticas, organizam informações e refletem sobre sua atuação no território. No contato com outras realidades, exercitam a alteridade, reconhecendo semelhanças e diferenças que inspiram soluções criativas e adaptadas a cada contexto.

Equipes do ICOSE, FEAV, Mundaú e FUNDAES em intercâmbio em Sergipe, onde está localizada o ICOSE

Esse processo inaugura ciclos de aprendizagem contínua, que vão além do momento da troca e se desdobram em mudanças concretas na gestão e na relação com a comunidade. Mais do que uma atividade, os intercâmbios configuram-se como um caminho de desenvolvimento organizacional de alto impacto e baixo custo, capaz de ampliar repertórios, fortalecer identidades e transformar a diversidade dos territórios em potência de aprendizagem coletiva.

Ao promover inovações em rede, fortalecer relações, abrir novos olhares e estimular a circulação de saberes locais, os intercâmbios revelam que, quando territórios aprendem juntos, enraízam conhecimento, inspiram inovação e constroem o futuro que o Programa Transformando Territórios acredita ser possível.

Por Carla Irrazabal e Rosana Ferraiuolo, analista e gerente do programa Transformando Territórios

 

IDIS é reconhecido pela sexta vez entre as 100 Melhores ONGs do Brasil

Boas práticas de gestão são decisivas para que organizações sociais ampliem o impacto nas causas que defendem. É isso que o Prêmio Melhores ONGs reconhece ao avaliar governança, transparência, sustentabilidade financeira, comunicação e gestão das organizações de todo o país. Em 2025, o IDIS passa a integrar, pela sexta vez, a lista das 100 Melhores ONGs do Brasil.

“Chegar pela sexta vez à lista das Melhores ONGs é um marco que reforça nossa responsabilidade com o ecossistema da filantropia no Brasil. Cada reconhecimento é um incentivo para seguirmos aprimorando nossa gestão e entregando mais impacto por meio do investimento social privado”, afirma Paula Fabiani, CEO do IDIS.

Ao longo do ano, o IDIS tem realizado diversos investimentos para fortalecer o Instituto e seus projetos. Entre os resultados, destacam-se o monitoramento constante de indicadores, o investimento em plataformas de gestão e o aumento no treinamento e desenvolvimento da equipe. Isso resultou na ampliação dos projetos de consultoria com novos clientes, além do fortalecimento do relacionamento com aqueles que já eram parceiros; no fortalecimento de iniciativas de impacto, como Advocacy pelos Fundos PatrimoniaisTransformando TerritóriosJuntos pela Saúde, Compromisso 1% e IA.3 – Inteligência Artificial para o Terceiro Setor; na continuidade do Fundo de Fomento à Filantropia; e em importantes produções no campo do conhecimento, como ‘Perspectivas para a Filantropia no Brasil 2025’, ‘Caminhos para atuação mais estratégica e ampla da filantropia familiar’ e ‘Pesquisa Doação Brasil 2024’.

“Essas conquistas refletem um esforço contínuo de toda a equipe e de nossos parceiros. Temos investido em processos, tecnologia, monitoramento de indicadores e desenvolvimento de pessoas, sempre conectados à nossa missão de inspirar, apoiar e ampliar o investimento social privado e a mudança positiva que ele gera”, completa Paula.

Parabenizamos todas as organizações que, em diferentes causas e territórios, trabalham diariamente pelo desenvolvimento socioeconômico do Brasil e que também foram reconhecidas nesta edição do prêmio.

Confira a lista completa das 100 Melhores ONGs no site oficial do Prêmio Melhores ONGs.

Filantropia em foco na Amazônia: evento paralelo à COP30 reúne mais de 140 pessoas em Belém

Em uma tarde dedicada a refletir sobre o papel da filantropia diante da emergência climática e das desigualdades sociais no Brasil, cerca de 140 pessoas se reuniram em Belém para um encontro paralelo à COP30, o Dia da Filantropia. Organizado pela CAF – Charities Aid Foundation, GIFE, IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, Sitawi Finanças do Bem, Latimpacto e WINGS, com o apoio da RD Saúde, o evento reuniu representantes de organizações da sociedade civil, investidores sociais, empresas, redes e iniciativas da região amazônica e de outras partes do país.

A programação contou com três painéis, com participações de especialistas nacionais e internacionais como Ilana Minev, Presidente do Conselho de Administração da Bemol; Pedro Hartung, CEO da Fundação Alana; Mark Greer, Diretor-gerente na CAF; e Anthea McLaughlin, CEO da Aliança Filantrópica Caribenha.  Além disso, houve um momento de ‘Vozes do Território’ que contou com a participação de Rose Meire Apurinã, vice-diretora do Fundo Podáali, Fundo Indígena da Amazônia Brasileira, e Francisca Gárdina Lima, coordenadora da agricultura familiar do Instituto Baixada.

Ao longo do evento, os debates giraram em torno de como a filantropia pode ser uma alavanca estratégica para enfrentar desafios estruturais, como pobreza, acesso à saúde, educação e proteção de direitos, sem perder de vista a urgência climática e a centralidade da Amazônia nesse contexto. Em diferentes falas, os participantes ressaltaram que não se trata apenas de ampliar recursos, mas de qualificar a forma como eles são investidos, com foco em impacto de longo prazo e fortalecimento de organizações locais.

Outro ponto recorrente nas discussões foi a necessidade de aproximar ainda mais os investidores sociais dos territórios. Foram compartilhadas experiências que mostram como fundos filantrópicos, parcerias intersetoriais e modelos de financiamento flexíveis podem impulsionar soluções construídas por quem vive e atua na região, respeitando saberes tradicionais e promovendo autonomia das comunidades.

Também houve destaque para a importância da transparência, da mensuração de resultados e da troca de aprendizados entre organizações. A ideia de colaboração apareceu como fio condutor: em vez de iniciativas isoladas, os participantes defenderam a construção de agendas comuns, com metas claras e espaço para experimentação, inovação social e incidência em políticas públicas.

“A experiência desse evento com tantos parceiros mostrou uma enorme potência de compartilhamento de saberes e redes. Foi uma tarde de lembrança constante de que ainda temos um enorme trabalho pela frente, mas também inúmeras possibilidades de evolução”, ressalta Paula Fabiani, CEO do IDIS.

Ao final da tarde, a sensação predominante era de que a presença da filantropia na COP30, e em eventos paralelos como este, em Belém, representa uma oportunidade concreta de consolidar compromissos, ampliar conexões e fortalecer o ecossistema de investimento social privado no Brasil e na Amazônia. Mais do que um encontro pontual, o evento foi um passo a mais na construção de uma atuação filantrópica mais estratégica, colaborativa e alinhada aos desafios do nosso tempo.

PÓS COP-30

A COP30 trouxe discussões importantes e também evidenciou lacunas no debate sobre financiamento e filantropia para o clima.

Agora, a Sitawi Finanças do Bem, IDIS, GIFE e Latimpacto se reúnem para compartilhar uma análise conjunta: o que foi debatido nos espaços oficiais e eventos paralelos, quais temas ganharam força, o que poderia ter avançado mais e os principais aprendizados do Dia da Filantropia, o evento que promovemos em Belém durante a COP30.

Não perca o nosso evento “Pós COP-30: tendências e próximos passos na filantropia pelo clima” que acontece no dia 9 de dezembro, gratuitamente, ao vivo pelo Zoom.

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ICP: conectando pessoas e iniciativas pelo desenvolvimento sustentável de Paraty

Nas salas de aula de Paraty, um grupo de jovens está sendo formado para olhar com mais cuidado para o lugar onde vive. Eles se tornaram Delegados Ambientais, líderes estudantis que atuam por escolas mais sustentáveis e comunidades mais conscientes. O projeto, criado Coletivo AMA – Ativistas pelo Meio Ambiente em parceria com a Secretaria Municipal de Educação, é o primeiro a receber apoio institucional e financeiro do recém-criado Instituto Comunitário Paraty (ICP). Mais do que uma ação ambiental, este é um símbolo do que o ICP busca representar: a força de um território que se transforma a partir de dentro, pela união de quem o conhece e o quer mais justo e equilibrado.

 

O trabalho do ICP se baseia em três pilares: o primeiro, articulação territorial, conecta organizações, setor produtivo, poder público, universidades, doadores e comunidade para promover o desenvolvimento local; o segundo, desenvolvimento individual e comunitário, apoia iniciativas de fortalecimento humano, social, comunitário e ambiental conforme as demandas locais; e o terceiro, partilha de conhecimento, envolve a produção e disseminação de saberes sobre o território e suas comunidades, estimulando o aprendizado coletivo.

“O ICP nasce da união de lideranças comunitárias de Paraty com o desejo coletivo de fortalecer o ecossistema socioambiental local, transformar vulnerabilidades em potência e ampliar a qualidade de vida dos que vivem no município, do centro histórico às comunidades costeiras e rurais”, destaca Andreia Estrella, assistente social, especialista em desenvolvimento comunitário e territorial sustentável, e co-diretora executiva do ICP, ao lado do biólogo e gestor ambiental Ricardo Zuppi.

No projeto “Delegados Ambientais”, a convite do Coletivo AMA, o ICP também realizou oficinas formativas com temáticas sobre liderança ambientalista, elaboração de projetos e ecologia integral. Inicialmente, 36 alunos de quatro escolas públicas receberam a formação.

Projeto “Delegados Ambientais”: a convite do Coletivo AMA e Secretaria de Educação de Paraty, o ICP realizou oficinas formativas

Em outra linha atuação, o Instituto passou a apoiar a Associação de Moradores do Saco do Mamanguá, único fiorde tropical do Brasil, na identificação de suas demandas, desafios e oportunidades. O território é formado por oito comunidades com cerca de aproximadamente 150 famílias que vivem principalmente da pesca e do turismo, e têm acesso exclusivamente por barco ou longas trilhas.

Para compreender de forma mais profunda as questões locais no Mamanguá, o ICP apoiou, em outubro deste ano, a quarta edição do “Ajuntório de Saberes” — evento que celebra a cultura caiçara e que acontece anualmente no território. O Instituto realizou a atividade “Mural dos Sonhos”, criada para oferecer à população um espaço de escuta sobre suas riquezas, desafios e sonhos, valorizando os conhecimentos e perspectivas dos próprios moradores.

“Foi um momento importante, que permitiu uma escuta mais genuína e menos institucional dos anseios da comunidade. Esse material vai orientar os próximos passos das ações locais”, explica Zuppi.

Andreia complementa: “Nessas comunidades, o uso de fossas negras (buraco no solo usado para descartar esgoto sem tratamento) é comum. Estamos começando a planejar formas de enfrentar essas demandas de saneamento básico e gestão de resíduos, estudando parcerias com poder público e iniciativa privada”.

FUNdação orientada por diagnóstico

A governança do ICP conta com um Conselho Administrativo formado por sete lideranças locais representando instituições do território, além da Diretoria Executiva e dos Conselhos Comunitário e Fiscal ainda em formação. Essa representatividade é um dos pilares das Fundações e Institutos Comunitários, conforme destaca a Carta de Princípios para FICs do IDIS:

Representadas por membros da comunidade: possuem instâncias de governança formadas por agentes e cidadãos preocupados com as questões locais que, a partir da sensibilidade e profundo conhecimento do território, são responsáveis por manter a organização, identificar temas prioritários, orientar a alocação eficaz de recursos, bem como defender os interesses da comunidade.

O embrião do ICP foi o Diagnóstico Socioeducacional de Paraty, encomendado em 2021 pela Taiama Foundation para a Tekoa Consultoria, da qual Andreia e Ricardo fazem parte, para compreender o ecossistema socioeducacional de Paraty e construir uma Teoria de Mudança voltada ao desenvolvimento sustentável e inclusivo.

O estudo apontou que Paraty possui um dos ecossistemas socioeducacionais mais ricos do estado, com cerca de 1.200 crianças e adolescentes em programas de contraturno e forte presença de coletivos culturais e ambientais. Contudo, os projetos operavam com pouca sinergia e na dependência de financiamentos pontuais. Assim, o diagnóstico defendeu a institucionalização de uma estrutura comunitária permanente, responsável por articular o território, captar recursos e garantir sustentabilidade — missão que o ICP assumiria posteriormente.

“Os desafios enfrentados pelo Instituto são proporcionais à complexidade e à riqueza do território. Um dos principais é lidar com as especificidades culturais, ambientais e sociais de Paraty, um território de meio ambiente preservado, forte vocação turística e comunidades tradicionais, assegurando que todas as ações respeitem essas singularidades e contribuam para potencializar seus modos de vida”, destaca Zuppi.

Lideranças do ICP: Andréia do Almo (membro do Conselho Administrativo), Andreia Estrella (codiretora) e Ricardo Zuppi (codiretor)

 

Em outra frente, com o objetivo de promover a profissionalização de organizações da sociedade civil de Paraty, o ICP promoveu uma oficina sobre gestão e contabilidade financeira para 15 OSCs locais. A formação gratuita, realizada em setembro deste ano em parceria com a Vargas Consultoria, abordou temas como controle financeiro, regularização fiscal e captação de recursos, fortalecendo a transparência e a eficiência das instituições.

Apesar dos desafios, as perspectivas são promissoras. A consolidação do ICP – que foi fundado oficialmente em 2024, integrando o programa Transformando Territórios, do IDIS – representa um marco para o município, que passa a contar com uma organização de base local capaz de articular atores diversos, construir redes colaborativas, promover diagnósticos e canalizar investimentos sociais alinhados às reais demandas da população.

“O programa Transformando Territórios tem nos auxiliado a articular redes de troca e ação para fortalecer o território. O ICP já nasceu, com o apoio do IDIS, como uma FIC. Não se transformou em uma, mas foi criado com essa identidade desde o início. E nossa atuação já é ampla e intensa, o que evidencia o quanto os territórios precisam dessa figura de articulação que as FICs representam”, reforça Andreia.

Paula Fabiani, CEO do IDIS, em visita ao ICP

 


Informações do Território 

  • Território de atuação: Município de Paraty/RJ
  • Nome da fundação ou instituto comunitário: Instituto Comunitário Paraty (ICP)
  • Liderança: os diretores-executivos Andreia Estrella e Ricardo Zuppi
  • População: Cerca de 45 mil habitantes, segundo o IBGE.
  • Causas prioritárias mapeadas pela FIC: Educação e juventude; meio ambiente e sustentabilidade; turismo sustentável; saneamento e saúde básica; fortalecimento e participação social; geração de emprego e renda com inclusão produtiva de impacto socioambiental.
  • Desafios regionais: Pressão imobiliária, sobrepesca, impactos das mudanças climáticas, saneamento básico, e o turismo desordenado, que afetam tanto o meio ambiente quanto a estrutura social local. Há ainda alta evasão escolar entre jovens, impulsionada por subempregos no turismo, além da falta de universidades e da dificuldade de acesso à educação superior.

 

O Instituto Comunitário Paraty integra o programa Transformando Territórios, uma iniciativa do IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social em parceria com a Mott Foundation e apoio do Movimento Bem Maior, para fomentar a criação e o fortalecimento de Institutos e Fundações Comunitárias no Brasil.

 

Quer saber mais sobre o ICP? Acesse o site.

Para conhecer mais sobre os Princípios e características das Fundações e Institutos Comunitários, acesse a Carta de Princípios através deste link.

Saiba mais sobre o programa Transformando Territórios e como apoiá-lo.

 

Nota técnica | Adaptação às mudanças climáticas: como promover a justiça climática através da gestão de riscos para investidores e organizações sociais

O enfrentamento às mudanças climáticas é um desafio que já pressiona territórios, serviços e orçamentos. Para as Organizações da Sociedade Civil e investidores sociais, mesmo aqueles que não atuam diretamente com a causa ambiental e clima, isso se traduz em interrupções, custos extras e maior demanda por serviços pelas populações atendidas.

A falta de visibilidade dos riscos relacionados ao clima podem pressionar a efetividade da atuação, o impacto socioambiental, a governança e o balanço financeiro dessas organizações.

Nesta Nota Técnica, elaborada por Marcelo Modesto, gerente de projetos no IDIS e especialista da área de Agenda ESG e o ISP; e Yasmim Araujo Lopes, analista de projetos no IDIS, propomos diretrizes de atuação com justiça climática e um framework de avaliação de riscos relacionados ao clima para Organizações da Sociedade Civil e Investidores Sociais.

 

Baixe agora e acesso o documento na íntegra!

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Gestão Financeira no Terceiro Setor: um guia para garantir sustentabilidade e transparência nas organizações sociais

Por Marcelo Destito e Felipe Medina, gerentes administrativo-financeiros do IDIS; Julia Magnani, analista administrativo-financeira do IDIS; e Juliana Carreira, ex-gerente administrativo-financeira do IDIS

Cuidar da gestão financeira numa Organização da Sociedade Civil (OSCs) não é apenas ‘pagar contas’, é também garantir que cada recurso cumpra a missão com eficiência, ética e transparência. Na prática, isso significa planejar receitas e despesas, acompanhar o caixa, registrar operações com rigor, analisar resultados e prestar contas de um jeito claro. Quando a casa está organizada, os projetos seguem adiante, a confiança cresce e a instituição ganha fôlego para enfrentar imprevistos.

Diferente das empresas, a rotina financeira de uma OSC tem suas particularidades. As fontes de receita costumam ser diversas e menos previsíveis, doações, patrocínios, editais, leis de incentivo, às vezes venda de produtos ou serviços sociais, e os financiadores tendem a pedir transparência permanente. Ao mesmo tempo, muitas organizações convivem com limites de equipe e processos.

Em um contexto de recursos incertos, uma boa gestão amplia a autonomia institucional e reduz riscos. É ela também que permite demonstrar, de forma verificável, como cada real se transforma em impacto social. Neste texto, você vai encontrar os procedimentos básicos que devem constar na gestão financeira das OSCs e alguns direcionamentos sobre como colocá-los em prática. Vamos lá?

 

Como organizar o básico (e fazer as áreas conversarem)

Três frentes precisam caminhar juntas: orçamento, caixa e contabilidade. O orçamento nasce realista, ajusta-se conforme a execução e pode ser construído de forma participativa para aproximar áreas e metas institucionais.

O caixa cuida da liquidez: entradas, saídas, reservas e conciliações para evitar sustos. Já a contabilidade registra fielmente as operações e prepara demonstrações como Balanço Patrimonial, DRE (Demonstrativo do Resultado do Exercício) e DFC (Demonstração do Fluxo de Caixa), que dão transparência e leitura de saúde financeira.

Ferramentas simples ajudam muito, como, por exemplo, planilhas de prestação de contas por projeto, controles de fluxo de caixa e, quando possível, softwares de gestão integrada (ERPs) adaptados ao terceiro setor, CRMs para relacionamento e plataformas de doação. Integrar esses sistemas reduz retrabalho, melhora a precisão dos dados e acelera relatórios. Para completar o ecossistema, a controladoria acompanha orçamento e desvios, e a auditoria revisa políticas e registros de forma independente. Os nomes variam conforme a estrutura, mas as funções precisam estar claras e coordenadas.

 

Governança, transparência e prestação de contas

Uma boa gestão financeira das OSCs começa com uma governança viva: conselho deliberativo atuante, políticas internas claras (compras, viagens, adiantamentos, doações), alçadas de aprovação bem definidas e segregação de funções. Transparência é o passo seguinte e visível: registro e arquivo de documentos, conciliação bancária regular, divulgação de informações relevantes para diferentes públicos e, quando a maturidade permitir, auditorias independentes.

No campo fiscal e trabalhista, ainda que existam isenções possíveis, as obrigações devem estar em dia (INSS, IRRF, FGTS e demais tributos aplicáveis). Ter contabilidade interna ou assessoria externa, manter certidões negativas atualizadas, controlar o patrimônio e organizar comprovantes prepara a organização para auditorias e prestações de contas e evita problemas com contratantes e órgãos de controle.

Nessa mesma lógica de cuidado, contratos bem estruturados com fornecedores e parceiros previnem ruídos e dão segurança jurídica. É importante que os documentos tragam dados das partes, dados bancários e condições de pagamento, a descrição dos serviços (no corpo do contrato ou em anexo), cronograma e responsabilidades. Entre os instrumentos mais usados estão o Contrato de Prestação de Serviços, o Termo de Doação para repasses voluntários de empresas, institutos, fundações ou pessoas físicas e os Termos de Parceria. Todos têm validade jurídica e podem ser firmados em papel ou por assinatura digital, o que traz agilidade sem abrir mão de integridade e rastreabilidade.

Prestar contas, por fim, é mostrar de forma documentada que os recursos foram usados como planejado. O percurso é conhecido: começa no planejamento e no orçamento (com metas, escopo e rubricas), segue com a execução e o registro das despesas por rubrica e período, sempre com comprovação, culmina em um relatório financeiro objetivo com demonstrativo, conciliação bancária e notas explicativas e termina na análise e aprovação. Cada financiador pode ter regras próprias, mas a lógica permanece a mesma: coerência entre o proposto, o realizado e o gasto, tudo devidamente comprovado. Quando isso acontece, a confiança aumenta, a parceria se fortalece e novos apoios tendem a surgir.

 

Desafios e o que fazer com eles

É comum lidar com receitas sazonais e incertas, exigências distintas de financiadores, equipe enxuta, sistemas fragmentados e recursos vinculados a projetos, o que limita pagar contas institucionais. A sustentabilidade financeira é uma construção contínua, que pede diversificação de fontes e profissionalização da equipe financeira.

O lado bom é que há um conjunto claro de oportunidades. Capacitar e estruturar a área financeira, adotar tecnologia e automação (ERPs, CRMs, plataformas de doação), formar parcerias estratégicas (com empresas, universidades, consultorias), buscar certificações e selos de transparência e planejar no longo prazo, com orçamentos plurianuais, fundos de reserva e análise de cenários são alguns caminhos. Esse pacote aumenta a previsibilidade, reduz riscos e dá lastro institucional.

 

Próximos passos práticos

Para começar ‘sem travar’, foque no essencial:

1 – Mapeie funções e lacunas (pessoas, processos, sistemas) e defina responsabilidades claras;

2 – Orce por projeto e institucional e estabeleça uma reserva mínima de caixa;

3 – Padronize classificação de despesas, conciliações e arquivo de comprovantes, centralizando o que for possível;

4 – Aprove políticas e alçadas e compartilhe com a equipe e comitês;

5 – Automatize o que mais dói (ex.: conciliação e relatórios) e só depois avance para soluções mais complexas.

Gestão financeira é meio, não fim. É a cultura que sustenta decisões responsáveis, dá previsibilidade ao trabalho e traduz, em números, o compromisso público das OSCs. Quando orçamento, caixa, registros e prestação de contas funcionam de forma integrada e transparente, a confiança aumenta e os projetos ganham fôlego para atravessar ciclos bons e desafiadores.

Para além de cumprir regras, trata-se de preservar propósito e entregar resultados consistentes, ano após ano, para as pessoas e causas que motivam a existência da organização.

1ª edição do Café IDIS: Filantropia em debate reúne representantes de empresas

No dia 4 de novembro, o IDIS realizou a primeira edição do ‘Café IDIS: Filantropia em debate’, um espaço pensado para lideranças de organizações realizarem trocas e reflexões sobre como tornar o investimento social mais estratégico, aumentando recursos e a capacidade de engajamento em sua cadeia de valor.

A nova iniciativa vem do entendimento de que investimento social privado praticado por empresas é uma importante alavanca para a transformação social. Ele vem amadurecendo no Brasil, mas o pico atingido na pandemia segue sendo um ponto fora da curva. Em um cenário em que os desafios socioambientais são evidentes, é preciso continuar estimulando o crescimento do volume de recursos destinados ao investimento social, seu uso mais estratégico para enfrentar problemas estruturais.

A primeira edição reuniu cerca de 35 lideranças ao longo da manhã que contou com apresentações de estudos e pesquisas, além de debates.

Abrindo a programação, Lyana Latorre, vice-presidente da Fundação Rockefeller para a América Latina e o Caribe apresentou os resultados do estudo inédito da Rockefeller Foundation,Cinco agendas para ativar a transformação do setor filantrópico na América Latina e no Caribe, que traz uma agenda coletiva para o setor a partir da consulta com 70 lideranças da região.

O estudo conclui que as doações filantrópicas são muito menores do que em outras partes do mundo, mesmo que as necessidades continuem crescendo.

No entanto, segundo os autores, a filantropia na América Latina e no Caribe tem o potencial de mobilizar mais de US$ 5 bilhões por ano, caso seja ativado apenas 1% da riqueza privada da região – valor comparável ao total da ajuda internacional atualmente recebida.

“A América Latina e o Caribe têm um potencial filantrópico enorme, mas ainda não ativado. Precisamos de uma filantropia que vá além das soluções temporárias e trabalhe por mudanças estruturais e sustentáveis”, afirmou Lyana Latorre, vice-presidente da Fundação Rockefeller para a América Latina e o Caribe.

Seguindo com a manhã, João Morais, coordenador do BISC apresentou a pesquisa Reflexões e Tendências do ISC: Caminhos para o engajamento da alta liderança empresarial no investimento social corporativo, produzida pela Comunitas a partir de Grupos Focais com as lideranças executivas da Rede BISC.

Um dos aspectos do estudo mostra que a diferença de letramento entre o social e o negócio aparece como limitante ao Investimento Social Corporativo, seja na relação com as lideranças empresariais ou mesmo com os colaboradores das empresas de forma geral.

Nesse sentido, equipes responsáveis pelo ISC podem ter um papel na mudança da cultura corporativa para o social/sustentabilidade, uma vez que a aproximação entre social e negócio traz a necessidade de uma sensibilização e letramento destes atores para o social.

Faz parte da missão do IDIS promover e desenvolver o investimento social no país e acreditamos que espaços de trocas como esse são ricos para fomentar debates e criar vínculos entre diferentes organizações e perspectivas.

A filantropia como farol em tempos de policrise

Publicado originalmente na Folha de S.Paulo em 5 de novembro de 2025. Acesse clicando aqui

Por Paula Fabiani, CEO do IDIS

Desigualdades sociais que parecem se perpetuar, a emergência climática presente em nosso cotidiano, retrocessos democráticos e tensões econômicas e políticas que fragilizam o tecido social dão contorno a um cenário de policrise. O termo foi cunhado nos anos 70 pelo sociólogo Edgar Morin para definir períodos de “crises interligadas e sobrepostas”.

É fácil sentir-se paralisado em períodos como esses, mas não podemos nem devemos esperar. Mais do que nunca, é preciso agir com esperança na mudança. A ação coletiva e em diferentes frentes é imprescindível. E, entre tantos movimentos possíveis, há a filantropia.

Filantropia significa ‘amor ao próximo’ e é por essência, coletiva. Manifesta-se quando redes comunitárias se unem para resistir e se reinventar, quando empresas que competem no mercado se alinham em compromissos comuns em prol da geração de impacto, quando organizações da sociedade civil em diferentes setores constroem parcerias, ampliando o alcance das soluções.

Além de reafirmar o sentido coletivo da filantropia, todos esses movimentos são provas de que a esperança pode, sim, ser traduzida em ação.

Os desafios do nosso tempo pedem diferentes agentes atuando em múltiplas respostas. A emergência climática, por exemplo, não é apenas um problema ambiental, ameaça modos de vida, agrava desigualdades e pressiona economias inteiras.

Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais, que teve como tema ESPERANÇAR

A desigualdade social, por sua vez, não se limita à falta de renda, mas compromete o acesso a direitos básicos, perpetua ciclos de exclusão e limita oportunidades para gerações inteiras. Já os retrocessos democráticos corroem a confiança nas instituições e enfraquecem a participação cidadã, para além de impactar a política institucional.

Da mesma forma, empresas não são apenas agentes econômicos, e quando escolhem atuar com intencionalidade, mobilizam sua capilaridade para semear mudanças, engajando suas cadeias e criando valor para a sociedade.

A filantropia familiar, com flexibilidade e visão de longo prazo, pode apoiar causas invisibilizadas. Até mesmo a tecnologia, tantas vezes associada a riscos e disparidades, pode ser ponte para a equidade quando colocada a serviço das pessoas.

Esses fios não estão soltos. Eles compõem um mesmo pano e costurá-los junto a elementos igualmente vitais, como ancestralidade, inovação, reflexão crítica e, sobretudo, ação prática, é o que nos permite esperançar em meio à policrise.

Esse é o chamado da 14ª edição do Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais, provido pelo IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social e que acontece em outubro, em São Paulo – um convite para transformar a esperança em verbo de ação, Esperançar. O programa do Fórum conduz os participantes, reunindo palestrantes nacionais e internacionais, por uma jornada que reflete a diversidade de olhares e práticas de investimento social privado, sempre com foco na ação.

Fica o convite para construirmos pontes onde existem abismos, enxergarmos dignidade onde há invisibilidade e apostarmos em soluções onde só vemos problemas. Esperançar, afinal, é assumir que o futuro não está dado: ele se constrói, com coragem, generosidade e compromisso compartilhado.

Com a licença para parafrasear Paulo Freire, de quem emprestamos essa ação tão necessária atualmente, “é preciso ter esperança, mas esperança do verbo esperançar. Esperançar é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir!”.

Avanços no ambiente regulatório para fundos patrimoniais

Publicado originalmente no Migalhas em 5 de novembro de 2025. Acesse clicando aqui

Por Flavia Regina de Souza, Sócia da área de Filantropia e Impacto Social da Mattos Filho Advogados

Os fundos patrimoniais, conhecidos internacionalmente como endowments, são instrumentos consolidados há séculos, sobretudo em países de common law, como Estados Unidos e Inglaterra, que possuem um arcabouço legal robusto e incentivos fiscais para atrair capazes de atrair capital de longo prazo para causas de interesse público.

No Brasil, os endowments ainda são relativamente recentes. Em 2025, celebramos seis anos da sanção da lei 13.800/19, marco regulatório que impulsionou a criação e estruturação de fundos patrimoniais no país. Desde então, observamos avanços significativos na consolidação desse instrumento como uma alternativa segura e perene para o financiamento de causas de interesse público.

O Anuário de Desempenho de Fundos Patrimoniais 2024, publicação desenvolvida pelo IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, lançada no último dia 30, aponta um cenário promissor. A edição contou com 92 fundos participantes, que representam 75% do universo mapeado (121 fundos ativos em 2024), e analisou um patrimônio agregado de R$139 bilhões – quase doze vezes o montante reportado na primeira edição em 2021. Esses números evidenciam o aumento na adoção do modelo, o ganho de escala e a confiança de doadores e gestores na governança, na transparência e na capacidade de geração de resultados de longo prazo.

Apesar disso, entre os 92 respondentes, apenas 20 relatam estar enquadrados na lei 13.800/19, indicativo de que ainda há oportunidades para o aperfeiçoamento do ambiente regulatório e tributário, para ampliar a previsibilidade para doadores, organizações gestoras de fundos patrimoniais (OGFPs) e instituições apoiadas.

Nesse sentido, vale destacar importantes avanços nesse ano de 2025, que certamente impactarão no fortalecimento e no desenvolvimento de fundos patrimoniais no Brasil.

Entre os movimentos mais relevantes, destaca-se o PL 2.440/23, aprovado pelo Senado Federal em dezembro de 2024. Atualmente em análise na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, se aprovado, o Projeto seguirá para sanção presidencial. O texto propõe medidas capazes de transformar o ambiente jurídico e financeiro dos fundos patrimoniais ao reconhecer, de forma expressa, um regime tributário mais benéfico para as OGFPs, assegurando isenção de tributos Federais – como IRPJ, IRRF, CSLL e Cofins – sobre rendimentos de aplicações financeiras, ganhos de capital e demais receitas.

O Projeto também confere segurança jurídica adicional ao explicitar a possibilidade de as OGFPs adquirirem participações societárias e aplicarem recursos no exterior sem prejuízo do regime tributário aplicável. Nesse mesmo sentido, o texto esclarece a dedutibilidade, por pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real, das doações efetuadas às OGFPs, permitindo a dedução da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, respeitados os limites de 1,5% ou 2%, a depender da natureza da instituição apoiada.

Outro avanço importante decorre da derrubada, pelo Congresso Nacional, do veto presidencial que impedia o reconhecimento de que os fundos patrimoniais não são contribuintes do IBS – Imposto sobre Bens e Serviços e da CBS – Contribuição sobre Bens e Serviços. Ao afastar a sujeição desses instrumentos aos tributos previstos na reforma tributária, o legislador reforça a natureza e a finalidade pública dos fundos patrimoniais, preservando sua eficiência operacional e a integridade do principal.

No campo setorial, merece destaque a IN MinC 26/25, que regulamentou o incentivo fiscal a doações destinadas à constituição e à ampliação de fundos patrimoniais culturais no âmbito do Pronac (lei Rouanet). Pela primeira vez, a política de fomento cultural reconhece a relevância de projetos voltados à sustentabilidade financeira de longo prazo de instituições culturais, geridos por OGFPs. A norma estabelece que pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real podem deduzir até 40% das doações realizadas a fundos patrimoniais culturais como despesa operacional, limitado a 4% do IRPJ devido. Para pessoas físicas, a dedutibilidade alcança 80%. Esse desenho estimula o fortalecimento patrimonial das organizações culturais, induzindo maior estabilidade de receitas e planejamento de longo prazo.

Essa é, sem dúvida, mais uma grande vitória para o setor e demonstra claramente que o arcabouço jurídico relativo às OGFPs está evoluindo no Brasil, para impulsionar os fundos patrimoniais criados sob a égide da lei 13.800/19.

É igualmente importante registrar que os fundos patrimoniais próprios – isto é, aqueles que não se estruturam nos termos da lei 13.800/19 e integram a estrutura da própria organização – permanecem como alternativas válidas para a sustentabilidade financeira de longo prazo, sobretudo quando acompanhados de boas práticas de governança, segregação patrimonial e políticas de investimento e de gasto claramente definidas.

Independentemente do arranjo institucional adotado, os fundos patrimoniais são instrumentos essenciais para consolidar a cultura de doação no país. Ao assegurar a destinação perene e sustentável de recursos a causas e entidades de interesse público, contribuem para a continuidade de projetos e programas, a resiliência institucional e a atração de capital filantrópico.

Os avanços regulatórios de 2025 – do PL 2.440/23 à consolidação da não incidência de IBS e CBS, passando pelo incentivo inédito da lei Rouanet aos fundos patrimoniais culturais – evidenciam o amadurecimento do arcabouço jurídico aplicável às OGFPs e aos endowments brasileiros. O Anuário registra esse momento e se consolida como instrumento de mobilização, capaz de engajar gestores, doadores, formuladores de políticas públicas e a sociedade civil na construção de um ambiente jurídico e cultural mais propício ao desenvolvimento perene e sustentável de causas de interesse público. Ao iluminar conquistas e desafios, reforça a importância de consolidarmos normas estáveis, incentivos alinhados e governança de alto padrão para que os fundos patrimoniais cumpram seu papel transformador no Brasil.

Estudo apoiado pela Fundação Rockefeller propõe transformar a filantropia na América Latina e no Caribe

Um novo relatório, ‘Cinco agendas para ativar a transformação do setor filantrópico na América Latina e no Caribe’, apoiado pela Fundação Rockefeller e elaborado pela The Resource Foundation e pela Dalberg Advisors, analisa o papel atual da filantropia na região e propõe uma abordagem inovadora e local para fortalecer os resultados em comunidades e populações latino-americanas e caribenhas. O estudo conclui que as doações filantrópicas são muito menores do que em outras partes do mundo, mesmo quando as necessidades continuam crescendo.

No entanto, segundo os autores, a filantropia na América Latina e no Caribe tem o potencial de mobilizar mais de US$ 5 bilhões por ano, caso seja ativado apenas 1% da riqueza privada da região — valor comparável ao total da ajuda internacional atualmente recebida.

O estudo também identifica os principais desafios estruturais enfrentados pelo setor filantrópico, incluindo a falta de investimento estratégico e a desconfiança pública, e faz um chamado para que líderes filantrópicos repensem a forma como os recursos são geridos.

“A América Latina e o Caribe têm um potencial filantrópico enorme, mas ainda não ativado. Precisamos de uma filantropia que vá além das soluções temporárias e trabalhe por mudanças estruturais e sustentáveis”, afirmou Lyana Latorre, vice-presidente da Fundação Rockefeller para a América Latina e o Caribe.

Lyana Latorre apresenta estudo para grupo de empresas do IDIS

 

Transformando generosidade em impacto sustentável

O estudo evidencia que a cultura filantrópica na região é menos formalizada do que em outras partes do mundo. Segundo o World Giving Index, as doações privadas representam apenas 0,2% a 0,3% do PIB, bem abaixo de economias desenvolvidas como os Estados Unidos (1,5%) ou o Canadá (1%) e até 50% menores que economias comparáveis, como Indonésia ou África do Sul (ambas em torno de 0,4%).

De acordo com o BID, em sua publicação de 2024 “As complexidades da desigualdade na América Latina e no Caribe”, o contraste é ainda maior quando se considera que o 10% mais rico ganha 12 vezes mais que o 10% mais pobre. Já a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) aponta que quase 200 milhões de pessoas vivem na pobreza e 70 milhões em extrema pobreza, totalizando cerca de 270 milhões. Essa desigualdade estrutural é agravada pelos efeitos das mudanças climáticas, como mostra o Índice de Vulnerabilidade ao Financiamento Climático (CliF), que coloca oito países da região entre os mais vulneráveis do mundo, combinando exposição a eventos extremos e baixa capacidade financeira.

 

Um chamado para reforçar a confiança e ativar recursos locais

Nesse contexto, a ajuda internacional também vem sendo reduzida de forma drástica, já que muitos países estão diminuindo seus orçamentos de cooperação. Isso representa um grande desafio para a América Latina e o Caribe. Em resposta, o novo relatório destaca a necessidade urgente de fortalecer a filantropia local e regional, garantindo a continuidade de iniciativas transformadoras em benefício das comunidades.

Outro desafio importante é a falta de confiança: segundo o Latinobarómetro, apenas 27% dos latino-americanos confiam nas ONGs, o que limita a disposição de doar por canais formais. Além disso, há uma forte presença da chamada “filantropia silenciosa” ou generosidade invisível, em que muitas pessoas fazem doações diretas a comunidades ou causas locais sem que esses recursos sejam contabilizados ou articulados de forma estratégica.

Em contraste com a falta de confiança, a população da região demanda ações concretas e resultados tangíveis. De acordo com uma pesquisa recente da Fundação Rockefeller, 78% dos latino-americanos apoiam a cooperação internacional se ela demonstrar resultados efetivos, um índice superior à média global de 75%.

“Em todo o mundo, a filantropia desempenha um papel fundamental ao unir aliados, mobilizar recursos e ampliar soluções que melhoram a vida e o bem-estar das pessoas”, afirmou Elizabeth Yee, vice-presidente executiva de Programas da Fundação Rockefeller. “Com base em nossa trajetória na região, temos orgulho de acompanhar organizações filantrópicas e outros parceiros na América Latina e no Caribe na construção de um futuro mais saudável, seguro e próspero.”

 

Cinco agendas para transformar a filantropia

A partir desse diagnóstico, o estudo propõe cinco agendas estratégicas para transformar a filantropia na América Latina e no Caribe. Essas agendas surgiram de um amplo processo de escuta, desenhado com plena consciência da diversidade e complexidade do ecossistema filantrópico regional. Mais de 70 líderes da região — incluindo organizações filantrópicas, empresas, grupos da sociedade civil e atores locais — compartilharam suas perspectivas em entrevistas e grupos focais. O processo também foi alimentado pela análise de mais de 40 relatórios e estudos, garantindo uma base sólida e diversa de evidências.

1. Colaboração radical: Promover uma mudança cultural na forma como as organizações trabalham juntas. A co-investimento sem cocriação é apenas coordenação, não colaboração genuína. O estudo propõe passar de projetos isolados para alianças sustentadas, com estruturas de governança compartilhadas, metas comuns e mecanismos conjuntos de avaliação.

2. Mobilização de recursos locais: Estimular uma nova geração de doadores que enxerguem a filantropia como instrumento de transformação social, e não apenas de assistência. O desafio é ampliar as fontes de financiamento, integrar novos atores (famílias, empreendedores e empresas emergentes) e criar incentivos, tanto governamentais quanto de mercado, que facilitem a participação contínua. A realidade atual não é falta de riqueza, mas incapacidade de ativá-la.

3. Investimento com propósito: Priorizar a qualidade sobre o volume dos recursos. O estudo destaca a necessidade de desenhar investimentos mais estratégicos, que meçam o retorno em termos de impacto social, sustentabilidade e fortalecimento institucional — e não apenas em resultados imediatos. Quando os recursos são tratados como caridade, o alcance é limitado; quando são aplicados como investimento social, podem impulsionar mudanças sistêmicas.

4. Liderança local: Tratar comunidades apenas como beneficiárias cria dependência. É necessário reconhecer o conhecimento e a capacidade das comunidades para gerir seu próprio desenvolvimento, garantindo que elas sejam parceiras do processo. As agendas filantrópicas devem se adaptar às realidades territoriais, respeitar os saberes locais e construir soluções alinhadas aos contextos culturais, econômicos e ambientais de cada lugar.

5. Profissionalização do setor: fortalecer o sistema filantrópico não deve ser visto como gasto administrativo. É preciso investir em uma infraestrutura moderna, com melhores sistemas de informação, talentos especializados e mecanismos de transparência e prestação de contas que aumentem a legitimidade e a efetividade do setor.

“A filantropia na América Latina e no Caribe tem uma energia latente enorme. O capital existe, o talento também. O que precisamos agora é ativá-los com propósito, construir confiança e mostrar que investir na região não é assistencialismo, mas sim estratégia de desenvolvimento”, afirmou Beatriz Guillén, diretora executiva da The Resource Foundation.

Monitor de Fundos Patrimoniais no Brasil

O Monitor de Fundos Patrimoniais no Brasil é uma iniciativa do IDIS e da Coalizão pelos Fundos Filantrópicos para o acompanhamento de endowments em atividade no Brasil.

Os dados são obtidos a partir de questionários respondidos por gestores destes fundos ou por meio da consulta pública em sites ou veículos de imprensa.

A atualização é constante. Para passar a integrar o levantamento ou modificar algum dado, gestores de fundos patrimoniais podem preencher o questionário oficial. Solicite o link escrevendo para comunicacao@idis.org.br

Acesse aqui os dados disponíveis sobre os fundos patrimoniais mapeados.

O Monitor de Fundos Patrimoniais no Brasil identificou 123 fundos patrimoniais ativos, cujo patrimônio total informado é de R$ 137.733.215.491.

Acesse abaixo a planilha completa com informações sobre as causas dos fundos e também fonte da informação.

Monitor IDIS dE Fundos Patrimoniais no Brasil – levantamento completo

 

Nome 

Ano da criação

Patrimônio

Sede

Amigos da Alef Peretz Organização Gestora do Fundo Patrimonial 2021 R$ 20.219.121 SP
Associação Amigos da Escola Paulista de Medicina (Unifesp) 2019 R$ 2.412.366 SP
Associação Amigos Direito UERJ 2017 R$ 349.948 RJ
Arcanjos Endowment Não informado
ASA – Associação Santo Agostinho 2018 R$ 106.000.000 SP
Associação de Assistência à Criança e ao Adolescente Cardíacos e aos Transplantados do Coração (ACTC)
2023 R$ 25.083.611 SP
Associação Endowment Direito GV 2011 R$ 6.655.200 SP
Associação Escola Panamericana de Porto Alegre 2022 R$ 15.000.000 RS
Associação Feminina de Estudos Sociais e Universitários (AFESU) 2018 R$ 595.984 SP
Associação Fundo Areguá 2016 R$ 12.873.091 SP
Associação Fundo Patrimonial Amigos da Poli (Escola Politécnica da USP) 2012 R$ 63.500.00 SP
Associação Fundo Patrimonial – AXUXÊ (Faculdade de Medicina da FMABC) 2023 R$ 61.039 SP
Associação Fundo Patrimonial Patronos (Unicamp – alunos) 2020 R$ 2.500.000 SP
Associação Gestora do Fundo Patrimonial em Apoio à Faculdade de Direito da UFRGS 2021 Não informado RS
Associação Gestora do Fundo Patrimonial Endowment Chronos (USP São Carlos – comunidade) 2024 R$ 1.500.000 SP
Associação São Joaquim Não informado SP
Associação Umane 2016 R$ 1.432.342.244 SP
Fundo Baobá 2016 R$ 131.866.834 SP
C de Cultura 2017 R$ 20.833.679 SP
Casa Pequeno Mundo Não informado SP
Conecta EAUFBA (Escola de Administração da UFBA) 2022 R$ 150.000 BA
Endowment Alumni Direito Mackenzie 2022 R$ 2.000 SP
Endowment do CEAP 2018 R$ 654.178 SP
CIP – Congregação Israelita Paulista 2015 Não informado SP
Endowments do Brasil – Fundo Trans Casa Chama 2022 Não informado SP
Endowment IRM (Instituto Rodrigo Mendes) 2015 R$ 45.718.567 SP
Endowment PUC-Rio 2019 R$ 7.069.152 RJ
Endowment Sempre FEA (FEAUSP – alunos) 2020 R$ 10.200.000 SP
Fonte Endowment 2023 Não informado DF
Fundação Antonio e Helena Zerrenner INB 1936 R$ 32.711.417.000 SP
Fundação Ary Frauzino para Pesquisa e Controle do Câncer (Fundação do Câncer) 1991 R$ 65.390.000 RJ
Fundação Banco do Brasil 2008 R$ 283.628.879 DF
Fundação Bradesco 1956 R$ 91.000.000.000 SP
Fundação Carlos Chagas – FCC 1964 Não informado SP
Fundação Darcy Chagas 2020  R$6.297.772 RJ
Fundação de Apoio ao Desenvolvimento Científico da Universidade Estadual de Maringá – FADEC-UEM 2024 R$ 4.576 PR
Fundação de Desenvolvimento de Tecnópolis (Funtec)  2021 R$ 186.476 GO
Fundação Dorina Nowill 2023 Não informado SP
Fundação Estudar 2018 R$ 53.164.832 SP
Fundação Fundo Brasil de Direitos Humanos 2007 R$ 45.871.106 SP
Fundação Fundo Patrimonial FEAUSP (gestores) 2015 R$ 1.622.626 SP
Fundação Gestora de Fundo Patrimonial da Universidade de São Paulo (USP) 2021 R$ 23.997.260 SP
Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza 1996 R$ 34.093.271 PR
Fundação Itaú 1988 R$ 4.184.901.000 SP
Fundação José Luiz Setúbal 2016 R$ 365.440.002 SP
Fundação Lia Maria Aguiar – FLMA 2008 R$ 680.000.000 SP
Fundação Maria Emilia Não informado BA
Fundação St. Pauls de Apoio à Educação 2021 R$ 26.147.000 SP
Fundação Tide Setubal 2010 R$ 120.732.446 SP
Fundação Uniselva 2002 R$ 681.949 MT
Fundo Amanhã (Administração UFRGS) 2022 R$ 2.809.966 RS
Fundo Apontar 2015 R$ 20.000.00 RJ
Fundo Betinho – Ação da Cidadania 2018 R$ 69.514.534 RJ
Fundo Catarina 2021 R$ 2.190.029 SC
Fundo Centenário (Escola de Engenharia da UFRGS) 2019 R$ 2.836.048 RS
Fundo Comunitário da Maré – FCDM 2021 R$ 21.496.205 RJ
Fundo de Apoio ao Desenvolvimento da Sociedade (Fundação Dom Cabral) 2019 R$ 40.814.047 MG
Fundo de Apoio ao Jornalismo Investigativo – F/ABRAJI  2016 Não informado SP
Fundo de Capital – Endowment – Fundação Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de SP) 2006 R$ 66.590.563 SP
Fundo de Educação Social do Instituto Elos 2021 R$ 1.590.311 SP
Fundo de Endowment do Instituto Líderes do Amanhã 2019 R$ 4.200.000 ES
Fundo de Fomento à Filantropia – FFF (IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social) 2024 R$ 10.100.000 SP
Fundo de Sustentabilidade Financeira (FALM – Fundação André e Lúcia Maggi) 2017 R$ 20.026.888 MT
Fundo FICA 2015 R$ 150.000 SP
Fundo Figueira 1964 Não informado SP
Fundo FAS (Fundação Amazônia Sustentável) 2008 R$ 52.727.000 AM
Fundo Gerações 2008 R$ 2.646.000 RS
Fundo Helda Gerdau 2019 Não informado RS
Fundo iGMK – Instituto George Mark Klabin 1994 R$ 11.544.403 SP
Fundo Patrimonial Amigos do Hospital do Fundão (RJ) 2016 Não informado RJ
Fundo Patrimonial Amigos da Univali 2019 R$ 116.636 SC
Fundo Patrimonial Amigos do Brasil Central 2019 R$ 60.000 GO
Fundo Patrimonial Associação Projeto Gauss – FPPG 2019 R$ 5.589.899 SP
Fundo Patrimonial Augere (FMUSP) 2015 R$ 234.440 SP
Fundo Patrimonial Aventura de Construir – Já, Devagar e Sempre 2023 R$ 568.785 SP
Fundo Patrimonial BrazilFoundation 2010 R$ 1.902.133 RJ
Fundo Patrimonial da Brazil Startups 2022 R$ 10.000 DF
Fundo Patrimonial da Fundação Delfim Mendes Silveira (FDMS) – UFPel 2024 Não informado RS
Fundo Patrimonial da Fundação Grupo Volkswagen 2002 R$ 275.069.659 SP
Fundo Patrimonial da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal 1965 R$ 622.800.000 SP
Fundo Patrimonial da Fundação Romi 1999 R$ 84.000.000 SP
Fundo Patrimonial da UFC 2024 Não informado CE
Fundo Patrimonial da UNICAMP – LUMINA (Reitoria) 2020 R$ 4.557.853 SP
Fundo Patrimonial do IMS 1995 R$ 1.250.000.000 SP
Fundo Patrimonial do Instituto Acaia 2016 R$ 427.935.060 SP
Fundo Patrimonial do Instituto Alana 2013 R$ 461.988.062 SP
Fundo Patrimonial do Instituto Ayrton Senna 2017 R$ 153.000.000 SP
Fundo Patrimonial do Reciclar 2016 R$ 7.771.572 SP
Fundo Patrimonial Eliezer Max Não informado Não informado RJ
Fundo Patrimonial PROSPERA – Unesp 2022 R$ 1.000.000 SP
Fundo Perpetuidade SOS Mata Atlântica 2009 R$ 69.724.835 SP
Fundo Patrimonial UFV 2024 Não informado MG
Fundo Polifonia (Orquestra de Novo Hamburgo) 2025 Não informado RS
Fundo ReCivitas da Renda Básica 2020 R$ 110.000 SP
FUNSAI (Fundação Nossa Senhora Auxiliadora do Ipiranga) 1943 R$ 135.000.000 SP
FUTURE – Fundo Territórios Unidos por Recursos para a Educação 2023 R$ 1.600.000 AM
Futurin – Funds for life (Hospital Pequeno Príncipe) 2024 R$ 3.000.000 PR
Gaia Legado 2024 R$ 75.000.000 SP
Gene – Fundo Patrimonial do IFSP (Instituto Federal de São Paulo) 2024 R$ 32.127 SP
Indeed 2023 Não informado
INSPER 2022 R$ 7.923.594 SP
Instituto Artigo 220 (Revista Piauí) 2018 R$ 440.151.294 RJ
Instituto Fundo Patrimonial Reditus (UFRJ – alunos) 2019 R$ 17.712.724 RJ
Instituto Ibirapitanga 2016 R$ 643.497.979 RJ
Instituto Jô Clemente R$ 109.361.000 SP
Instituto Merula Steagall 2022 R$ 1.588.000 SP
Instituto Serrapilheira 2016 R$ 602.034.888 RJ
Instituto Sol 2017 R$ 1.431.624 SP
Instituto Unibanco 2009 Não informado SP
IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas 2007 R$ 15.123.969 SP
ITA Endowment 2023 R$ 1.863.202 SP
Liga Solidária 2020 R$ 109.700.000 SP
MASP Endowment 2017 R$ 19.799.518 SP
Minerva Impacto 2024 RJ
Organização Gestora de Fundo Patrimonial da Sociedade Beneficente de Senhoras Hospital Sírio-Libanês 2021 R$ 18.836.870

SP
PDR – Purpose Driven Resources 2023 R$ 72.000.000 SP
Primatera Fundo Patrimonial 2020 R$ 200.445 SP
Rio Endowment 2022 R$ 206.528 RJ
Rogério Jonas Zylbersztajn (RJZ) 2019 R$ 219.000.000 RJ
Semear 2022 R$ 18.591 MG
Sempre Sanfran (Faculdade de Direito USP – alunos) 2021 R$ 12.252.164 SP
Turim – Saúde Criança (Instituto Dara) 2008 R$ 18.382.338 RJ
WimBelemDowment – Organização Gestora de Fundo Patrimonial 2021 R$ 256.497 RS

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Dilema de horizontes: curto versus longo prazo na gestão de fundos patrimoniais

por Diego Martins, sócio da Pragma Gestão de Patrimônio

Desde as primeiras discussões sobre a criação deste Anuário, ainda em 2021, já havia a expectativa de que o tempo seria seu melhor companheiro. Não só pelo aumento natural das séries de dados observados, mas também por se tornar um testemunho da evolução do ecossistema de fundos patrimoniais brasileiros. Quatro anos depois, os resultados apresentados nesta publicação falam por si só: houve um sensível incremento de 40 para 92 fundos reportados, cobrindo um patrimônio total de R$ 139 bilhões (ante R$ 12 bilhões em 2021) e, o mais importante, foram mapeados R$ 2,8 bilhões em recursos gerados pelos fundos patrimoniais, contra R$ 338 milhões no anuário de 2021.

No entanto, no que tange à alocação de ativos, nota-se pouca evolução desde o início da série histórica em 2019. Ainda que na divisão por faixas de patrimônio se observe alguma variabilidade (o que pode ser efeito do recorte de amostras menores, que admitem a entrada de novos pontos no tempo), no agregado, os portfólios têm se mantido em torno de 80% alocados em renda fixa brasileira (entre 20% e 30% alocados em ativos pós-fixados). Portanto, trata-se ainda de carteiras muito pouco diversificadas.

Para ser justo com os dados, é possível argumentar que houve alguma variabilidade de alocação ao longo da série – notadamente em 2020 e 2021, com um incremento na alocação em renda variável doméstica. Entretanto, tratou-se de um movimento com vida curta e de característica cíclica, dado o ambiente de juros muito baixos e a boa performance da bolsa. Logo, um comportamento antagônico ao que se esperaria para um endowment que, dado seu horizonte alongado, tem maior tolerância estrutural a riscos e capacidade de ser contracíclico.

É compreensível que fundos patrimoniais menores ou nascentes tenham uma alocação menos sofisticada e concentrada em ativos de renda fixa, basicamente por questões operacionais ou de custos. Todavia, a alocação preponderante em renda fixa é observada em todas as faixas de patrimônio – mesmo na faixa mais alta (acima de R$ 500 milhões), sabidamente influenciada por organizações que detêm mais ações, devido a questões históricas de dotação inicial.

O nível elevado de juros nominais e reais pagos por títulos públicos brasileiros também é frequentemente evocado como justificativa para a alocação massiva em renda fixa local. De fato, em um ambiente de juros reais positivos, iguais ou acima da meta de retorno de muitos fundos patrimoniais, é de se esperar uma alocação estrutural em renda fixa mais elevada do que a observada em endowments internacionais. Contudo, não se pode perder de vista que não há “almoço grátis” no mercado financeiro, e que juros altos andam de mãos dadas com riscos elevados. Aliás, se há um almoço grátis nos mercados, como preconizava Harry Markowitz, ele é a diversificação de ativos, e não a concentração quase absoluta em um único fator de risco.

Ao mesmo tempo, ter alocações elevadas em renda fixa é uma posição confortável para os gestores de fundos patrimoniais. Afinal, ela maximiza as chances de se atingir metas de retorno real em um horizonte mais curto, com menos risco de mercado. Mas não deixa de se expor a vários outros riscos, como o risco de reinvestimento dos papéis que vencem no tempo e, por que não, o risco de repactuação de dívidas ou default. Mesmo os ativos pós-fixados carregam a incerteza de gerar ganhos reais (como foi o caso recente no período de 2020 a 2022, quando o CDI auferiu retornos reais negativos). Todos esses riscos se tornam mais evidentes em janelas mais dilatadas de tempo – justamente as que são relevantes para o horizonte perpétuo de investimento de um endowment.

Esse conflito não é novo, tendo já sido abordado por Charles Ellis em um artigo intitulado “O Paradoxo”[1], na década de 80. Nele, Ellis aponta para um paradoxo existente em investidores com horizonte de longo prazo, mas que tendem a otimizar objetivos de curto prazo. Ele chega à conclusão de que, no caso de investidores institucionais, tem-se uma situação particular de conflito de agência, na qual não há um principal, somente agentes. Isso porque pools de capital filantrópico geralmente não possuem um “dono” explícito, apenas agentes que compõem seus órgãos de governança e que administram os recursos em nome da organização.

Além disso, os membros desses órgãos de governança são geralmente voluntários que, naturalmente, buscam minimizar o seu risco reputacional individual. Soma-se ainda o fato de que, muitas vezes, seus mandatos são curtos (de dois ou três anos) quando comparados ao horizonte de investimento alongado de um fundo patrimonial.

Assim, segundo Ellis, a ausência de um “dono”, a minimização de riscos reputacionais, e a falta de alinhamento entre os horizontes de mandatos e decisões de investimento explicam o curto-prazismo na gestão de recursos institucionais. Nessas condições, os agentes não otimizam os objetivos de longo prazo; eles tendem a assumir uma postura mais defensiva, buscando retornos satisfatórios enquanto evitam assumir posições menos convencionais.

Dado esse diagnóstico, algumas medidas podem ser tomadas pelas organizações filantrópicas para mitigar esses efeitos. A primeira delas é ter uma política de investimentos robusta, por se tratar do documento que norteará o comitê de investimentos na sua tomada de decisões. Logo, ela deve ser explicitamente orientada para o longo prazo em seus objetivos, possibilidades de investimento e mensuração de sucesso. Também deve contemplar claramente os riscos que o fundo patrimonial não pode suportar, assim como deve dar clareza aos riscos que o portfólio pode assumir, evidenciando o custo de oportunidade que existe quando um risco tolerável não é incorrido.

Outra medida relevante é a definição de uma regra de resgates adequada às necessidades da causa apoiada. Uma regra mal calibrada pode propagar a volatilidade de curto prazo dos investimentos (altamente tolerável por portfólios de longo prazo) para o orçamento anual da organização, gerando uma pressão interna por alocações mais conservadoras. Apesar de ser um problema relativamente novo para a realidade brasileira, endowments norte-americanos já endereçaram esse dilema há quase 50 anos, com a adoção de regras de resgate suavizadas (como a conhecida “regra de Yale”).

Uma última iniciativa considerável consiste em promover maior alinhamento entre o horizonte de investimento do fundo patrimonial e os mandatos de seus decisores. Frequentemente, diretores de investimento de endowments de renome atribuem parte de seu êxito à existência de comitês de investimento longevos, estáveis e coesos. Para tanto, uma medida prática possível é a de alongar o mandato dos membros do comitê ou permitir reconduções indefinidas para a posição. Indo além, a qualidade da composição do comitê é crucial para o seu sucesso. Seus membros devem não só ter competências complementares, mas também capacidade de tomar riscos toleráveis e postura contracíclica.

Por fim, é importante reforçar que os membros da governança de um fundo patrimonial têm um dever fiduciário para com ele. E tal dever não se limita tão somente a não correr riscos intoleráveis pelo fundo. Ele também se estende à obrigação de fazer a melhor aplicação possível do seu capital, buscando o melhor retorno de longo prazo através do uso dos fatores de risco aceitáveis. Afinal, se por um lado o comitê de investimentos precisa evitar perdas permanentes de capital, por outro, também deve estar atento ao custo de oportunidade de não assumir riscos que seriam toleráveis.

[1] ELLIS, Charles D. The Paradox. In: ELLIS, Charles D.; VERTIN, James R. (Ed.). Classics – An Investor’s Anthology. Homewood, Ill: Business One Irwin, 1989. p. 681–688.

A profissionalização da gestão financeira de endowments: perspectivas para a perenidade institucional

Por Fernanda Camargo, sócia-fundadora, e Cristiane Parisi, sócia, ambas da Wright Capital

Fundos patrimoniais são estruturados para garantir a sustentabilidade financeira de instituições sem fins lucrativos. Com gestão e governança de longo prazo, visam preservar o patrimônio e aplicar seus rendimentos em projetos alinhados à missão institucional. Essa estrutura reduz a dependência de arrecadações pontuais e protege a organização em cenários adversos. Contudo, a consolidação desses fundos no Brasil depende, cada vez mais, da adoção de práticas de gestão financeira profissionais e orientadas ao longo prazo.

Em 2002, o livro Pioneering Portfolio Management, de David Swensen (SWENSEN, 2009), gestor do endowment de Yale, marcou o início de nossa atuação com gestão patrimonial, destacando a importância de portfólios diversificados e resilientes a ciclos econômicos. Naquela época, o mercado de capitais no Brasil ainda era restrito e não se falava de longo prazo – estávamos saindo de um cenário de juros e inflação muito altos.

Desde então, avanços significativos fortaleceram a filantropia estruturada no Brasil. O IDIS, atuando desde 2011 nesse tema, conseguiu a promulgação da Lei nº 13.800 em janeiro de 2019, que regulamenta os fundos patrimoniais. Entre outras conquistas, destacam-se a isenção do ITCMD para doações a fundos vinculados a instituições qualificadas como OSCIP ou fundações de direito privado, e o reconhecimento da imunidade do IBS e do CBS para entidades sem fins lucrativos nas áreas de educação e assistência social, mesmo sem o CEBAS — embora essa imunidade não se aplique a todas as causas.

Gestão profissionalizada, alocação de ativos e horizonte de longo prazo

Mesmo com todo o arcabouço normativo, a profissionalização – entendida como a combinação de governança robusta, estratégia de investimentos com abordagem atuarial, operação diligente e transparência – é o fator que converte boas intenções em resultados duradouros (SWENSEN, 2009; MAGINN et al., 2016). O objetivo é preservar o patrimônio do fundo no longo prazo, preservando seu valor corrigido pela inflação, e usar um percentual (spending rate) para custear projetos sociais.

É dessa perspectiva que a técnica atuarial de Asset Liability Management (ALM) ganha relevância. Ela consiste em alinhar os ativos financeiros com os compromissos futuros da instituição, garantindo que os recursos estejam disponíveis para cumprir sua missão ao longo do tempo. Essa abordagem permite preservar o valor do patrimônio corrigido pela inflação e definir uma taxa de resgate para financiar projetos sociais, com flexibilidade em anos específicos.

Embora muitos fundos ajustem diariamente o valor de mercado de seus ativos com base em fórmulas como a divisão dos fluxos de caixa fixos e permanentes pela taxa de desconto, essa prática isolada pode levar a decisões que não consideram os compromissos futuros da organização.

No Brasil, onde as taxas de juros são historicamente elevadas, é comum que os comitês de investimento priorizem alocações consideradas de “baixo risco”, baseadas em análises de curto prazo. Esse comportamento pode gerar um paradoxo: para garantir que o fundo cumpra sua missão, seria necessário investir em ativos de longo prazo, que naturalmente apresentam maiores oscilações. A solução está em integrar os compromissos futuros – o chamado “passivo” – na análise de risco da carteira, utilizando o valor de mercado desses fluxos de caixa descontados como referência. Essa abordagem, amplamente adotada internacionalmente, permite que o fundo maximize suas chances de sucesso e reforce o papel estratégico do ALM na gestão de recursos de longo prazo.

A literatura internacional é também cristalina ao recomendar a formulação de uma meta de retorno real (acima da inflação) capaz de sustentar os gastos com a missão e os custos, preservando o principal em horizontes multigeracionais (SWENSEN, 2009; HARVARD MANAGEMENT COMPANY, 2023; YALE INVESTMENTS OFFICE, 2023). Essa meta, normalmente expressa como “inflação + spending + custos”, oferece a régua de coerência entre o que se promete à missão e o que se exige da carteira.

Embora coerente com a preferência por segurança e liquidez, concentração em renda fixa, por sua vez, sobretudo em ativos atrelados à inflação (NTN‑Bs) e ao CDI, limita o potencial de crescimento real e pode aumentar o risco de descasamento entre obrigações de gastos e retornos futuros, notadamente em ambientes de mudança estrutural de juros e inflação (YALE INVESTMENTS OFFICE, 2023; HARVARD MANAGEMENT COMPANY, 2023), o que reforça a necessidade de disciplina e realismo nas premissas.

A literatura corrobora que endowments resilientes tendem a combinar segurança de curto prazo com diversificação estrutural em classes de ativos e geografias (quando aplicável), inserindo ativos reais (imóveis) e alternativos (como fundos de Private Equity) sob regras estritas de governança e liquidez, e amparados por mecanismos de suavização de gastos, como médias móveis (SWENSEN, 2009; GOETZMANN; OSTER, 2004). Tal arquitetura reduz a pró‑ciclicidade e protege a missão ao longo de choques.

Evidências brasileiras indicam que a cultura de planejamento dos fundos patrimoniais ainda está em fase de consolidação. Segundo o Anuário de Desempenho de Fundos Patrimoniais 2024, realizado pelo  IDIS, 53% dos fundos pesquisados não possuem metas formais de rentabilidade. A ausência de metas tende a refletir estruturas de gestão incipientes, lacunas de conhecimento técnico em alocação e priorização de segurança e liquidez em detrimento de retorno, traços típicos de setores em fase inicial de institucionalização. Na prática, metas objetivas são a base para políticas de alocação, para o desenho de benchmarks e para a prestação de contas a conselhos, doadores e beneficiários (NACUBO, 2024; MAGINN et al., 2016).

Inferências sobre maturidade setorial e o papel dos dados

A maturidade de um fundo patrimonial está diretamente ligada à capacidade de transformar princípios em processos estruturados, auditáveis e orientados por dados.

No Brasil, gestoras independentes como a Wright Capital têm se destacado ao substituir práticas personalistas por governança técnica, com comitês de investimento qualificados e rotinas de monitoramento baseadas em evidências. O ciclo virtuoso começa com um diagnóstico honesto da governança e do portfólio, avança para a formulação de políticas claras (investimento, risco, ESG, conflitos de interesse e spending rate) e culmina em relatórios que traduzem rentabilidade, risco e liquidez em linguagem acessível para conselhos deliberativos, possibilitando a tomada de decisão disciplinada e evitando reações impulsivas a oscilações de mercado.

É esse modus operandi orientado por evidências que distingue endowments maduros e é reiteradamente documentado por referências internacionais (NACUBO, 2024; MAGINN et al., 2016; KOCHARD; RITTEREISER, 2008).

Desafios: metas, formalização e concentração

Os dados do Anuário trazem três alertas com implicações práticas:  ausência de metas atuariais explícitas, como mencionado anteriormente, baixa formalização de processos e alta concentração dos portfólios em renda fixa.

A baixa formalização de processos internos e o foco excessivo na operação comprometem o planejamento estratégico dos fundos patrimoniais, enfraquecendo o papel dos conselhos e dificultando a captação de doações relevantes (IDIS, 2024). Para superar esse cenário, é essencial adotar uma governança robusta, com conselhos deliberativos, comitês técnicos independentes, mandatos claros e políticas formais que definam limites e formas de monitoramento. A estrutura ideal inclui a separação entre fundo operacional (despesas correntes) e fundo patrimonial (preservação de longo prazo), além da definição do spending rate.

Conclusão

A profissionalização da gestão de endowments deixou de ser um ideal aspiracional e tornou-se uma exigência para a perenidade institucional. Os dados do IDIS revelam um campo em amadurecimento, ainda marcado pela ausência de metas claras, concentração excessiva em renda fixa e baixa formalização de processos. A resposta está na adoção disciplinada de governança estruturada, metas atuariais, uso intensivo de dados e políticas que transformem estratégia em rotina. A experiência internacional e os aprendizados práticos de gestores independentes mostram que instituições que seguem esse caminho aumentam sua capacidade de captação, reduzem riscos e cumprem sua missão com legitimidade. Em um cenário de recursos escassos e crescente escrutínio, profissionalizar não é opcional – é a condição econômica da missão.

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Referências (ABNT)

CFA INSTITUTE; MAGINN, John L.; TUTTLE, Donald L.; PINTO, Jerald E.; McLEAVEY, Dennis W. Managing Investment Portfolios: A Dynamic Process. 4. ed. Hoboken: Wiley; CFA Institute, 2016.

CVM – COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS. Resolução CVM nº 175, de 23 de dezembro de 2022 (consolidada em 2023). Dispõe sobre os fundos de investimento. Rio de Janeiro: CVM, 2023. Disponível em: <https://www.gov.br/cvm>. Acesso em: 20 out. 2025.

GOETZMANN, William N.; OSTER, Christopher R. Endowment Asset Management: Investment Strategies in Oxford and Cambridge Colleges. Oxford: Oxford University Press, 2004.

HARVARD MANAGEMENT COMPANY. Annual Report 2023. Cambridge, MA: Harvard University, 2023. Disponível em: <https://www.hmc.harvard.edu>. Acesso em: 20 out. 2025.

IDIS – INSTITUTO PARA O DESENVOLVIMENTO DO INVESTIMENTO SOCIAL. Censo de Fundos Patrimoniais no Brasil: 2024. São Paulo: IDIS, 2024. Disponível em: <https://www.Idis.org.br>. Acesso em: 20 out. 2025.

KOCHARD, Lawrence E.; RITTEREISER, Cathleen M. Foundation and Endowment Investing: Philosophies, Strategies, and Returns of Top Investors. Hoboken: John Wiley & Sons, 2008.

NACUBO – NATIONAL ASSOCIATION OF COLLEGE AND UNIVERSITY BUSINESS OFFICERS; TIAA. NACUBO‑TIAA Study of Endowments (NCSE) 2023–2024. Washington, DC: NACUBO, 2024. Disponível em: <https://www.nacubo.org>. Acesso em: 20 out. 2025.

SWENSEN, David F. Pioneering Portfolio Management: Institutional Investment and Endowment Management. New York: Free Press, 2009.

YALE INVESTMENTS OFFICE. Endowment Update 2023. New Haven, CT: Yale University, 2023. Disponível em: <https://investments.yale.edu>. Acesso em: 20 out. 2025.

Anuário de Desempenho de Fundos Patrimoniais 2024 destaca R$2,6 bilhões destinados a causas de interesse público e consolidação dos endowments no Brasil

Os fundos patrimoniais estão mais fortes do que nunca. É o que revela o Anuário de Desempenho de Fundos Patrimoniais 2024, lançado pelo IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social e pela Coalizão pelos Fundos Patrimoniais Filantrópicos. Com 92 fundos participantes e R$139 bilhões em patrimônio total, o estudo indica a consolidação dessas estruturas como instrumentos de sustentabilidade para causas e organizações no país. O advogado e professor Heleno Torres, Chefe do Departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da USP, assina o prefácio.

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Também conhecidos como endowments, os fundos patrimoniais são estruturas financeiras criadas para garantir a sustentabilidade de longo prazo de causas e organizações.

“Em um cenário de consolidação dos Fundos Patrimoniais no Brasil, a série história do Anuário que inicia em 2019 traz parâmetros para a tomada de decisão de gestores”, destaca Andrea Hanai, gerente de projetos do IDIS.

A partir da gestão de um patrimônio acumulado, apenas os rendimentos são utilizados para financiar projetos sociais, ambientais, culturais, científicos ou educacionais, assegurando a perenidade das iniciativas. De acordo com o Anuário, a principal causa apoiada pelos fundos é a educação (63%), seguido por pesquisa e conhecimento (27%) e assistência social (23%).

A quarta edição da publicação traz informações sobre fluxo de caixa (patrimônio, doações recebidas, investimentos na causa); alocação e rentabilidade dos investimentos; estrutura da governança (com dados sobre a presença de membros independentes e participação feminina), investimento responsável, além de perspectivas para o futuro e artigos com análises de especialistas. Os números do estudo mostram crescimento nas captações (R$ 770 milhões, +48% vs. 2023) R$ 2,6 bilhões destinados a causas, além de um avanço na governança, com 77% dos fundos possuindo políticas de investimento formalizadas e 71% com auditoria externa.

Entretanto, os desafios persistem: mais de 80% dos endowments concentram-se em SP e RJ; ainda que apenas 22% dos fundos estejam formalmente enquadrados na Lei 13.800/19, houve aceleração da criação de fundos após este marco. Além disso, a diversidade de gênero e raça ainda é limitada com, em média, apenas 31% de mulheres e menos de 11% de pessoas pretas, pardas e indígenas (PPI), e somente 26% dos fundos possuem política de investimento responsável implementada.

Com rentabilidade média equivalente 2,19% acima da inflação e aumento do número de fundos com metas financeiras, o Anuário também mostra maior interesse em práticas ESG.

A quarta edição da publicação reforça a importância dos endowments como motores de impacto de longo prazo e contou com o apoio Master da Fundação Bradesco, Fundação Itaú e Movimento Bem Maior, além de apoio de 1618 Investimentos, ASA – Associação Santo Agostinho, Fundação Grupo Volkswagen, Fundação José Luiz Setúbal, Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Mattos Filho, Pragma Gestão de Patrimônio e Wright Capital Wealth Management.

Encontro de Lideranças do Transformando Territórios promove diálogos, vivências e conexão

Iniciativa de impacto do IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, em parceria com a Mott Foundation e Movimento Bem Maior, o Programa Transformando Territórios (TT) realizou mais um Encontro de Lideranças entre os dias 29 de setembro e 1º de outubro, em São Paulo (SP). A atividade reuniu cerca de 40 representantes de 14 Fundações e Institutos Comunitários (FICs) de diferentes regiões do Brasil, em uma imersão marcada por trocas genuínas, aprendizados compartilhados e pelo fortalecimento de uma rede que transforma realidades e impulsiona o desenvolvimento nos territórios.

Com o propósito de aprofundar o conhecimento em governança, fortalecer a troca entre territórios e ampliar conexões com parceiros nacionais e internacionais, o encontro se consolidou como um marco na trajetória das FICs apoiadas pelo TT. Ao longo de três dias, as lideranças viveram uma jornada de aprendizado, imersão territorial e articulação com o ecossistema da filantropia brasileira.

“Em apenas 3 dias, vivemos uma maratona de trocas, aprendizados e conexões. Essa parceria com o IDIS é um marco no nosso caminho de fortalecimento e profissionalização. Juntos, seguimos potencializando as transformações geradas pelas lideranças comunitárias da Grande BH”, depoimento da Associação Nossa Cidade, integrante do Programa.

 

FORMAÇÃO DE GOVERNANÇA 

O primeiro dia do encontro foi dedicado à continuidade da Formação Avançada em Governança, promovida desde agosto em formato remoto com lideranças das organizações participantes. Com apoio do Movimento Bem Maior e da Fundação FEAC, a série de capacitações enfatizou a governança como elemento estruturante da sustentabilidade organizacional nos territórios. Os módulos 3 e 4, realizados no encontro presencial, abordaram temas como transparência, sustentabilidade e gestão participativa. O momento também contou com a participação de Selma Moreira, conselheira do IDIS, em uma roda de conversa com as lideranças comunitárias sobre os desafios e expectativas na relação da alta gestão das organizações com conselhos. 

Representantes das FICs no escritório do IDIS, em São Paulo, para realização da continuidade da formação em governança

 

IMERSÃO NO TERRITÓRIO

No segundo dia, o grupo foi recebido no território do Fundo Comunitário PerifaSul M’Boi Mirim (FCP M’Boi), na zona sul da capital paulista. A vivência teve como propósito valorizar o aprendizado experiencial a partir da prática de uma FIC atuante, além de refletir juntos sobre o caminho trilhado e sonhar, coletivamente, os próximos passos do Programa Transformando Territórios.

As lideranças conheceram de perto organizações e iniciativas locais, como a Horta Comunitária no Jardim Felicidade, a Fundação Julita, o Instituto Favela da Paz e A Banca – Negócio de Impacto da Periferia. Cada visita revelou, na prática, como o engajamento comunitário e a articulação em rede impulsionam o desenvolvimento territorial por meio de soluções que nascem e se fortalecem nos próprios territórios. O almoço no Bloco do Beco, espaço cultural da região, encerrou a manhã com um momento de integração e conexão entre os participantes.

“Trazer as FICs para dentro do M’Boi Mirim é reforçar que soluções nascem quando redes se encontram no território. Este encontro amplia conexões, escuta ativa e cooperação entre quem transforma a partir da base”, comenta Jenyffer Nascimento, Articuladora Comunitária do FCP M’Boi.

Durante a tarde, o grupo participou da Roda de Conversa ‘Territórios em Diálogo’, que reuniu parceiros nacionais do Programa Transformando Territórios e palestrantes internacionais do Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais, promovido pelo IDIS. Estruturada em quatro momentos (reconhecer a força, potencializar juntos, projetar futuros e cuidar da jornada) a roda inspirou reflexões profundas sobre o papel das FICs na mobilização de recursos, na sustentabilidade das iniciativas e na construção coletiva de soluções para os desafios locais. 

Entre os convidados internacionais estavam Felipe Bogotá (TerritoriA – Colômbia) e Patricia McIlreavy (Center for Disaster Philanthropy) e representantes da Tide Setúbal, Movimento Bem Maior, Semente Oré, Ernest Young e Prospera Social.

 

CONEXÃO COM A FILANTROPIA NACIONAL

O encerramento do encontro aconteceu no Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais, também em São Paulo. Além da presença das lideranças das organizações para acompanhar os debates sobre o tema ‘Esperançar’, houve um momento especial para o Programa: a exibição do vídeo manifesto da Websérie Transformando Territórios, além da distribuição de calendários personalizados.

Representantes das FICs no palco do Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais 2025

“Tive a alegria de ser porta-voz desse coletivo, inspirando filantropos e investidores de todo o país com uma mensagem que traduz a nossa essência: a filantropia comunitária territorial transforma quando parte da escuta, do vínculo e da confiança. A Websérie segue sendo esse fio condutor, contando histórias que nos inspiram e reafirmam que o futuro se constrói em rede”, comenta Rosana Ferraiuolo, gerente do programa Transformando Territórios.

A Websérie foi lançada em agosto pelo IDIS, junto ao coletivo de Fundações e Institutos Comunitários, e traz histórias reais de impacto, pertencimento e protagonismo comunitário promovidos pelas FICs em diversas regiões do país. São 14 vídeos cujo mote é a transformação em cada um dos territórios das organizações participantes, passando por Manaus, São Paulo, Maceió, Porto Alegre e diversas outras cidades e regiões metropolitanas.

O Encontro de Lideranças se consolidou como um espaço de construção coletiva, inspiração e fortalecimento das redes de colaboração. Mais do que um encontro, a vivência reafirmou o compromisso do Transformando Territórios em fortalecer organizações que transformam realidades a partir do território, mostrando que a filantropia comunitária territorial é um caminho concreto e sustentável para transformar realidades e semear futuros mais justos e sustentáveis.

O SUS como pilar de esperança para o Norte e o Nordeste

Publicado originalmente no Nexo em 11 de outubro de 2025. Acesse clicando aqui

Por Paula Fabiani, CEO do IDIS, e Carla Reis, Chefe do Departamento do Complexo Industrial e de Serviços de Saúde do BNDES

 

Os 35 anos do Sistema Único de Saúde mostram sua força e seu caráter essencial, sobretudo para territórios do país com desafios agudos

No ano de 1990, o Brasil deu um passo histórico ao criar o SUS (Sistema Único de Saúde). Três décadas e meia depois, celebramos sua longevidade e força. O cuidado chega a todos os cantos do país e se faz ainda mais essencial no Norte e Nordeste, onde vivem cerca de 72 milhões de pessoas — nove em cada dez dependentes exclusivamente do SUS, segundo o IBGE (2020).

Nesse território, os desafios são agudos. A densidade médica, inferior à média nacional, revela a urgência: enquanto o Brasil conta com 3,08 médicos por mil habitantes, segundo o estudo Demografia médica Brasil 2025, o índice cai para 1,7 no Norte e 2,21 no Nordeste. Os indicadores de saúde também refletem essa desigualdade: a expectativa de vida é menor do que a média nacional — cerca de 75,7 anos no Norte e 75,9 no Nordeste, contra 76,4 anos no Brasil — e a mortalidade infantil permanece mais alta, com 15,9 óbitos por mil nascidos vivos no Norte e 13,8 no Nordeste, frente a 12,6 na média nacional, de acordo com dados do DATASUS. É nesse cenário de vulnerabilidade que o SUS se torna ainda mais essencial, pois fortalecer a atenção primária faz toda a diferença na vida de milhões de brasileiros.

O SUS é um marco de cidadania, um sistema público, gratuito e universal, reconhecido internacionalmente por sua estratégia de atenção primária, por resultados expressivos na redução da mortalidade materna e infantil, além do controle de doenças crônicas. O sistema garante o direito à saúde de forma igualitária, sem discriminação de classe, gênero, raça ou condição econômica, e reafirma diariamente seu papel como uma política pública de sucesso.

Inovar é necessário para um sistema como o SUS. É pensando justamente nessa inovação que o programa Juntos pela Saúde, iniciativa do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) gerida pelo IDIS (Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social), foi criado. Uma parceria entre poder público e investidores sociais privados, ou seja, empresas e fundações, investiu em iniciativas inovadoras executadas por organizações do terceiro setor. Até 2024, beneficiou indiretamente cerca de 4 milhões de pessoas no Norte e Nordeste, capacitou mais de 10 mil profissionais de saúde, mobilizou 1.345 unidades de saúde ou Caps (Centro de Atenção Psicossocial), entregou mais de 4.300 equipamentos tecnológicos e impactou 139 municípios. Até 2026, serão mais de R$ 100 milhões direcionados a projetos em mais de dois mil municípios das duas regiões.

Ao conectar recursos, conhecimento e tecnologia, iniciativas como o Juntos pela Saúde fortalecem a rede de saúde pública local, aceleram a resolutividade da atenção primária e contribuem para reduzir desigualdades históricas.

Os 35 anos do SUS são motivo de celebração e, também, de responsabilidade. Para sustentar e ampliar esses resultados, sobretudo nas regiões mais vulneráveis, é indispensável consolidar políticas que fortaleçam a base do sistema. E neste processo precisamos contar com o apoio de vários atores nessa jornada.

O caminho passa pela colaboração entre governo, sociedade civil e setor privado. Quando unimos forças, o impacto é ampliado, mais vidas são preservadas, trajetórias mudam e o direito à saúde se torna mais concreto. Que o SUS continue a nos inspirar a investir, inovar e acolher, com coragem e responsabilidade, a saúde como um bem comum, inalienável e de todos.

 

Esperançar em tempos de mudanças climáticas

Por Daniel Barretti, gerente de projetos no IDIS

No dia 1º de outubro, a primeira plenária da 14ª edição do Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais teve como temática “Esperanças em tempo de mudanças climáticas”. O ponto de partida, apresentado por Malu Nunes, diretora executiva da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, foi o de que a crise climática não é um risco futuro, mas sim uma realidade que já impacta comunidades em todo o mundo.

 

Veja a sessão completa em:

 

 

Alice Amorim, diretora do programa da diretoria executiva da presidência da COP30, delineia o contexto atual como o de um “multilateralismo governamental sistematicamente confrontado”, ao passo em que vivenciamos uma crise climática que não reconhece fronteiras e que nos exige um senso de urgência. A filantropia já cumpre um importante papel no que tange as mudanças climáticas, mas tem potencial de ir além. A problemática socioambiental é transversal e a filantropia deve incorporar a questão climática como parte de sua estratégia de atuação nos mais diferentes setores tais como educação, saúde etc.

“Todo mundo que financia educação precisa pensar como a educação, seja em sua estratégia programática seja em sua estratégia mais macro, está relacionada com a mudança do clima. Tem a ver com o tipo de currículo? Tem a ver com a forma como as escolas estão adaptadas as ondas de calor?”, comentou Alice.

 

Alice complementa ainda dizendo que a filantropia, por sua capacidade de flexibilização e adaptabilidade, pode desempenhar importante papel em atuações emergenciais e inovadoras, além do fortalecimento de agenda voltada para a redução de gases de efeito estufa (GEE).

Arriscaríamos a subverter o senso comum e dizer que a crise da qual tratamos não é essencialmente climática? A provocação vem do fato de pensar que a crise é da humanidade. Nós somos a causa e nós buscamos a solução. Entretanto, Viviana Santiago, diretora executiva da Oxfam Brasil, nos lembra de que os papeis, responsabilidades e consequências não são os mesmos.

“Quando a gente pensa naquelas pessoas no Rio Grande do Sul que perderam suas casas, equipamentos de trabalho, memórias […] e quando a gente lembra do chamamento que as autoridades fizeram num primeiro momento e diziam assim – vão para as suas casas de praia no litoral! Aquelas pessoas que estavam vivendo o mesmo externo climático, não o estavam vivendo da mesma forma”, exemplifica Viviana

 

Em suma, aqueles que historicamente se encontram em situação de maior vulnerabilidade socioeconômica são os que menos possuem responsabilidade e os que mais sofrem as consequências da agudização das crises contemporâneas. Esse contexto é o que enseja o conceito de injustiça ambiental:

mecanismo pelo qual sociedades desiguais, do ponto de vista econômico e social, destinam a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento às populações e baixa renda, aos grupos raciais discriminados, aos povos étnicos tradicionais, as periferias urbanas, às populações marginalizadas e vulneráveis (MANIFESTO…, 2001).

Viviana fecha com a reflexão de que a filantropia possui um papel muito maior do que o financiamento de projetos. Por seu poder de fala e atuação política, a filantropia deve ser mais vocal e protagonista na transformação de que necessitamos.

Patricia McIlreavy, presidente e CEO do Center for Disaster Philathropy, encerra a mesa sob uma perspectiva que amarra e corrobora as falas precedentes, uma vez que coloca o ser humano na práxis da ideia de crise climática, quando diz que “o desastre é a vulnerabilidade ao evento e não o evento em si”.

Por fim, Patricia desdobra alguns pontos fundamentais e pragmáticos de atuação possível pela filantropia, dentre os quais: ouvir e atuar de maneira colaborativa com as comunidades; atuar em rede intersetorial; atuar de maneira preventiva aos desastres socioambientais; investir em adaptação a nova conjuntura climática; investir em ações e experiências que já existem.

 

Fotos: André Porto e Caio Graça/IDIS.


Empresas semeando transformações

Por Gabriel Bianco, gerente de projetos ESG no IDIS

Diante de crises recorrentes e desigualdades persistentes, o setor empresarial e seus veículos filantrópicos são cada vez mais convocados a atuar com intencionalidade, estratégia e compromisso de longo prazo. Enraizadas em territórios e com capilaridade para atuar em frentes diversas, iniciativas empresariais têm mostrado como é possível semear transformações e levar esperança a grupos vulnerabilizados.

Nesse contexto, realizou-se o painel “Empresas Semeando Transformações” durante o Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais de 2025. O debate abordou diferentes estratégias e formatos pelos quais fundações e institutos geram impacto socioambiental positivo, contando com a participação de Fátima Lima, diretora de Sustentabilidade da MAPFRE no Brasil e representante legal da Fundación MAPFRE no Brasil; Murilo Nogueira, diretor administrativo-financeiro da Fundação Bradesco; Keyla Rodrigues, gerente de sustentabilidade da Fundação Sicredi; e mediação de Helen Pedroso, diretora de responsabilidade corporativa e direitos humanos do Grupo L’Oréal no Brasil.

 

Veja a sessão completa em:

 

Helen abriu o debate mencionando a potência de empresas que “movimentam, articulam e usam sua influência” para ajustar estratégias de negócio a uma visão mais inclusiva, sendo o investimento social privado um importante vetor para construir legado, esperança e ações concretas.

Para atingir resultados consistentes, Fátima Lima destacou que a Fundación MAPFRE se posiciona com compromissos de longo prazo com a sociedade, sustentados por um modelo de governança societária que assegura o repasse de parte do resultado operacional para ações socioambientais em temas estruturantes como educação e saúde. Ao mesmo tempo, Fátima ressaltou a importância de equilibrar projetos estratégicos com respostas a necessidades imediatas, como em crises humanitárias.

“Na crise do Rio Grande do Sul foram mobilizados quase R$ 2 milhões, 250 voluntários e 500 horas de trabalho, alcançando mais de 60 mil pessoas. Quando a ação social permeia a cultura, cresce o pertencimento e a felicidade do colaborador”, reforçou Fátima, ao explicar como o voluntariado corporativo retroalimenta a própria estratégia.

 

Na sequência, Murilo Nogueira ressaltou a centralidade de uma governança bem definida e de previsibilidade orçamentária, fatores que podem ser alcançados por meio de fundos patrimoniais. No caso da Fundação Bradesco, os recursos filantrópicos têm origem na doação de ações feita por Amador Aguiar, fundador do banco, que sonhava com a implementação de escolas do ensino infantil ao ensino médio; hoje, a Fundação atende mais de 42 mil estudantes em todo território nacional.

Para Murilo, o “esperançar” acontece quando a escola devolve o direito de sonhar: “O aluno entra conosco; muitos chegam sem a possibilidade de sonhar, sem a possibilidade de esperançar. A nossa função é educar e devolver o direito de sonhar.” A política educacional da organização também se dá na continuidade da evolução dos alunos, incluindo o EJA (Educação de Jovens e Adultos), qualificação das famílias e cursos técnicos alinhados às vocações locais — um arranjo que reduz indicadores negativos nas comunidades e fortalece o pertencimento entre colaboradores do banco. Por fim, Murilo destacou a implementação de escolas próprias, que amplia o controle pedagógico, o engajamento e a retenção de equipes, resultando em impacto social mais duradouro.

No terceiro bloco, Keyla Rodrigues apresentou o cooperativismo como infraestrutura social. A Fundação Sicredi integra um sistema com mais de 100 cooperativas e nove milhões de associados, “donos do negócio”, que deliberam sobre prioridades e investimentos comunitários. Desse arranjo emergem programas sistêmicos de longa duração — como o União Faz a Vida, há 30 anos promovendo cooperação, cidadania e protagonismo infantil — e soluções locais definidas em cada território. A combinação entre escala e territorialidade se materializa no Fundo Social, mecanismo pelo qual as cooperativas selecionam e financiam projetos do terceiro setor em suas regiões. Somente no último ano, foram mais de R$ 75 milhões; somado o portfólio do sistema, “investe-se mais de um milhão por dia” em iniciativas de impacto socioambiental.

“Nosso meio é financeiro, mas nosso fim é social. Toda cooperativa nasce para resolver um problema da comunidade”, sintetizou Keyla.

 

O painel encerrou com uma reflexão proposta por Helen, sobre o que é “esperançar” para os palestrantes. Para Murilo, trata-se de “fazer melhor e mais” diante dos desafios atuais, fortalecendo o ciclo virtuoso em que impactados voltam a impactar suas comunidades. Keyla associou esperançar a “plantar sementes de cidadania” — hoje presentes em mais de cinco mil escolas do União Faz a Vida — e acompanhar seu desenvolvimento. Fátima traduziu em atitude concreta: empoderar crianças e jovens pela educação e ver agentes comunitários surgirem dessa jornada. A mediação arrematou com um recado ao setor privado: respeitar limites planetários e transformar cadeias de valor exigem mudar o negócio e mudar processos, sem perder a dimensão territorial e humana do impacto.

A mensagem final foi clara: investimentos sociais estruturados por governança reduzem a dependência de ciclos econômicos e mantêm o foco de longo prazo; escala com territorialidade evita soluções genéricas e amplia legitimidade; cultura e engajamento, do reconhecimento ao voluntariado, criam pertencimento e novas lideranças; e indicadores simples e partilhados tornam o impacto material para quem decide e para quem é beneficiado. Em comum, Fundación MAPFRE, Fundação Bradesco e Fundação Sicredi mostraram que reduzir desigualdades requer olhar para o negócio e intencionalidade de impacto socioambiental.

Fotos: André Porto e Caio Graça/IDIS.


Reverberando impactos: a geração de valor na cadeia filantrópica

Por Yasmim Lopes, analista de projetos ESG

No contexto da Pandemia de COVID-19 um potencial foi revelado: além dos recursos financeiros, empresas podem colocar seus ativos em favor da filantropia, disponibilizando redes, recursos e capacidades em prol da solução de problemas socioambientais. O mesmo pôde ser visto no desastre climático do Rio Grande do Sul em 2024 e nas recorrentes queimadas na Amazônia.

O processo de envolvimento de diversas partes interessadas no investimento social, onde mais de um ente se mobiliza para financiar, mobilizar recursos, implementar e monitorar uma causa é chamado de cadeia filantrópica e gera valor não só para a sociedade, mas também para as empresas envolvidas.

Após as experiências desenvolvidas através da colaboração em ações emergenciais, o desafio passa a ser a estratégia continua. Como sair do modo “resposta à crise” e consolidar políticas consistentes de investimento social, capazes de sustentar mudanças estruturais nos territórios? Foi com essa provocação que a moderadora Thaís Nascimento, Coordenadora de Programas no GIFE, abriu o painel “Reverberando impactos: a geração de valor na cadeia filantrópica” durante o Fórum Brasileiro de Investidores e Filantropos Sociais 2025.

 

Veja a sessão completa em:

 

Olhar para uma causa e para o seu contexto é essencial. Aron Zylberman, diretor executivo do Instituto Cyrela, contou como a filantropia se tornou um princípio organizador da atuação social da companhia. Bebendo da fonte do “valor compartilhado”, o Instituto Cyrela atua com projetos que entregam impacto social e fazem sentido para o negócio. Na prática, isso significou olhar os bairros onde a Cyrela constrói e investir em infraestrutura educacional pública (escolas, creches, espaços de aprendizagem) em um raio próximo aos empreendimentos, sobretudo os da marca de habitação popular. Ao conectar investimento social e estratégia de negócio, a empresa também fortalece reputação e licença para operar.

“Nós ficamos pensando que o nosso tema principal é educação, que já tem muita gente muito competente, vários institutos e fundações atuando. Para que fazer a mesma coisa? O que que o pessoal não faz? O pessoal não transforma os equipamentos de educação. O ambiente físico é fundamental para o processo pedagógico, é importante ter uma sala bem iluminada, com bom ambiente, com ar- condicionado, com recursos digitais disponíveis. E aí entrou o papel do Instituto Cyrela, construir a infraestrutura” , comentou Aron.

 

Apostando também na transformação sistêmica, o Instituto Natura atua em três frentes: educação, com forte componente de política pública; direitos e saúde das mulheres; e desenvolvimento integral das consultoras de beleza. David Saad, diretor presidente do Instituto, reforçou que escala e consistência vêm de uma tese clara de transformação.

A conexão com o negócio se expressa com reputação, força de marca, engajamento de colaboradores e, sobretudo, prosperidade das consultoras, que inclusive financiam o instituto e têm um “IDH das consultoras” para orientar ações formativas que impactam seu bem-estar e renda.

“Por exemplo, no cuidado com a saúde com as mamas. Então, se a gente fizesse a pergunta que estávamos acostumados a fazer, que é ‘como eu posso ajudar?’, eu ia fazer uma campanha, ia fazer um projeto e ia fazer lá as minhas iniciativas. Como a pergunta que a gente fez foi diferente, que é ‘como a gente pode mudar o patamar da detecção precoce de câncer de mama no Brasil e, portanto, reduzir as mortes?’ , a gente teve que fazer uma estratégia muito diferente, cheia de colaboração, desenvolver com poder público, com outras organizações, e auxiliar outras organizações a trabalhar nesse tema”, explicou David.

Saad ainda aponta um desafio: Como gerar impacto social e para o negócio equilibrando o curto e o longo prazo? Segundo Saad, se o pêndulo ficar só no curto, captura-se valor comunicável e rápido, mas sem transformação social; se pender só ao longo prazo, o Instituto perde lastro com o negócio. O caminho é calibrar ambições, cultivar um interesse genuíno da liderança e trabalhar com metas e dados, mas preservando espaço para ousadia.

E é na colaboração que a ousadia pode residir. Alejandro Álvarez von Gustedt, vice presidente da Rockefeller Philanthropy Advisors Europa, destaca que a inovação floresce em ecossistemas: quando atores compartilham conhecimento e constroem soluções coletivas, o efeito é “mágico”. A colaboração, porém, esbarra em dois desafios recorrentes: a busca por atribuição (o desejo de dizer “aconteceu graças a nós”) e a ansiedade por métricas de retorno imediato. Se a ambição é transformação social, olhar de longo prazo e atuar via parcerias, em linha com o ODS 17, é inevitável.

 

“Nesses momentos de incerteza, de dificuldades, o papel dos investidores sociais e corporações não mudou. Talvez o ambiente tenha mudado um pouco, mas basicamente o que a gente precisa fazer para alcançar esse impacto ao apoiar comunidades é basicamente o mesmo: o caminho é engajamento, parcerias. Mas, nas comunidades principalmente, a gente precisa ouvir, trabalhar com os outros, criar essas parcerias. É assim que a gente consegue maximizar o retorno social dos investimentos por cada dólar ou real que você estiver investindo”, apontou Alejandro.

Ao final, um consenso atravessa as falas: gerar valor na cadeia filantrópica não é “apoiar projetos”; é alinhar estratégia social e estratégia de negócio, atuar onde a empresa tem capilaridade e responsabilidade (os territórios), colaborar com quem está na ponta e medir o que importa sem sufocar a ambição transformadora. É também reconhecer que reputação, engajamento e licença para operar são consequências quando a empresa investe socialmente de maneira estratégica.

Fotos: André Porto e Caio Graça/IDIS.


Cultivando futuros: filantropia familiar ganha força como motor de transformação no Brasil

Por Weslley Carvalho, estagiário do programa Juntos Pela Saúde

No Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais 2025, realizado em 1º de outubro pelo IDIS, uma das conversas do dia reuniu lideranças do setor para refletir sobre os caminhos da filantropia familiar no país. A mesa Cultivando futuros: caminhos para a filantropia familiar no Brasil” destacou o papel estratégico dessas iniciativas no enfrentamento de desafios complexos e na construção de uma sociedade sustentável.

Realizada em um momento em que o cenário global combina retração de recursos internacionais e aumento da complexidade dos problemas sociais e ambientais, a sessão convidou o público a repensar como famílias e indivíduos de alto patrimônio podem atuar de maneira mais estruturada, colaborativa e de longo prazo. A partir das reflexões do estudo Caminhos para uma atuação mais ampla e estratégica da filantropia familiar no Brasil, desenvolvido pelo IDIS, os participantes compartilharam experiências, perspectivas e desafios que apontam para uma transformação em curso no campo filantrópico brasileiro.

 

Veja a sessão completa em:

 

Carola Matarazzo, diretora executiva do Movimento Bem Maior e presidente do Conselho de Governança do GIFE, abriu a conversa trazendo um olhar sobre a evolução histórica da filantropia familiar no país e os aprendizados acumulados ao longo dos anos. Destacou a importância da governança familiar como eixo estruturante e ressaltou como diferentes gerações têm contribuído para moldar novas formas de atuação, muitas vezes guiadas pela ideia de transformar herança em legado.

Para ela, “a filantropia familiar é muito mais do que um instrumento de doação: é um espaço de convergência, onde diferentes gerações podem se encontrar em um propósito comum, transformando patrimônio em legado.”

“Mais do que escolher causas, a filantropia familiar é um exercício de alinhamento de valores que podemos ofertar ao mundo; é esse fio condutor que garante coerência entre gerações e permite transformar heranças em futuro”, destacou também Carola.

Falou ainda sobre a necessidade de adaptação constante: o mapa de prioridades das famílias é dinâmico e reflete valores e crenças que se transformam com o tempo. Nesse cenário, ganham espaço pautas contemporâneas, como a agenda climática, a redução das desigualdades sociais, a valorização da diversidade territorial e o letramento acerca dos marcadores sociais da diferença. Segundo ela, há uma mudança de mentalidade em curso, que desloca a filantropia de um lugar mais individual para um movimento coletivo, com maior articulação entre institutos, fundações e diferentes atores da sociedade civil. “Precisamos, sobretudo, mobilizar distintos capitais: o financeiro é importante, mas insuficiente. O capital humano, social, político e reputacional também deve ser colocado em movimento para destravar soluções novas e de longo prazo, tanto no setor privado quanto no público.

 

Em sua fala, Marina Cançado, fundadora da Converge Capital e cofundadora da plataforma ATO, deu continuidade ao debate abordando o papel dos múltiplos capitais no enfrentamento de temas complexos, com destaque para a crise climática. Ressaltou que a estabilidade climática deixou de ser apenas uma pauta ambiental e se tornou um plano de fundo inevitável para qualquer estratégia de filantropia com visão de futuro. Segundo Marina, “quando pensamos na próxima etapa da filantropia familiar, não há como dissociar o pano de fundo que vivemos: as mudanças climáticas. Elas não são uma causa, mas o contexto que precisa estar por trás de todo o pensamento sobre filantropia e das soluções que queremos construir”. Marina destacou também que pensar a filantropia em um mundo de aquecimento global significa adotar uma perspectiva integrada, capaz de conectar diferentes esferas de atuação e engajar novas gerações na busca por soluções de longo prazo.

Encerrando o debate, Fernando Nogueira, diretor executivo da ABCR, trouxe a perspectiva dos profissionais de captação de recursos e dados recentes sobre o cenário da filantropia no Brasil. Abordou tendências identificadas em pesquisas nacionais e internacionais, destacando que o interesse pela doação muitas vezes nasce de vínculos de proximidade, o que reforça a importância de fortalecer relações de confiança entre doadores e organizações sociais.

“O investimento social privado é, ao mesmo tempo, o mais importante e o menos importante dos capitais filantrópicos. É o menos importante porque é um dos menores: pessoas físicas, fazendo pequenas doações, doam muito mais do que os grandes filantropos, e o governo e as microempresas repassam muito mais recursos. Mas ele pode ser o mais importante porque tem o maior potencial de ser estratégico, refletido e de provocar intervenções cirúrgicas e de alto impacto no campo”, comentou ele.

 

 

Ficou evidente que o fortalecimento desse campo depende da articulação entre diferentes atores, incluindo famílias e organizações da sociedade civil, e de uma disposição coletiva para inovar, aprender e agir em rede. Mais do que recursos financeiros, trata-se de cultivar confiança, visão compartilhada e compromisso com causas estruturantes, capazes de gerar transformações duradouras. Em um mundo marcado por incertezas, as reflexões compartilhadas na mesa mostraram que a filantropia familiar tem um papel central na construção de futuros cheios de possibilidades.

 

Fotos: André Porto/IDIS.


Em conversa com Tania Haddad Nobre

Por Yone Araujo Moreno, coordenadora no programa Juntos Pela Saúde

O Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais de 2025 foi um evento estruturado em torno do verbo “esperançar” – não como um gesto de passividade, mas como um chamado à ação coletiva e transformadora.

Em uma das mesas do evento, a tradicionalmente intitulada “Em conversa com”, tive a oportunidade de participar de uma troca íntima e profundamente reflexiva sobre a trajetória de Tania Haddad Nobre na filantropia. Tania compartilhou, com muita transparência, como sua atuação nesse campo é marcada pela dedicação de tempo, recursos e trabalho, e, sobretudo, por um compromisso genuíno com o coletivo.

 

Veja a sessão completa em:

 

Ela trouxe à tona a filantropia como prática cotidiana, construída com escuta e responsabilidade. Contou que esse tema atravessa até mesmo os encontros familiares, já que a Fundação Insper — organização educacional sem fins lucrativos da qual sua família é uma das mantenedoras — faz parte do cotidiano de todos. A fundação concede bolsas parciais e integrais, e é, para Tania, um símbolo vivo do que significa doar com propósito.

Um dos momentos mais marcantes da conversa foi quando Tania o termo “loteria do nascimento” para refletir sobre seus privilégios. Ela destacou que sua atuação é guiada por um pensamento “sem culpa”, reconhecendo as oportunidades que teve, sem se paralisar por elas, mas também sem se valer delas de forma acrítica. Seu esforço em transmitir o valor da doação às futuras gerações, especialmente aos filhos, ficou evidente para todos que estavam presentes.

Tania compartilhou que, mesmo antes de compreender o conceito de filantropia, já praticava o ato de doar. Sua atuação no Insper foi decisiva para consolidar essa visão. Entre suas causas pessoais, destacou as questões de gênero, especialmente no contexto da liderança feminina. Como mulher à frente do conselho deliberativo do Insper, ela reforçou a importância de ampliar os espaços de decisão ocupados por mulheres, que é também uma pauta atual.

Outro ponto alto da conversa foi quando Tania falou sobre a importância de ouvir antes de agir. Ela relatou uma experiência marcante: uma aluna bolsista do Insper foi flagrada dormindo clandestinamente na biblioteca. Embora tivesse recebido a bolsa, não dispunha da infraestrutura necessária para permanecer estudando, e essa experiência revelou uma realidade: faltavam recursos para alimentação, transporte e permanência nas imediações da instituição. Esse episódio foi um divisor de águas para Tania, que aprendeu, na prática, que escutar é essencial e que a filantropia precisa estar estruturada em ações holísticas e sistêmicas.

Ao final da conversa, Tania reforça que é preciso agir coletivamente, e que tão importante quanto esperançar, é desistir de desistir.

Fotos: André Porto e Caio Graça/IDIS.


Monitoramento da base para o topo: construindo pontes entre sociedade civil, financiadores e políticas públicas

Por Stephany de Lucena Costa, estagiária de projetos no IDIS

Afinal, como é possível construir pontes dentro do processo de monitoramento de projetos? Essa foi a pergunta que Ana Fontes, fundadora da Rede Mulher Empreendedora (RME) e do Instituto RME; Jessie Krafft, CEO da CAF America; Letícia Born, diretora associada da Co-Impact para a América Latina e no âmbito global; e o moderador Wesley Matheus, secretário de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas e Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento e Orçamento, buscaram responder em uma das plenárias do Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais 2025.

 

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O monitoramento e a avaliação aparecem não apenas como instrumentos burocráticos ou de controle orçamentário, mas, sobretudo, como ferramentas de cuidado, acompanhamento e aprendizado. Para isso, é fundamental que o fluxo avaliativo abandone a lógica top-down, isto é, de imposição de financiadores e tecnocratas, e seja reconstruído em uma perspectiva bottom-up. Isso significa que os saberes e desejos do público-alvo, bem como da sociedade civil, precisam ser considerados em todo o processo. Como destacou Ana Fontes, a inclusão dos beneficiários, com indicadores “menos duros” e mais próximos da realidade vivida, colabora para gerar impacto e consolidar ciclos de prosperidade.

Também se evidencia a necessidade de construir pontes entre financiadores e executores. Letícia Born chamou a atenção para o risco de comprometer investimentos quando se olha apenas para a “falta” de resultados imediatos. Como afirmou a própria Letícia:

“A gente precisa entender que transformação sistêmica leva tempo, e que se a gente ficar olhando só para o que não aparece no curto prazo, corre o risco de comprometer o investimento. Às vezes, o impacto está sendo construído, mas não é imediatamente visível. E aí entra a importância da confiança entre quem financia e quem executa”.

Em contraste com a ideia da “avaliação monstro”, proposta por Karen Mokate no artigo Convirtiendo el “monstruo” en aliado: la evaluación como herramienta de la gerencia social (2002), que define avaliações pautadas pelo controle e pelo teor de auditoria, a construção de relações mais harmônicas entre as partes fortalece os projetos. Isso passa pela criação de elos de confiança que permitam ajustes ao longo da execução, tornando o monitoramento um processo dinâmico de aprendizado e não apenas de fiscalização.

CONSTRUINDO A AGENDA PÚBLICA: O PAPEL DAS OSCS

Importa destacar ainda que os fluxos de monitoramento e avaliação não devem ser observados apenas no terceiro setor, mas também no primeiro – o Estado –, já que as organizações sociais têm papel fundamental na formulação de políticas em rede. Entendidas como políticas públicas construídas por meio da articulação entre Estado, sociedade civil e outros atores, elas ganham densidade quando as organizações atuam como policy entrepreneurs. Ou seja, como empreendedores de políticas que mobilizam capacidade técnica, redes de influência e legitimidade social para introduzir temas na agenda pública e incidir diretamente sobre decisões governamentais.

Como lembrou Jessie Krafft, tais organizações “preenchem buracos vazios”. Em suas palavras, “bom, o que nós estamos buscando agora é ver como diferentes organizações e doadores podem nos ajudar a preencher algumas dessas lacunas, mas também dado o fato de que o USAID […] basicamente desapareceu”. Ana Fontes complementou, mostrando como as pesquisas anuais sobre empreendedorismo feminino, realizadas pelo Instituto RME, já serviram de base para políticas de crédito e gênero. Assim, monitoramento e avaliação, quando bem estruturados, deixam de ser meros relatórios e se tornam alavancas de transformação pública.

Esse debate se amplia ainda mais quando observado sob a lente internacional. Krafft ressaltou os cortes recentes da USAID e a redução de financiamentos internacionais, somada a crises políticas e conflitos em diversas regiões, que criam um ambiente de incerteza para o terceiro setor. Ao mesmo tempo, cresce o movimento de doações individuais e locais, revelando novas possibilidades de sustentabilidade. Nesse cenário, a tensão entre financiamento restrito e irrestrito mostra-se decisiva: quanto maior a flexibilidade, maior a capacidade de resposta das organizações diante de crises e maior também o potencial de promover transformações sistêmicas de longo prazo.

Diante desse panorama, torna-se evidente que a construção de pontes por meio do monitoramento é não apenas viável, mas necessária, e que é possível “esperançar”, mesmo em tempos de incertezas político-sociais. Para isso, é imprescindível compreender que a criação de pontes não deve se restringir apenas a grandes organizações, financiadores ou ao poder público, mas envolver toda a sociedade civil. Nesse contexto, o monitoramento bottom-up mostra-se essencial para gerar informações valiosas, que devem retornar às comunidades beneficiárias e a todos os envolvidos em cada projeto, fortalecendo o empoderamento local. Essa forma de monitoramento só se sustenta quando há valorização dos saberes e atores locais, reconhecendo que o compartilhamento de informações, especialmente em contextos desiguais, é também uma poderosa estratégia de fortalecimento comunitário.

Por fim, como lembraram os palestrantes em suas falas finais, “esperançar” também significa aceitar riscos e cultivar confiança. Isso exige a construção de uma cultura filantrópica colaborativa, que valorize aprendizado, diálogo e corresponsabilidade, em vez do medo de não alcançar metas imediatas. Assim, monitoramento e avaliação deixam de ser meros mecanismos de cobrança para se converterem em verdadeiras pontes de transformação, tanto para as organizações sociais quanto para a sociedade em seu conjunto.

Fotos: André Porto e Caio Graça/IDIS.


Esperançar: o verbo que se conjuga em comunidade

Por Carla Irrazabal, analista no programa Transformando Territórios

O Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais 2025 nos convidou a conjugar o verbo esperançar. A conversa Territórios e Comunidades: Sonhar e Transformar’ propôs um exercício gramatical sobre esse verbo, em que ele seria conjugado pensando nos sujeitos, nas ações e nas implicações de cada tempo verbal.

 

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Para deixar todos em linha, esperançar, como bem lembrou Tião Rocha nessa conversa, vem de Paulo Freire e é um verbo de ação. Essa perspectiva transforma a espera, usualmente associada à passividade, em algo em movimento.

Iniciando o exercício gramatical, podemos pensar que o território é o sujeito do verbo esperançar. São as comunidades que têm as respostas e as ações para se manter firmes e se reconstruírem nos momentos de necessidade. Assim, a ação esperançar é feita pelos territórios.

Gleice Santana, coordenadora de cidadania e sustentabilidade no centro cooperativo do Sicoob, explicou que o modelo de cooperativas são uma prova disso. Esses grupos se formam a partir de necessidades e demandas territoriais e trazem respostas invertendo a lógica de clientes para associados. Essa ideia de colaboração é tão forte que está presente em um dos princípios cooperativos. O 7º princípio é justamente o interesse pela comunidade, que estabelece que as cooperativas trabalham pelo desenvolvimento sustentável das comunidades às quais estão inseridas.

Seguindo na caracterização do sujeito do verbo esperançar, Domênica Falcão, da Fundação Grupo Volkswagen, traz a experiência do trabalho da organização, que tem sido focado diretamente no território e na escuta ativa das comunidades. Domênica trouxe a perspectiva de quebrar a lógica de “comunidade do entorno” – as fábricas fazem parte das comunidades e estão inseridas nos territórios. Podemos pensar, assim, que o território é um ecossistema que envolve múltiplos atores. O sujeito desse verbo é plural.

Agora, com o sujeito bem caracterizado por essa pluralidade comunitária que representa um território, seguimos para a conjugação desse verbo, colocada logo no início da fala de Tião – presente do indicativo. “Nós esperançamos”. O presente do indicativo é usado para falar de uma ação que ocorre no momento da fala e que é algo habitual. Reforçando a ideia de que o esperançar é presente, mas também se estende para o futuro do tempo verbal, é um ato contínuo.

E é justamente nesse “nós” que Tião aprofunda o sentido do verbo. Ele lembrou de um provérbio ouvido em Moçambique: “É preciso uma aldeia inteira para educar uma criança”. Essa imagem amplia a ideia do sujeito coletivo e nos devolve à noção de que educar e transformar são gestos que só existem em coletivo. Ele também nos convidou a olhar para a utopia não como um ponto inalcançável, mas como farol, algo que orienta, inspira e nos mantém em movimento. Ao revisitar o passado, recordou o tempo em que muitos projetos sociais buscavam respostas fora dos territórios, tentando impor modos de vida “corretos”. Esperançar, então, é também ter a humildade de aprender com o território, de reconhecer que é dele que nascem as causas e as verdadeiras possibilidades de transformação.

Selma Moreira, que moderou a conversa, costurou esse conjunto de ideias com uma provocação necessária: a de que quem “tem a caneta” precisa parar para escutar. Escutar de verdade, sem hierarquizar saberes, sem colocar o conhecimento técnico acima da experiência vivida. Porque há sabedoria nas práticas cotidianas e força nas vozes que nem sempre são ouvidas. Escutar, nesse sentido, é também um verbo de ação e que deve andar junto com o verbo desse exercício gramatical, o esperançar.

Concluindo o exercício, o verbo esperançar se revela como um chamado à prática compartilhada, feita no presente e sustentada pela coletividade. Ele nos lembra que esperançar não é espera, é movimento. É o gesto de construir junto, de aprender, de se responsabilizar. Quando dizemos “nós esperançamos”, afirmamos que o futuro não se inventa sozinho e nem de fora para dentro. Ele já se inicia no presente e se tece entre pessoas, territórios e vínculos que se reconhecem como parte de um mesmo caminho. Nesse percurso, a filantropia e o investimento social privado têm um papel essencial: o de reconhecer e fortalecer as potências que já existem nos territórios, atuando não como protagonistas, mas como parceiros do esperançar coletivo, somando forças para que o esperançar siga sendo um verbo no presente do indicativo no plural.

Fotos: André Porto e Caio Graça/IDIS.


Aplicando a tecnologia de forma humana: como a inteligência artificial pode potencializar a mudança social e nos relembrar sua importância

Por Beatriz Barcellos, estagiária de projetos no IDIS

“Prometeu roubou o fogo do Olimpo e entregou aos homens. O fogo representa o progresso, a tecnologia (…) essa traz as suas próprias contradições: ao mesmo tempo é uma dádiva, mas também uma responsabilidade, um perigo. Nos faz refletir se estamos a utilizar da melhor maneira. Como podemos manejar essa contradição da tecnologia, para que possamos pensar na utopia e não na distopia?”. Foi com esse questionamento que Pedro Rossi, vice-presidente na The Global Fund for a New Economy, inaugurou a mediação do painel “Inovações e tecnologia: da distopia à utopia”, ocorrido na 14ª edição do Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais.

A dicotomia entre esses dois conceitos – ou talvez entre um conceito (utopia) e sua contradição (distopia) – serve como base fértil para discutir como a tecnologia, mais especificamente a inteligência artificial, nos faz ‘esperançar’, tema transversal desta edição do evento. Esse verbo nos encoraja não somente a manter nossas esperanças em tempos desafiadores, mas também a agir de forma estratégica, pedra angular para uma filantropia efetiva. Os palestrantes João Abreu, diretor executivo da ImpulsoGov, Camila Valverde, diretora executiva da Fundação ArcelorMittal, e Eduardo Saron, presidente da Fundação Itaú, nos ajudaram a dar concretude ao potencial dessas novas tecnologias para as áreas de saúde, educação e para a filantropia corporativa em si.

 

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POTENCIALIDADES DE NOVAS TECNOLOGIAS

João Abreu abre a conversa demonstrando como essas inovações podem potencializar a base de dados do SUS (Sistema Único de Saúde), que, contemplando mais de 170 milhões de indivíduos em sua atenção primária, se consagra como a maior base de dados de saúde do mundo. A ImpulsoGov, aliada à iniciativa Juntos Pela Saúde, idealizada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e gerida pela equipe do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS), executa a ImpulsoPrevine, plataforma digital que otimiza a base de dados do SUS.

Por meio do desenvolvimento de um software, as equipes conseguem identificar, por exemplo, quais crianças de determinado bairro ainda não receberam as vacinas indicadas para sua faixa etária, quais gestantes estão com o pré-natal em atraso ou quais mulheres na idade recomendada ainda não realizaram o exame Papanicolau. Com isso, a ferramenta fortalece o monitoramento ativo da população e contribui diretamente para a melhoria do desempenho municipal em indicadores de saúde. A partir disso, está em desenvolvimento uma funcionalidade que permitirá disparar mensagens de WhatsApp para esses indivíduos ou seus responsáveis, de forma a incentivar que usem seu direito universal, informando de maneira clara e acessível os passos para o agendamento do serviço recomendado.

Abreu especula que, com a implementação da inteligência artificial, além de permitir maior escalabilidade ao projeto (que atualmente se concentra em municípios do Norte e Nordeste do país), seria possível alcançar uma customização ainda maior do atendimento para a população brasileira. Seguindo o exemplo da realização do exame Papanicolau, comenta:

“Já temos hoje os dados e a tecnologia para que não digamos apenas ‘todas as mulheres de 25 a 69 anos devem fazer o Papanicolau’. Poderíamos olhar para o prontuário de cada paciente com IA e dizer: ‘Não é bem assim, essa pessoa deve fazer a cada ano, já que tem condições que a literatura médica atual já sabe que aumentam o seu risco de câncer de colo de útero; essa outra paciente pode ter uma frequência menor, já que possui menos risco’ (…) Conseguimos, com isso, hiperpersonalizar o cuidado de uma maneira que a saúde seja, de fato, acessível e que o SUS possa atuar de forma preventiva. Isso já não pertence à futurologia, é totalmente factível.”

Camila Valverde trouxe a perspectiva de como a Fundação ArcelorMittal, vinculada à maior produtora de aço do Brasil e do mundo, aposta no ensino da tecnologia para jovens, de modo a construir uma educação de qualidade através da abordagem autoral Liga STEAM. Essa perspectiva educacional engloba, de forma interdisciplinar e coletiva, as seguintes áreas do conhecimento: Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática. Trata-se de uma “(…) abordagem integrada de solução de problemas usando as habilidades [dessas áreas de conhecimento] e que é levada pelo professor desde o ensino infantil até o colegial. Todos sabemos como a infância é importante; tem essa frase que gosto muito que diz que a infância é um chão que pisamos a vida inteira”, comenta Valverde.

Para a implementação dessa abordagem, a Fundação oferece uma série de projetos: desde a formação de professores e a implantação do Prêmio Nacional Liga STEAM, que reconhece projetos de solução de problemas locais pensados em sala de aula, até a preparação de jovens para o mercado de trabalho, projeto que começou a ser implementado no início de outubro. Este último engloba 300 jovens de cinco cidades brasileiras, com o intuito de formação específica para áreas do mercado de tecnologia e inteligência artificial. Além do letramento digital e cursos de programação e IA, o curso oferece guia emocional para entrada no mundo corporativo. Como aponta Valverde, o conhecimento dessas tecnologias não é mais um conhecimento essencial para o futuro: é uma habilidade essencial para o presente.

O QUE NOS RESTA

Embora estes sejam exemplos tangíveis do potencial positivo da inteligência artificial, Eduardo Saron trouxe um contraponto de atenção de que a IA já não pode ser colocada como uma mera ferramenta. Essa tecnologia não apenas nos auxilia na tomada de decisões, mas é capaz de tomar decisões por nós; ela “(…) muda as relações humanas, as dimensões culturais e a nossa memória social”.

Ao longo de suas falas, Saron constrói a opinião de que o maior trunfo dessa tecnologia é o potencial de ressignificar o que é ser humano e suas relações, estabelecendo-se como um pressuposto para revalorizar uma ética relacional, cooperativa, interdependente, pautada na corporeidade e que incentiva a fraternidade.

Ralf Dahrendorf, estimado sociólogo, argumenta que a utopia é composta por cinco aspectos essenciais: a inexistência de mudança; a inexistência de conflito; a natureza anômala do imprevisível; a previsibilidade da ação; e o isolamento espacial. Vista desse modo, é possível argumentar que as distopias constituem não uma antítese, mas sim outra interpretação do que seria uma sociedade utópica. A dicotomia criada entre esses dois termos, embora ilustrativa, revela-se mais frágil do que parece à primeira vista. Assim, a inteligência artificial, apesar de potente para a mudança social, talvez encontre valor imensurável ao demonstrar, em toda sua perfeição, constância e universalidade, que pouco há de humano na utopia. Como uma estrela norte, ela nos guia, mas há conforto em sua impossibilidade: erros serão inevitáveis e novos desafios se revelarão e, como colocado por Saron, a filantropia é primordial em potencializar esses aspectos que nos fazem (e nos farão cada vez mais) humanos.


Fotos: André Porto e Caio Graça/IDIS.


Interdependência e Resiliência: o esperançar é coletivo

por Rayén Souza, estagiária de projetos no IDIS

Sob diferentes olhares, vivências e gerações, a mesa “Interdependência e Resiliência: o esperançar é coletivo” encerrou o Fórum de Filantropos e Investidores Sociais 2025, trazendo os contornos dos possíveis caminhos para seguirmos coletivamente dentro e fora da filantropia.

 

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A filantropia, sobretudo no Brasil, vem passando por mudanças significativas, ainda que também esteja em um processo paulatino de amadurecimento do setor, do ambiente regulatório que o suporta e de seus atores (filantropos, organizações da sociedade civil, institutos e fundações familiares ou empresariais).

Nesse processo, Thuane Nascimento (Thux), diretora executiva no PerifaConnection, Cofundadora do Observatório das Baixadas e palestrante na mesa, reconhece o papel estratégico das periferias no amadurecimento e na qualificação da filantropia no Brasil, enquanto uma prática historicamente situada e socialmente implicada.

“Eu acredito que a filantropia enquanto instituição, está estabelecida pelo que nós consideramos como o centro, seja ele cultural, social, econômico, político ou financeiro (…). A periferia, como diz o nome, está construída nas margens, então, necessariamente, elas [a filantropia e a periferia] são coisas que nasceram e foram construídas afastadas”, comenta.

A ideia é de que a filantropia, enquanto instituição, atua a partir de dinâmicas em que estão estabelecidas centralidades e marginalidades, o que diz não só sobre sua posição, mas afeta de forma determinante sua ação e restringe o potencial de impacto social. A diretora executiva da PerifaConnection enxerga como caminho de aproximação entre a filantropia e as periferias o diálogo com os sujeitos, comunidades e territórios periféricos, traduzindo cada processo e compartilhando ferramentas para que os afastamentos de realidade não impossibilitem a manutenção e a perenidade das iniciativas desenvolvidas com as periferias. É preciso, como colocado pela própria Thux, evocando Frei Betto, que “a cabeça pense onde os pés pisam” e que, para isso, a filantropia esteja disposta a deixar sua posição central e diluir fronteiras com a ação em conjunto e a partilha de conhecimentos.

Em consonância com essa perspectiva, a valorização dos conhecimentos e proposições locais dá a pista para mais um dos caminhos que podem ser traçados no futuro filantrópico. Esse olhar, evocado por Felipe Bogotá, diretor executivo na TerritoriA e convidado palestrante da mesa, em primeiro lugar situa a filantropia brasileira na conjuntura regional latino-americana e, como um ponto adjacente, busca destacar a existência de soluções e oportunidades locais, desenvolvidas sem a dependência – por vezes pressuposta – dos atores internacionais.

Em tempos de conjuntura planetária tão delicados e incertos, o investimento em ecossistemas e infraestrutura da filantropia, bem como no fortalecimento de capacidades locais e comunitárias, soa como uma alternativa necessária e resiliente. Entretanto, é preciso ação coletiva, com a união de atores e conhecimentos para dar escala às soluções já existentes, pensando em soluções não somente para os territórios, mas idealizadas coletivamente com as comunidades.

Nesse sentido, as fundações comunitárias e territoriais que atuam na capacitação de OSCs e mobilização de parcerias, como o caso das Fundações e Institutos Comunitários (FICs), ou o Fundo de Regeneração da Colômbia – criado há um ano com o objetivo de regenerar o país em diferentes frentes (meio ambiente, economia, educação, entre outros) e ainda financiar diversas iniciativas no país – são exemplos importantes de soluções bem-sucedidas e criadas localmente.

A capacidade de mobilização e organização das comunidades fortalece a interdependência comunitária dos agentes locais e filantrópicos, ao mesmo tempo em que afasta a conjuntura internacional e suas demandas de soluções e iniciativas. A interdependência hoje possui ambiguidades declaradas, mas, sob a perspectiva da filantropia, possui recursos suficientes para pensarmos de maneira positiva.

Evocando o cenário global, Daniela Grelin, diretora executiva do Pacto Global Rede Brasil, retomou os avanços e as regressões nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), aferidos pelo último  , publicado em julho deste ano. A partir das perspectivas e desafios que se desenham, a palestrante destacou o lugar do Brasil no cumprimento do ODS 17 – Parcerias e Meios de Implementação e a necessidade manifesta de ação coletiva para o redirecionamento do planeta aos eixos da sobrevivência e, quem sabe, de um futuro do bem-viver democrático.

No âmbito da filantropia, é possível pensar nesse redirecionamento a partir do impulso de inovação filantrópico, ou seja, da maior licença de atuação colaborativa em relação aos demais setores. Ao mesmo tempo, essa ’permissão’ precisa ser pensada também sob a ótica do risco e da experimentação, processos comuns ao setor privado, mas ainda muito reticentes na filantropia.

As palavras-chave da mesa refletem as características centrais desta edição do Fórum de Filantropos e Investidores Sociais. Ideias como movimento, humildade, gentileza, cuidado, confiança e território são fundamentais para pensarmos o futuro filantrópico, mas talvez a mensagem seja, sobretudo, sobre nossos sonhos e teimosias. Em um mundo em que sonhar é difícil, as inquietudes e insatisfações são necessárias para a ação dentro e fora da filantropia. A mensagem das gerações novas é que os sonhos são possíveis, e daquelas que estão, digamos, há mais tempo por aqui, é que existe muito trabalho a ser feito. Em ambos os casos, a perspectiva final é de que tanto os sonhos quanto aquilo que ainda deve ser feito sejam realizados e buscados de maneira coletiva.

Fotos: André Porto e Caio Graça/IDIS.


Chamada pública para Capacitação Intensiva do Programa IA.3 – Inteligência Artificial para o Terceiro Setor

Para democratizar o acesso ao uso da inteligência artificial, oferecendo condições para que as organizações incorporem essa tecnologia de maneira consciente e estratégica, o IDIS divulga que está aberta a chamada pública, do dia 22 de outubro ao dia 17 de novembro, com inscrições prorrogadas até dia 23 de novembro, para uma formação gratuita e inédita que irá selecionar até 250 ONGs para participar de um ciclo com 30 horas, ao longo de 4 meses, combinando aulas online ao vivo, conteúdos assíncronos e atividades práticas. A formação busca aproximar a inteligência artificial da realidade das ONGs brasileiras, oferecendo ferramentas práticas para aumentar eficiência, produtividade e impacto.

Nessa Capacitação Intensiva podem se inscrever organizações do terceiro setor de todos os portes e causas, desde que sejam brasileiras, com CNPJ devidamente registrado no cadastro nacional de pessoas jurídicas e com infraestrutura mínima de acesso à internet. Além disso, é necessário que a organização possa participar da capacitação com ao menos três pessoas da equipe.

A iniciativa faz parte do programa IA.3 – Inteligência Artificial para o Terceiro Setor, projeto idealizado pelo IDIS com suporte do Google.org e apoio técnico do Canal SabIAr.

Clicando aqui, acesse o regulamento da chamada e saiba como participar.

 

O IA. 3 – Inteligência Artificial para o Terceiro Setor

O IA.3 foi criado com o objetivo de capacitar ONGs com atuação no Brasil no uso da IA, oferecendo condições para que elas incorporem essa tecnologia de maneira consciente e estratégica.

Ao democratizar o acesso à Inteligência Artificial, o IDIS não apenas responde a uma demanda emergente, mas reafirma sua crença de que a inovação deve ser inclusiva, acessível e consciente de seus impactos múltiplos, desde a forma como consome energia até a maneira como pode reproduzir ou corrigir desigualdades sociais.

Estruturado em uma jornada de capacitação de múltiplas etapas, que inclui desde conteúdos básicos, até encontros presenciais e mentorias individualizadas. A primeira etapa do projeto foi um Webinar formativo, gratuito, realizado em 22 de outubro e que reuniu inúmeras organizações de todo o país. Foram mais de 2500 inscrições para participação, representando cerca de 1,6 mil diferentes organizações da sociedade civil brasileiras.

O IA.3 incluirá, ainda, um encontro presencial em São Paulo e mentorias individualizadas para representantes de 60 organizações com melhor aproveitamento, para aprofundamento do uso de IA em suas causas, construção de soluções concretas, troca de experiências e fortalecimento de redes de colaboração.

 

Participe do lançamento do Anuário de Desempenho de Fundos Patrimoniais 2024

No dia 30 de outubro das 17h às 18h30, o IDIS e a Coalizão pelos Fundos Patrimoniais Filantrópicos lançam, em evento online, o Anuário de Desempenho dos Fundos Patrimoniais 2024.

A quarta edição da publicação traz informações sobre fluxo de caixa (patrimônio, doações recebidas, investimentos na causa e resgates para manutenção própria); alocação e rentabilidade dos investimentos; estrutura da governança (com dados sobre a presença de membros independentes e participação feminina), investimento responsável, além de perspectivas para o futuro e artigos de parceiros refletindo sobre o tema sob diversas perspectivas.

Quer participar do lançamento? Inscreva-se pelo Sympla.

 

Esta quarta edição da publicação, tem o apoio Master da Fundação Bradesco, Fundação Itaú e Movimento Bem Maior, além de apoio de 1618 InvestimentosASA – Associação Santo Agostinho, Fundação Grupo Volkswagen, Fundação José Luiz SetubalFundação Maria Cecília Souto Vidigal, Mattos Filho, Pragma Gestão de Patrimônio e Wright Capital Wealth Management.

REALIZAÇÃO

 

SOBRE FUNDOS PATRIMONIAIS

Os fundos patrimoniais, ou endowments, são mecanismos que contribuem para a sustentabilidade financeira de organizações e causas. No Brasil, o primeiro foi criado na década de 50 e se intensificaram a partir de 2019, com a sansão da Lei 13.800/19. Segundo o Monitor de Fundos Patrimoniais, há hoje no país mais de 120 fundos patrimoniais ativos.

Saiba mais:

Planejar é uma arte: IDIS realiza encontro interno para definir prioridades do planejamento estratégico de 2026

Inspirado pelo tema “Esperançar”, tema central do Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais 2025, o IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social reuniu, em outubro, sua equipe de colaboradores e lideranças em um encontro dedicado ao planejamento estratégico de 2026.

O evento, realizado no auditório da Pinacoteca de São Paulo, teve como objetivo definir as ações prioritárias que orientarão o trabalho do IDIS no próximo triênio. A manhã foi marcada por debates construtivos, trocas de experiências e reflexões coletivas sobre o papel da instituição na promoção do investimento social privado (ISP) no Brasil.

O que é ISP?

Equipe IDIS

“Aqui no IDIS, entendemos que isso é fundamental e, por isso, já se tornou uma tradição anual: momentos para olhar não só para o que ainda falta fazer, mas também para reconhecer, com um pouco mais de respiro, tudo o que já foi realizado para pensar o que mais podemos realizar”, destacou a CEO do IDIS, Paula Fabiani.

Após a programação estratégica, os nossos “querIDIS” almoçaram no Flor Cafe, no Museu da Língua Portuguesa e, no período da tarde, realizaram uma visita guiada ao acervo da Pinacoteca, museu de arte mais antigo do Estado. A experiência foi também um convite à contemplação e à inspiração, reforçando o elo entre arte, cultura e transformação social.

Vaga de Estágio em Comunicação

O IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social tem uma nova oportunidade para estudantes de carreiras relacionadas à comunicação, como Jornalismo, Relações públicas, Publicidade e Propaganda. E também a Administração, Economia, Gestão de Políticas Públicas, Relações Internacionais, e áreas correlatas.

Atuamos desde 1999 com foco no fortalecimento do Investimento Social Privado no Brasil e o estímulo a ações transformadoras da realidade para a redução das desigualdades sociais no país.

O IDIS conta com um time de 50 pessoas dedicadas a desenvolver e implementar projetos de grande impacto que estimulem o desenvolvimento de um ecossistema de Investimento Social que atue de forma eficaz e estratégica. Oferecemos consultoria em investimento social para empresas, famílias, filantropos e organizações da sociedade civil. Além disso, desenvolvemos projetos de impacto, como campanhas e a promoção de advocacy, e investimos na geração de conhecimento, com a produção de pesquisas, artigos e publicações.

Para fortalecer a organização e nossa atuação, buscamos uma pessoa estagiária de comunicação.

Acesse a vaga na 99jobs e inscreva-se

RESPONSABILIDADES

  • Suporte para a condução de projetos de impacto, pesquisas e publicações;
  • Apoio em ações de comunicação institucional;
  • Atualização do site e mídias sociais e análise de métricas de redes sociais;
  • Pesquisa de conteúdo relacionado a temáticas de interese da organização;
  • Organização e atualização de mailings;
  • Desenvolvimento de apresentações em Power Point;
  • Suporte na produção de eventos;
  • Redação, revisão e edição de textos.

requisitos

  • Cursar carreiras relacionadas à Comunicação, como Jornalismo, Relações Públicas, Publicidade e Propaganda; E também a Administração, Economia, Gestão de Políticas Públicas, Relações Internacionais, e áreas correlatas.
  • Ter menos de 1 ano ainda para se formar;
  • Domínio do pacote Office (Word, PowerPoint, Excel) e internet;
  • Facilidade para trabalhar em equipe;
  • Familariedade com mídias sociais (Facebook, LinkedIn, Instagram, Youtube e Twitter);
  • Boa redação;
  • Interesse no terceiro setor e temas como investimento social privado, responsabilidade social, sustentabilidade.

diferenciais

  • Ter Inglês avançado.

BENEFÍCIOS

  • Bolsa Auxílio (R$ 1.650,00)
  • Seguro de Vida
  • Vale-Transporte
  • Vale-Alimentação
  • Credencial plena do Sesc
  • Day off no aniversário
  • Tipo de trabalho – Híbrido

INSCRIÇÃO

Para inscrever-se para essa oportunidade, acesse a página da vaga na 99Jobs até 19 de outubro.

O IDIS adota critérios de diversidade e inclusão nos processos seletivos.

 

SOBRE NÓS

Somos o IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, uma organização da sociedade civil de interesse público (OSCIP) fundada em 1999 e pioneira no apoio técnico ao investidor social no Brasil. Com a missão de inspirar, apoiar e ampliar o investimento social privado e seu impacto, trabalhamos junto a indivíduos, famílias, empresas, fundações e institutos corporativos e familiares, assim como organizações da sociedade civil em ações que transformam realidades e contribuem para a redução das desigualdades sociais no país.

Nossa atuação baseia-se no tripé geração de conhecimentoconsultoria e realização de projetos de impacto, que contribuem para o fortalecimento do ecossistema da filantropia estratégica e da cultura de doação. Valorizamos a atuação em parceria e a co-criação, acreditando no poder das conexões, do aprendizado conjunto, da diversidade e da pluralidade de pontos de vista.

Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais 2025: o ‘Esperançar’ para a evolução da filantropia

Aconteceu no dia 1° de outubro, em São Paulo, a 14° edição do Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais. Promovido pelo IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, o evento busca acelerar soluções por meio de conexões e fomentar a filantropia no país.

 

Com o tema ESPERANÇAR, as sessões abordaram assuntos como mudanças climáticas, filantropia corporativa, filantropia familiar, avaliação de impacto, filantropia comunitária, tecnologia e muito mais. Ao longo do dia, estiveram presentes cerca de 30 convidados e houve mais 1500 visualizações da transmissão ao vivo.

Foram 13 sessões em 10 horas de programação, com a presença de 61 palestrantes. Falaram nomes como Aron Zylberman (Instituto Cyrela), Camila Valverde (Fundação ArcelorMittal), Daniel Munduruku (Instituto UKA – Casa dos Saberes Ancestrais), Fátima Lima (MAPFRE no Brasil)Tião Rocha (Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento – CPCD), Domênica Falcão (Fundação Grupo Volkswagen) e Viviana Santiago (Oxfam Brasil). Além de convidados internacionais como Alejandro Alvarez von Gustedt (Rockefeller Philanthropy Advisors), David Kyuman Kim (Being Human) e Patricia McIlreavy (Center for Disaster Philanthropy).

Após uma abertura emocionante com as crianças da Casa José Coltro, a fala inicial ficou por conta de Daniel Munduruku, escritor e diretor-presidente do Instituto UKA – Casa dos Saberes Ancestrais. Ele deu o tom do evento na sessão ‘O esperançar é ancestral’, com uma fala inspiradora e reflexiva sobre como os saberes ancestrais – profundamente conectados à natureza e ao coletivo – apontam caminhos para atravessar as mudanças com respeito, colaboração e escuta.

A primeira plenária, ‘Esperançar em tempos de mudanças climáticas’, destacou como iniciativas filantrópicas têm atuado em múltiplas frentes no enfrentamento à crise climática. Com olhares nacionais e internacionais, as experiências apresentadas colocaram as comunidades no centro das decisões e reforçaram o papel das doações na construção de futuros sustentáveis.

Em seguida, a plenária ‘Empresas semeando transformações’ convidou a audiência a refletir sobre como a filantropia empresarial pode gerar respostas consistentes e estruturantes para os desafios socioambientais.

A mesa ‘Reverberando impactos: a geração de valor na cadeia filantrópica’ abordou como a filantropia gera valor não apenas para a sociedade, mas também para as empresas.

Outro destaque foi o debate sobre o exercício da filantropia familiar no Brasil. A partir do estudo ‘Caminhos para uma atuação mais ampla e estratégica da filantropia familiar no Brasil’, a sessão ‘Cultivando futuros: caminhos para a filantropia familiar no Brasil’ convidou à reflexão sobre como engajar novos filantropos, ampliar o volume doado e expandir os capitais mobilizados, fortalecendo o campo de forma mais estruturada, acolhedora e colaborativa.

Encerrando a programação da manhã, os participantes desfrutaram de um coquetel seguido de um almoço temático: cada mesa tinha um anfitrião que propunha um tema de conversa. Foram 18 opções de temas para aprofundar reflexões sobre as mais diversas questões.

Após o almoço, foi hora de refletir! O palco recebeu David Kyuman Kim, fundador e diretor da Being Human, para uma fala sobre o que significa ser humano.

A tradicional entrevista ‘Em conversa com…’ foi com Tania Haddad Nobre, presidente do conselho deliberativo do Insper. Com muita transparência, Tania compartilhou como sua trajetória na filantropia é marcada pela dedicação de tempo, recursos e trabalho — e, sobretudo, por um compromisso genuíno com o coletivo.

O Fórum seguiu com uma sessão especial sobre a Websérie Transformando Territórios, que trouxe representantes das organizações participantes do programa ao palco. A série apresenta 14 histórias reais de impacto local, protagonizadas por Fundações e Institutos Comunitários (FICs) que conectam lideranças, recursos e saberes para transformar realidades com consistência e propósito.

Em sintonia com esse tema, a mesa ‘Territórios e Comunidade: sonhar e transformar’ destacou experiências que valorizam a cultura, a economia local, a cooperação e a escuta como ferramentas de transformação.

No painel “Esperançar e não esperar: monitoramento para a construção de pontes”, os debatedores refletiram sobre ferramentas e níveis ideais de acompanhamento, e sobre como dados, confiança e equilíbrio de poder entram nessa equação.

A programação contou ainda com a participação dos vencedores de 2024 do Prêmio Empreendedor Social, da Folha de S.Paulo e da Fundação Schwab, que apresentaram suas iniciativas e propósitos de atuação. O painel teve mediação de Eliane Trindade, editora do prêmio.

A mesa ‘Inovações e tecnologia: da distopia à utopia’ apresentou experiências práticas que mostram como a tecnologia pode fortalecer a atuação de gestores públicos, impulsionar mudanças estruturais e promover uma cultura avaliativa voltada à transformação social.

Por fim, a plenária de encerramento ‘Interdependência e resiliência: o esperançar é coletivo’ reuniu lideranças de destaque em seus setores e países, que reforçaram a importância da colaboração entre diferentes atores e perspectivas para promover um futuro mais justo e próspero.

“Certamente enfrentamos enormes desafios, mas vimos ao longo do dia de hoje como isso não nos paralisa. Como disse Paulo Freire, que cunhou o termo ESPERANÇAR, ‘não sou esperançoso por pura teimosia, mas por imperativo existencial e histórico’. O dia de hoje celebrou os sonhos e a teimosia de pessoas que agem na busca de um mundo mais justo e sustentável”, comentou Paula Fabiani, CEO do IDIS.

 

Confira a gravação do evento na íntegra:

realização e apoio

O Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais é uma iniciativa conjunta do IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social e do Global Philanthropy Forum (GPF). Apoio master da Fundação Bradesco, Fundação Itaú, Fundação Sicredi e Movimento Bem Maior; apoio ouro da Fundação ArcelorMittal e Fundación MAPFRE Brasil ; apoio prata da Mott Foundation ; e apoio bronze da Fundação Bracell, Fundação Grupo Volkswagen, Fundação José Luiz Setúbal e Instituto Sicoob; e apoio institucional do UNICEF Brasil.

A Alliance magazine e a Stanford Social Innovation Review Brasil são parceiras de mídia do evento. Sediada na Inglaterra, a maior revista de filantropia do mundo fEZ a cobertura do evento e transmitiu em inglês ao vivo em seu canal do Youtube.

FÓRUM BRASILEIRO DE FILANTROPOS E INVESTIDORES SOCIAIS

Fórum Brasileiro de Filantropos e Investidores Sociais oferece um espaço para a comunidade filantrópica se reunir, trocar experiências e aprender com seus pares, fortalecendo a filantropia estratégica para a promoção do desenvolvimento da sociedade brasileira. O evento já reuniu mais de 1.500 participantes, entre filantropos, líderes e especialistas nacionais e internacionais. Em nosso canal do YouTube estão disponíveis listas com as gravações de todas as edições. Confira!

Testamento Solidário: um caminho estratégico para o fortalecimento dos fundos patrimoniais no Brasil

Publicado originalmente no Migalhas em 24 de setembro de 2025. Acesse clicando aqui

Por Andrea Hanai, Gerente de Projetos do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social – IDIS, e Raquel Grazzioli, Advogada do escritório Rubens Naves Santos Júnior Advogados

Nos últimos anos de vida, Maria de Camargo Dália, conhecida como D. May, decidiu transformar o patrimônio acumulado ao longo de sua trajetória em um legado social duradouro. Por meio de um testamento público, destinou sua herança, estimada em mais de R$ 700 milhões, a sete organizações da sociedade civil atuantes nas áreas de saúde, educação e assistência social.

O gesto de D. May evidencia o potencial do testamento solidário, ainda pouco difundido no Brasil, mas prática consolidada em países como os Estados Unidos. De acordo com o Legacy Giving Report 2024, da Charities Aid Foundation (CAF), mais da metade dos norte-americanos com alto poder aquisitivo (56%) declara intenção de destinar parte do patrimônio a causas sociais por meio de testamento — um dado que reforça o alcance e a relevância desse tipo de doação.

O envelhecimento populacional e a consequente transferência de riqueza para as próximas gerações criam um cenário oportuno para fortalecer a cultura de legado no país. Pela legislação brasileira, qualquer pessoa pode, por testamento, destinar livremente até 50% do próprio patrimônio para finalidades escolhidas, ficando o restante reservado a herdeiros necessários (filhos, pais ou cônjuge). Na ausência destes, a totalidade dos bens pode ser direcionada a organizações que atuem em causas de interesse público.

As doações testamentárias podem incluir recursos financeiros, imóveis, obras de arte, participações societárias e outros bens, devendo ser formalizadas preferencialmente na forma pública, para reduzir disputas e garantir a execução da vontade do testador. Quando direcionados a fundos patrimoniais (endowments), esses recursos podem gerar impacto perpétuo, financiando causas e instituições de forma sustentável. Grandes fundos internacionais — como os da Universidade Harvard, Fundação Nobel, Fundação Rockefeller e Wellcome Trust — foram constituídos, em parte, por legados testamentários.

Inspiradas nesse modelo, ao menos duas das organizações beneficiadas pelo legado de D. May — a ASA (Associação Santo Agostinho) e a Liga Solidária — optaram por destinar parte dos recursos para fortalecer seus fundos patrimoniais, que hoje superam R$ 100 milhões cada. No Brasil, segundo o Monitor de Fundos Patrimoniais do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS), há 121 fundos desse tipo, totalizando mais de R$ 137 bilhões em patrimônio.

Apesar do potencial, o testamento solidário ainda enfrenta barreiras culturais. Falar sobre morte segue sendo um tabu, e muitos percebem a elaboração de um testamento como algo complexo ou emocionalmente difícil, o que leva à procrastinação do planejamento sucessório. Campanhas educativas desempenham papel central na desmistificação do tema. Organizações como Greenpeace, Médicos Sem Fronteiras e Comitê Internacional da Cruz Vermelha já realizam ações específicas para sensibilizar doadores a incluí-las como beneficiárias em testamentos, usando desde mensagens bem-humoradas sobre o tema até histórias inspiradoras para aproximar o assunto de valores pessoais.

Outro obstáculo relevante é a falta de incentivo por parte de advogados e profissionais que atuam no planejamento sucessório. Pesquisas indicam que, quando a possibilidade de doação não é apresentada, menos de 5% dos testamentos incluem causas sociais. Esse número mais que dobra quando há sugestão expressa e pode ultrapassar 15% quando acompanhada de exemplos de outros doadores. Isso reforça o papel estratégico desses profissionais na difusão da cultura de legado.

Para que o potencial se concretize, é necessário o engajamento coordenado de organizações, especialistas e campanhas de conscientização, de forma a inserir o testamento solidário como prática comum de filantropia no país.

Também é fundamental que as organizações estejam preparadas para receber esse tipo de doação. Boas práticas de governança, transparência, prestação de contas e gestão responsável são determinantes para gerar a confiança necessária nos doadores. Além disso, é recomendável que os fundos patrimoniais comuniquem, de forma clara, que aceitam legados e capacitem equipes para dialogar sobre o tema com sensibilidade e clareza.

A morte encerra um ciclo individual, mas não precisa interromper um compromisso com o futuro. O exemplo de D. May mostra que o testamento solidário pode garantir que causas relevantes continuem a receber apoio, fortalecendo estruturas como fundos patrimoniais e deixando um legado de impacto para as próximas gerações.

Investimento Social Privado também é para os pequenos

Artigo publicado originalmente na Revista Problemas Brasileiros

Por Paula Fabiani, CEO do IDIS

Construir uma sociedade mais justa passa, necessariamente, pelo fortalecimento da responsabilidade social corporativa. Nesse contexto, o Investimento Social Privado (ISP) surge como uma ferramenta essencial para canalizar recursos para causas socioambientais e gerar impacto positivo. E embora ainda persista a ideia de que apenas grandes empresas têm estrutura para isso, o ISP também é possível — e necessário — para Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPMEs).

Essa é uma das reflexões da quarta edição do relatório Perspectivas para a filantropia no Brasil, do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS). O estudo destaca o envolvimento crescente de MPMEs em ações de ISP, desmistificando a lógica de que filantropia corporativa é território exclusivo de grandes corporações.

Baixe o Perspectivas para a filantropia 2025:

Captcha obrigatório

Há bons exemplos nesse cenário. A Métrica.Social, pequena empresa de tecnologia, aderiu ao movimento Compromisso 1% — iniciativa do IDIS e do Instituto MOL —, comprometendo-se a doar, em até dois anos, 1% de seus lucros para causas socioambientais. Já a Braúna, empresa de fruticultura do norte de Minas Gerais, estruturou a sua estratégia de ISP com o apoio do IDIS e estabeleceu a meta de investir até 25% de seus lucros no desenvolvimento da comunidade local.

Segundo o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), as MPMEs respondem por mais de 55% dos empregos formais e cerca de 30% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Ainda assim, a atuação dessas empresas no ISP é pouco mapeada e incentivada. O Compromisso 1% surge como um instrumento potente para ampliar a participação desse segmento, convidando empresas de diferentes portes a destinarem 1% de seu lucro líquido anual para organizações da sociedade civil.

Além disso, mudanças no cenário regulatório — como a Resolução 193 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a legislação europeia Diretiva de Relatórios de Sustentabilidade Corporativa (CSRD) — devem estimular ainda mais o engajamento das MPMEs, especialmente as inseridas em cadeias produtivas globais.

Mais do que impacto social, o ISP é também estratégia de posicionamento de marca, fortalecimento de vínculos e geração de valor compartilhado. Independentemente do tamanho, toda empresa pode (e deve) fazer parte dessa transformação.

Dia da Filantropia na COP30 | Parcerias Inovadoras para um Futuro Sustentável

Evento traz ao centro dos debates a relevância do capital filantrópico para o financiamento climático alinhado à justiça socioambiental

 

A filantropia e o capital de impacto terão espaço de destaque na COP30, em Belém. No dia 17 de novembro será realizado o Dia da Filantropia, encontro gratuito que reunirá investidores socioambientais de empresas, fundações e institutos empresariais e independentes, além de representantes da sociedade civil organizada para debater o papel do capital privado para acelerar soluções climáticas. O evento acontece na Casa Balaio, no bairro de Nazaré, das 14h30 às 18h30, mediante inscrição prévia. Tradução simultânea será disponibilizada.

Vai para a COP30? Reserve a data e faça sua inscrição clicando aqui

Promovido por CAF – Charities Aid Foundation, GIFE, IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, Latimpacto, Sitawi e WINGS, e com apoio da RD Saúde organizações nacionais e internacionais que atuam diretamente para o fortalecimento do campo filantrópico, o encontro propõe uma imersão em novas dinâmicas de filantropia. A programação conta com palestrantes de diferentes países e apresentará experiências práticas e inspiradoras de atores engajados no enfrentamento dos desafios ambientais contemporâneos.

Para Paula Fabiani, CEO do IDIS, o evento irá evidenciar como a filantropia pode multiplicar seu impacto e afirma que “O avanço da agenda climática não resulta apenas de acordos internacionais e políticas públicas. Ele requer uma ação coordenada entre diferentes setores da sociedade, mobilização de recursos estratégicos e colaboração contínua.

Serão debatidas estratégias que vão desde o apoio à adaptação de comunidades e à reconstrução pós-desastres, até a mobilização por justiça climática, desenvolvimento socioambiental, inovação tecnológica, transição energética e políticas públicas equitativas.

Por dentro dos impactos da reforma tributária no terceiro setor

No final de 2023, foi promulgada a Emenda Constitucional que estruturou a Reforma Tributária. As novas regras do sistema tributário afetam não apenas as operações das empresas, mas também têm um impacto significativo nas organizações da sociedade civil e na prática da filantropia no país. A reforma tributária traz uma série de alterações que devem aumentar a arrecadação do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).

Mas o que isso significa para o futuro do terceiro setor? Quais são, efetivamente, as mudanças? A ‘Aliança pelo fortalecimento da Sociedade Civil’, iniciativa liderada pelo Instituto Beja e que tem a participação do IDIS, tem atuado para incidir sobre o assunto, promovendo um ambiente regulatório mais favorável às doações no Brasil..

Fique por dentro do assunto aco1mpanhando nossa curadoria de conteúdo e notícias, com atualizações a cada novo passo.

Impact Minds 2025: conexões, cultura e impacto

Por Fabio Lupo, gerente de prospecção e parcerias no IDIS

Representando o IDIS, participei do ImpactMinds: Collective Makers, promovido pela Latimpacto, que reuniu em Medellín, Colômbia, mais de 700 pessoas de diversos países e organizações comprometidas com o fortalecimento do ecossistema de impacto na América Latina. O evento proporcionou um espaço de trocas e aprendizados, onde os desafios sociais da América Latina estiveram em evidência.

Delegação brasileira na Impact Minds 2025

Logo no primeiro dia, os participantes foram convidados a conhecer a cidade por meio de visitas a bens culturais, comunidades e organizações locais. Escolhi o roteiro que incluía o Museu de Antioquia, onde tive a oportunidade de conhecer os bastidores da instituição, seus programas educativos e visitar a exposição de Fernando Botero. As doações do artista foram fundamentais para o reconhecimento e relevância do museu, evidenciando o poder transformador da filantropia cultural.

Marcos Manoel, Diretor de Projetos do IDIS, que também participou do evento, escolheu a visita à Comuna 13 – uma das regiões mais emblemáticas de Medellín, marcada por um passado de violência, mas que hoje é símbolo de transformação social, arte urbana e resistência comunitária. A visita proporcionada pelo evento permitiu aos participantes conhecer iniciativas locais, murais de grafite que contam a história da comunidade e projetos que promovem inclusão e desenvolvimento.

Ao longo dos dias seguintes, participei de painéis e oficinas que abordaram temas centrais para o avanço do investimento social privado e dos negócios de impacto. Um dos destaques foi a discussão sobre o destravamento de finanças para iniciativas que geram impacto socioambiental positivo. A complexidade do tema foi abordada sob diferentes perspectivas – desde o papel das finanças híbridas e dos instrumentos inovadores, até os desafios regulatórios e culturais que ainda limitam o fluxo de capital para soluções transformadoras.

Outro ponto recorrente nas conversas foi a importância de investidores sociais confiarem nas organizações que apoiam, reconhecendo-as como especialistas nas causas e conhecedoras dos contextos em que atuam.

O evento também foi marcado por uma forte conexão com a cultura colombiana. A generosidade, o calor humano e a receptividade dos anfitriões criaram um ambiente acolhedor, que favoreceu o diálogo e a construção de pontes entre diferentes atores para o enfrentamento das desigualdades na América Latina.

O encerramento do ImpactMinds contou com a participação da líder indígena brasileira Vanda Witoto, que discursou sobre ancestralidade, território e resiliência. Foi também anunciado que a próxima edição do evento acontecerá em Manaus, Amazonas, em 2026 – uma escolha simbólica e estratégica, que coloca o bioma amazônico no centro das discussões sobre resiliência climática e justiça socioambiental.

A participação do IDIS no ImpactMinds reafirma nosso compromisso com o fortalecimento do ecossistema de impacto na América Latina e com a busca por soluções que promovam justiça social, equidade e sustentabilidade. Voltamos com ideias renovadas, parcerias em potencial e a certeza de que, juntos, podemos destravar caminhos para um futuro mais justo e inclusivo.

Filantropia Comunitária é tema de WebSérie do Programa Transformando Territórios

De quem é a responsabilidade de transformar os territórios?

Com um convite para essa reflexão, o IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social junto ao coletivo de Fundações e Institutos Comunitários (FICs) lançou, no dia 19 de agosto, a Websérie Transformando Territórios, que traz histórias reais de impacto, pertencimento e protagonismo comunitário promovidos pelas FICs em diversas regiões do Brasil. São 14 vídeos cujo mote é a transformação em cada um dos territórios das organizações participantes, passando por Manaus, São Paulo, Maceió, Porto Alegre e diversas outras cidades e regiões metropolitanas.

Um dos episódios destaca o trabalho do Instituto Cacimba, que atua no Jardim Ângela, em São Paulo (SP), como uma ponte entre a juventude, a cultura local e a construção de soluções coletivas para o território. O episódio destaca a atuação da Escola de DesNegócio, projeto do Instituto NUA, com apoio do Cacimba, cujo objetivo é capacitar, apoiar e acelerar negócios periféricos, impulsionando o empreendedorismo e a economia local, a partir da geração de riqueza compartilhada para o território e sua comunidade.

“Acreditamos que a filantropia comunitária pode ser um importante vetor de transformação social no Brasil. Já bem disseminado no exterior, nós tivemos que “ajaboticabar” esse modelo para nossa realidade brasileira. E o lançamento da websérie é um grande marco para o programa Transformando Territórios e todas as organizações que o integram. Com todos esses vídeos, podemos enxergar a abrangência das atuações das fundações e institutos comunitários (FICs) brasileiros e toda essa diversidade em cada um dos territórios. Essa websérie foi construída colaborativamente com as FICs, o que contribuiu para que ele se tornasse ainda mais incrível”, comenta Paula Fabiani, CEO do IDIS.

 

Paula Fabiani com lideranças das organizações durante encontro ocorrido em março

A websérie apresenta iniciativas desenvolvidas por organizações que conhecem de perto os desafios e as oportunidades de seus territórios, atuando com base no diálogo, na escuta e na mobilização comunitária. São elas:

 

  • Alagoas: Mundaú Mundo
  • Amazonas: Manauara Associação Comunitária
  • Espírito Santo: FUNDAES – Federação das Fundações e Associações do Espírito Santo
  • Maranhão: Instituto Baixada Maranhense
  • Minas Gerais: Associação Nossa Cidade e JEQUI – Instituto Comunitário de Desenvolvimento e Inovação do Vale do Jequitinhonha
  • Rio de Janeiro: Fundo Comunitário da Maré e Instituto Comunitário Paraty
  • Rio Grande do Sul: Fundação Gerações
  • São Paulo: Fundo Comunitário Perifasul M’Boi Mirim, FEAV – Fórum das Entidades Assistenciais de Valinhos e Instituto Cacimba
  • Santa Catarina: ICOM – Instituto Comunitário Grande Florianópolis
  • Sergipe: ICOSE – Instituto Comunitário de Sergipe

 

A produção, que conta com apoio do Movimento Bem Maior, integra o programa Transformando Territórios,  iniciativa do IDIS com a Charles Stewart Mott Foundation, que impulsiona a criação e o fortalecimento de FICs no Brasil, com o propósito de promover desenvolvimento local a partir de estratégias colaborativas, transparentes e conectadas às demandas reais da população.

 


SOBRE O TRANSFORMANDO TERRITÓRIOS

O Programa Transformando Territórios é uma iniciativa do IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social – com a Charles Stewart Mott Foundation para fomentar a criação e fortalecimento de Institutos e Fundações Comunitárias no Brasil, com o engajamento de doadores e sociedade civil, compartilhamento de conhecimento e apoio técnico.

Saiba mais sobre o programa e os participantes em www.transformandoterritorios.org.br.

Diálogos MCD: aprendizados sobre a Doação Livre de Mackenzie Scott e novos caminhos para a filantropia brasileira

Artigo originalmente publicado no Movimento por uma Cultura de Doação, em 18/08/2025

Por Movimento por uma Cultura de Doação – MCD, a partir de encontro realizado em 15 de agosto de 2025, com Cynthia Betti (Plan International Brasil) e Guilherme Sylos (IDIS).


Retomamos o “Diálogos MCD” na sexta-feira, 15 de agosto, e foi inspirador!

Com Cynthia Betti (Plan International Brasil) e Guilherme Sylos (IDIS) como anfitriões, conversamos sobre as experiências de receber uma doação de MacKenzie Scott e refletimos sobre o que esse modelo pode ensinar à filantropia no Brasil.

Começamos com um momento de conexão em pequenos grupos, que abriu espaço para um debate rico sobre processos de doação baseados em confiança, usos estratégicos dos recursos e como ampliar esse modelo no Brasil.

Partimos da experiência das 2 organizações, que foi expandida para a aprendizagem coletiva do grupo que foi criado com 17 organizações que receberam doação da filantropa americana desde 2021 no Brasil. 

O processo: confiança no centro

Diferente do que estamos acostumados a experienciar – editais complexos  e exigências excessivas –  o processo de seleção foi uma “pesquisa silenciosa”: consultoras analisaram relatórios públicos, conversaram com as equipes e avaliaram governança, sustentabilidade e gestão, sem anunciar valores ou doador. 

A doação praticada pela MacKenzie Scott é o que chamamos de “One Time Gift”, e chega sem amarras. Isso não significa que não vem carregada de responsabilidade para “fazer jus ao privilégio” de ter sido uma organização selecionada, muito pelo contrário.

Como o dinheiro ganhou vida

Cada organização encontrou seu caminho, e os seguintes pontos foram identificados:

  • Fortalecimento institucional: capacitação, comunicação, inovação, captação de recursos,  novas contratações em posições chave, no caso da Plan.
  • Captação estratégica: matching e fundos patrimoniais para sustentabilidade de longo prazo, no caso do IDIS.
  • Programas e inovação: expansão e testes de novas iniciativas.
  • Fundos específicos: para mulheres, empreendedores, coletivos.
  • Participação: editais onde as próprias organizações participantes votam nos contemplados.

💡 Exemplo Plan International Brasil: criou um fundo de contingência, lançou uma chamada para meninas, coletivos e organizações pequenas. Em setembro, lançará, em parceria com o IACP, o projeto Bacuri que vai apoiar organizações de base comunitária no Maranhão e Piauí com formação, mentoria e recursos financeiros. 

💡 Exemplo IDIS: reforçou seu fundo patrimonial com matching, atraindo doadores brasileiros e garantindo a perenidade do investimento.

Divulgar ou não divulgar a doação recebida?

Algumas organizações preferiram não tornar pública a doação, por receio de perder apoiadores ou pelo contexto político. A experiência também mostrou que a transparência pode atuar como chancela e até atrair novos financiadores.

Aprendizados e provocações

  • Validação e credibilidade: passar pelo crivo de MacKenzie Scott foi percebido como reconhecimento de atuação

  • Impacto no ecossistema: o recurso não é só para crescer individualmente, mas para fortalecer redes e territórios.

A provocação que ficou: por que a filantropia brasileira não adota um modelo similar a este?

Estudos já mostram os benefícios das doações flexíveis, mas ainda há pouca discussão a respeito.

Os aprendizados do grupo das 17 organizações foram transformados em um relatório que foi compartilhado em diversas instâncias.

“O grande desafio é fazer esta informação chegar nas pessoas tomadoras de decisão, filantropas e filantropos, de forma a buscarmos uma reflexão do que precisamos fazer para mudar a forma que estamos conduzindo a filantropia aqui no Brasil. Um diálogo urgente e necessário.”

Próximos passos e desafios

  1. Amplificar a voz: usar aprendizados e dados para inspirar mais doadores.

  2. Inspirar pelo processo: mostrar que o valor não está só no dinheiro, mas na confiança e liberdade.

  3. Trabalho de desenvolvimento institucional: fortalecer organizações para que estejam prontas quando oportunidades assim surgirem.

  4. Sair da bolha: dialogar com filantropos e investidores que ainda não conhecem ou praticam esse modelo.

  5. Expandir o debate: traduzir e compartilhar relatórios, realizar eventos direcionados e criar casos inspiradores.

A comunicação como ponte (e barreira) para doações

Artigo publicado originalmente na Sociedade Viva

por Luisa Lima e Marina Negrão, respectivamente gerente e coordenadora de comunicação e conhecimento no IDIS

Doar é um gesto que nasce da confiança. Confiança na causa, na organização e, cada vez mais, na mensagem que chega até o doador. A Pesquisa Doação Brasil 2024, iniciativa do IDIS, realizada pela Ipsos, revela que, mais do que solidariedade espontânea ou capacidade financeira, a decisão de contribuir está ligada à credibilidade das instituições e à segurança de que o recurso doado será bem utilizado.

Os números demonstram que 81% dos brasileiros afirmam que a confiança é determinante para doar, mas apenas 30% acreditam que a maioria das ONGs seja confiável. Esse contraste não é exclusivo da pesquisa de 2024, acompanha o setor, entre pequenas melhoras e pioras, desde a primeira edição que foi realizada em 2015. Nesta mais recente edição, porém, algo curioso aconteceu. Entre os não doadores, pela primeira vez, a falta de confiança despontou como um dos principais motivos do porquê não doam, reduzindo o percentual de pessoas que respondem o clássico ‘não doo por falta de recursos financeiros’.

O que esse cenário nos revela é o nosso grande desafio como setor: conquistar legitimidade aos olhos da sociedade. Se de um lado há disposição em ajudar, de outro existe desconfiança sobre a aplicação dos recursos e sobre a efetividade do impacto.

É nesse ponto que a comunicação se mostra decisiva. Mais do que pedir doações, é importante demonstrarmos como os recursos são usados, quais resultados foram alcançados, quem foi beneficiado, qual o impacto que o trabalho das ONGs gera para causas e públicos menorizados e, o principal, fazer com que esses recados cheguem ao doador.

 

A FORÇA DAS REDES SOCIAIS E A MÍDIA COMO ALIADA

As redes sociais têm um papel importante na difusão de informações, mas o cerne está em como as organizações comunicam, pois é a percepção de seriedade e transparência que garantem que a sensibilização se converta em apoio efetivo e recorrente.

Nesse sentido, as organizações podem investir em comunicação, inclusive com estratégias específicas e diferentes para as redes que mais influenciam na decisão de doar que, segundo a pesquisa, são Instagram (85%) e Facebook (36%). É interessante também que a organização conheça o público com quem quer falar, pois isso pode também influenciar em onde e como comunicar. Entre pessoas de 18 a 29 anos, por exemplo, a influência do Instagram para a prática de doação sobre de 85% para 91%. Já entre aqueles com 50 anos ou mais, o Facebook dispara de 36 para 70 pontos percentuais.

Quando pensamos na imprensa, um dado inédito dessa edição demonstra que 49% das pessoas já deixaram de doar ao verem uma notícia negativa sobre o assunto na mídia. Por outro lado, a influência das campanhas em veículos tradicionais de mídia na decisão de doar saltou de 10% para 20%.

Nesse caso, há uma responsabilidade compartilhada. Se de um lado as organizações estão trabalhando duro para se comunicarem com mais transparência e clareza, é necessário que a imprensa dê maior visibilidade a histórias de impacto positivo e inclua a doação na pauta pública relevante, a tratando com responsabilidade e cuidado.

 

E QUAL O NOSSO PAPEL NESSE CONTEXTO?

Sendo a falta de confiança nas ONGs um problema estrutural, ele demanda soluções também estruturais. É necessário termos ações multisetoriais, coordenadas e pensadas a partir das parcerias entre vários atores da sociedade.

Organizações estruturantes do terceiro setor, como o próprio IDIS, que promovem a cultura de doação em seu dia a dia de atuação, têm um papel fundamental em ampliar o conhecimento sobre o trabalho exemplar realizado por ONGs e sua contribuição para a redução das desigualdades. A contribuição vem a partir de produção de dados, campanhas de engajamento, advocacy, ferramentas inovadoras e tantas outras frentes que fomentem a reflexão e debate sobre o tema. Em 2018, lançamos a plataforma Descubra sua Causa, hoje sob gestão do Instituto MOL, oferecendo caminhos fáceis e seguros para doação.

A responsabilidade, claro, também se estende a outros atores. O poder público pode valorizar o papel crucial das organizações sociais e aprimorar mecanismos de compliance; empresas podem engajar colaboradores e clientes com campanhas de conscientização e a indicação de ONGs pré-validadas, dentre tantas outras ações.

 

UMA DÉCADA DE ANÁLISES

A trajetória da Pesquisa Doação Brasil desde 2015 mostra como a comunicação vem ganhando espaço na cultura de doação. Na primeira edição, o foco principal foi mapear quem doa e quanto doa, dados que antes não existiam. Olhando para a edição de 2024, vemos alguns dados voltarem ao patamar de como estávamos há 10 anos atrás, outros evoluírem significativamente, entre boas e más notícias que a nova edição nos trouxe, é importante nos atentarmos em como o debate acerca da cultura de doação amadureceu de lá para cá.

Doar é um ato cidadão. É acreditar que aquela contribuição pode, de fato, transformar realidades. E para que esse acreditar seja perene, é preciso confiança. Uma confiança que começa na forma como as organizações se comunicam e se consolida quando os resultados falam por si.

IDIS apresenta renovação no corpo de conselheiros

O IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, organização pioneira no apoio técnico ao investidor social no Brasil e comprometida com a promoção da filantropia, passou recentemente por uma renovação em seu corpo de conselheiros, reafirmando seu compromisso com a governança. 

Como parte dessa renovação, passam a integrar o Conselho Deliberativo Cristina Schachtitz, especialista em comunicação estratégica e ex-vice-presidente de comunicação corporativa e de crise da Edelman; Luiz Fernando Figueiredo, filantropo, ex-diretor do Banco Central e atual chairman da Jive Investments; e Rodolfo Avelino, professor do Insper e especialista na área de tecnologia da informação e transformação digital.

Liderança do IDIS reunida com novos conselheiros da organização

 

Além disso, a partir do segundo semestre de 2025, o Conselho Deliberativo terá nova presidência, com Maria José de Mula Cury, sócia da PwC Brasil, assumindo a liderança. Françoise Trapenard, mentora de executivos e ex-presidente da Fundação Telefônica Vivo, ocupará a vice-presidência. Ambas trazem sólida trajetória em liderança e gestão, com forte alinhamento aos valores e à missão do IDIS.

“A renovação no Conselho reflete nosso compromisso contínuo com a excelência na governança e com a pluralidade de visões. A chegada de profissionais com trajetórias sólidas e complementares fortalece nossa missão de promover o investimento social estratégico e amplia nossa capacidade de gerar impacto positivo na sociedade”, afirma Paula Fabiani, CEO do IDIS.

O processo de composição do conselho é conduzido com rigor e tem como premissa garantir a continuidade da missão institucional, ao mesmo tempo em que incorpora olhares e experiências que fortalecem a atuação do IDIS diante de novos desafios.

Para conferir a composição completa dos conselhos, acesse aqui.

Capacitação gratuita em Inteligência Artificial para ONGs começa com webinar no dia 22 de outubro

O IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, com suporte do Google.org e apoio técnico do Canal SabIAr lança o IA.3 – Inteligência Artificial para o Terceiro Setor, programa gratuito que capacitará organizações sociais em todo o Brasil no uso estratégico e ético da inteligência artificial.

A primeira atividade da jornada será o webinar formativo, no dia 22 de outubro, das 9h30 às 12h, aberto a todas as ONGs interessadas. O encontro apresentará conceitos básicos da tecnologia, ferramentas úteis e exemplos práticos de aplicação no Terceiro Setor, tornando o conteúdo acessível e aplicável no dia a dia das organizações. A participação é gratuita e ilimitada por organização, mediante inscrição.

Clique aqui para se inscrever!

Além do webinar, o IA.3 contará com outras etapas ao longo dos três anos de duração do programa:

  • Capacitação intensiva: capacitação com 30 horas, ao longo de 4 meses, combinando aulas online ao vivo, conteúdos assíncronos e atividades práticas. A primeira turma com início em 2026, a segunda em 2027. Entre os meses de outubro e novembro haverá uma chamada pública que selecionará 250 organizações.
  • Encontro presencial e mentorias: representantes das 30 organizações com melhor aproveitamento de cada turma de capacitação intensiva, participarão de um encontro presencial de dois dias, em São Paulo, com todas as despesas pagas, para aprofundamento do uso de IA em suas causas, construção de soluções concretas, troca de experiências e fortalecimento de redes de colaboração. Ele está previsto para acontecer no segundo semestre do ano da formação. Também serão oferecidas seis meses de mentorias individualizadas, contribuindo para que as organizações superem desafios de implementação.

 

Além disso, visando acompanhar a diversidade de aplicações e a contribuição do uso de novas tecnologias para organizações do Terceiro Setor, o projeto adotará uma metodologia robusta de avaliação experimental, comparando as organizações participantes da formação com organizações não participantes, que irão receber a formação em um segundo momento.

A avaliação permitirá  a produção de um estudo inédito com exemplos práticos do impacto do uso da IA, com dados quantitativos e qualitativos, a ser lançado em evento com lideranças e especialistas ao final do programa.

Pesquisa Doação Brasil 2024 disponibiliza gráfico interativo para cruzamento de dados

O site da Pesquisa Doação Brasil 2024 ganhou novas funcionalidades. Agora, é possível cruzar informações sobre o comportamento do doador brasileiro com dados demográficos em uma plataforma interativa, além de realizar o download das bases de dados.

Os usuários podem selecionar variáveis de interesse e gerar gráficos personalizados com os resultados. Para acessar, basta entrar no site da pesquisa e clicar na seção ‘Gráficos Interativos’. Você também pode acessá-lo diretamente aqui.

Assista também ao lançamento da Pesquisa Doação Brasil 2024:

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REALIZADORES E APOIADORES

SOBRE a PESQUISA DOAÇÃO BRASIL

Pesquisa Doação Brasil foi criada com o propósito de mapear, de forma aprofundada, as percepções, atitudes e práticas de doação entre os brasileiros, com foco especial nas contribuições monetárias. O estudo investiga os fatores que impulsionam ou dificultam o ato de doar, oferecendo uma leitura abrangente do comportamento do doador individual no país. Desde sua primeira edição, que refletiu o ano de 2015, a pesquisa se consolidou como a principal fonte de dados sobre a cultura de doação no Brasil, com novas edições sobre 2020, 2022 e 2024. Ao longo desse percurso, ela vem contribuindo para o desenvolvimento de estratégias mais eficazes de mobilização de recursos, oferecendo subsídios valiosos para políticas públicas, iniciativas do terceiro setor e ações institucionais que visam tornar a cultura de doação no Brasil mais sólida, consciente e sustentável.

Um retrato da alfabetização e da desigualdade no Brasil

Artigo originalmente publicado na Folha de S.Paulo, 22/08/2025

Estudo do Instituto Ayrton Senna e IDIS demonstrou que para cada R$1 investido em programas de alfabetização, são gerados R$18,56 em benefícios para a sociedade  

Por Daiane Zanon, Gerente Sênior de Dados, Avaliação e Monitoramento no Instituto Ayrton Senna

Gabriela Cáceres, Gerente de Avaliação e Monitoramento no Instituto Ayrton Senna

e Denise Carvalho, Gerente Sênior de Monitoramento e Avaliação no IDIS 

A educação é uma das ferramentas mais poderosas para reduzir desigualdades. Mas, no Brasil, esse caminho ainda está longe de ser uma realidade para todos. Um estudo do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS) revelou que entre as crianças pertencentes à metade mais pobre da população, apenas 10,8% conseguem alcançar o grupo dos 25% mais ricos na vida adulta. Essa baixa mobilidade social está diretamente ligada ao acesso desigual à educação, especialmente nos primeiros anos escolares. 

O resultado do Indicador Criança Alfabetizada, recentemente divulgado pelo Ministério da Educação, mostra que apenas 59% dos alunos estão alfabetizados ao final do 2º ano do Ensino Fundamental. Isso significa que quase metade das crianças brasileiras não desenvolve, no tempo adequado, as habilidades básicas de leitura e escrita. E quando a alfabetização falha no início da trajetória, os prejuízos se acumulam: o aluno passa a ter mais dificuldade para acompanhar os conteúdos, corre maior risco de repetência e abandono e se afasta das oportunidades que a escola deveria garantir. 

Entre os mais afetados estão os estudantes em atraso escolar – um grupo numeroso e frequentemente deixado para trás. Embora a taxa de distorção idade-série nos anos iniciais tenha caído pela metade na última década (de 14% para 7%), ela ainda é quase o dobro nas escolas públicas em comparação às privadas. Essa desigualdade também fica evidente na forma como cada criança é apoiada ao enfrentar dificuldades. Uma criança de família com maior renda, ao ter problemas na escola, costuma contar com aulas de reforço e apoio em casa. Já uma criança em situação de vulnerabilidade, muitas vezes segue adiante sem aprender, acumulando frustrações que comprometem toda a sua trajetória escolar e de vida. 

Um exemplo é o de Ronaldo Lima Santos, de Itabaiana (SE), egresso do programa Se Liga, desenvolvido pelo Instituto Ayrton Senna em parceria com a rede pública local. Aos nove anos, ele vendia frutas com o pai, tinha muita dificuldade para ler e escrever e já acumulava uma série de reprovações. Sentia-se inferior aos colegas e evitava ir à escola. Foi ao entrar no programa de recomposição de aprendizagem que sua trajetória começou a mudar: passou a ter aulas adaptadas às suas necessidades, recuperou a autoestima, aprendeu a ler e escrever e seguiu em frente. 

Em um depoimento gravado na época, Ronaldo dizia: “Eu me olhava no espelho e me achava um menino bruto, idiota. Agora me olho no espelho e vejo um menino inteligente, sabido.”

Hoje, já adulto, ele é empreendedor, tem autonomia financeira e movimenta a economia local. Sua história é um lembrete potente de como a alfabetização pode transformar não só a trajetória escolar, mas a forma como a criança se enxerga e sonha com o futuro. 

E os dados mostram o quanto esse tipo de intervenção vale a pena. Um estudo do IDIS, encomendado pelo Instituto Ayrton Senna, aponta que cada R$ 1 investido em programas de recomposição da aprendizagem para alunos em atraso escolar gera R$ 18,56 em benefícios para a sociedade. A Avaliação de Análise Custo-Benefício (ACB) compara os benefícios sociais, econômicos e ambientais gerados por uma iniciativa, com os recursos investidos para sua implementação. Essa comparação tem como base a análise de uma série de evidências para responder, principalmente, três perguntas: qual a transformação social, econômica ou ambiental provocada pelo investimento; qual o valor econômico (ou estimativa) das transformações geradas; e por quanto tempo as transformações serão percebidas. A partir desta análise, portanto, é possível perceber que os programas como o Se Liga e o Acelera Brasil, desenvolvidos em parceria com redes públicas de ensino, conseguem virar o jogo na educação, oferecendo apoio adequado e de qualidade. 

Para romper o ciclo da desigualdade, é preciso colocar as crianças que mais precisam no centro das políticas públicas. Garantir o direito à aprendizagem – inclusive para quem já está em atraso escolar – é um investimento que beneficia a todos. O Estado economiza com repetência e abandono, e os estudantes ganham mais chances de concluir os estudos, acessar boas oportunidades e contribuir para o desenvolvimento do país. 

Por outro lado, as perdas de uma educação falha são imensas. O estudo “Consequências da violação do direito à educação”, desenvolvido pelo Insper em 2021, estima que cada jovem que não conclui a educação básica representa um prejuízo de R$ 395 mil para a sociedade. Somando todos os jovens que devem evadir a escola, o custo pode passar de R$ 220 bilhões — o equivalente a 3,3% do PIB nacional e mais de quatro vezes o investimento necessário para garantir uma trajetória regular de escolarização. 

Mas, no fim das contas, o impacto de garantir a aprendizagem adequada vai muito além dos números. Ele está na história de cada criança que, ao aprender a ler e escrever, começa a acreditar em si mesma. Ronaldo é a prova disso. E sua trajetória nos lembra que milhões de outras crianças ainda esperam por essa mesma chance. 

Como a agenda de sustentabilidade pode ser alavancada por meio do Investimento Social Privado?

Empresas que investem socialmente, de forma estratégica, colhem resultados que vão muito além do impacto social: ganham em reputação, inovação e sustentabilidade.

Yasmim Araujo Lopes, Analista de Projetos no IDIS

A agenda ESG se caracteriza pela incorporação de critérios sociais, ambientais e de governança no negócio. Hoje, é reconhecida como uma estratégia na agenda das empresas, com papel central de mitigar riscos não financeiros e garantir negócios mais resilientes e sustentáveis a longo prazo, em equilíbrio com a sociedade.

Evidências já mostram o valor promissor dessa agenda. Em momentos críticos, como a pandemia de Covid-19, as carteiras de investimento ESG tiveram menor volatilidade, demonstrando que esses ativos oferecem maior resiliência e reforçam a sustentabilidade das empresas em momentos de crise. O Panorama da Sustentabilidade Corporativa 2025, elaborado pela Amcham em parceria com a Humanizadas, revelou que 76% das empresas já adotam práticas sustentáveis, embora 52% ainda estejam no estágio inicial e, para 72% delas, a sustentabilidade já faz parte da estratégia de negócios.

Apesar dos avanços, ainda existem barreiras para consolidar a agenda ESG. Entre os principais desafios estão comprovar os resultados financeiros da sustentabilidade e engajar a liderança, apontados por 58% e 54% das empresas, respectivamente.

Acontece que, a Agenda ESG articulada ao Investimento Social Privado pode fortalecer um conceito ainda mais amplo: a sustentabilidade.

Confira também ‘ESG, RSC e ISP: o que significa e como as siglas se relacionam’

 

Como alavancar a sustentabilidade corporativa no Brasil?

Diante de um cenário em que a maioria das empresas ainda está nos estágios iniciais da sustentabilidade e enfrenta desafios para demonstrar valor e engajar lideranças, é preciso definir caminhos que impulsionem boas práticas e gerem resultados para o negócio.

O Panorama de Sustentabilidade Corporativa analisou 15 práticas-chave, avaliando cada uma delas a partir de dois eixos: impacto (financeiro e social) e esforço de implementação. O estudo resultou em uma matriz de priorização que ajuda empresas a entenderem por onde começar e quais ações podem trazer retorno mais rápido.

Entre essas práticas, o apoio a projetos sociais e o voluntariado corporativo apareceram como quick wins. Isso significa que são iniciativas de fácil execução, com custos relativamente baixos e resultados perceptíveis em curto prazo.

 

O papel do Investimento Social Privado

Integrado à Responsabilidade Social Corporativa, o Investimento Social Privado (ISP) é a alocação voluntária e estratégica de recursos por parte das empresas para gerar um impacto socioambiental positivo, tendo como abordagem um olhar mais estratégico e orientado a resultados, baseado em dados e evidências, com foco na criação de valor de longo prazo para a sociedade e para o negócio.

Da mesma maneira que a Amcham e a Humanizadas apontaram o apoio a projetos sociais e ao voluntariado como práticas que alavancam a sustentabilidade corporativa, o estudo Investimento Social Privado: Estratégias que alavancam a Agenda ESG, do IDIS, identificou, a partir da análise do desempenho das empresas no Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE B3), a correlação existente entre boas práticas de ISP e a sustentabilidade empresarial.

O levantamento analisou o triênio 2022-2024 das empresas que fazem parte do indicador e, durante o período avaliado, a prática de Investimento Social Privado manteve-se entre os dez tópicos com maior correlação com a nota do ISE B3, evidenciando que empresas com bom desempenho em ISP também se destacam em sustentabilidade. 

 

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Fica evidente que realizar apoio e investimentos em projetos socioambientais promove a sustentabilidade corporativa. Entretanto, é necessário investir estrategicamente, engajando a liderança e considerando o próprio negócio como público do ISP.

Quando o Investimento Social Privado está alinhado à estratégia da empresa, ele promove o engajamento da liderança e garante a continuidade dos programas, evitando que as iniciativas se percam ao longo do tempo. Também fortalece o sentimento de pertencimento entre colaboradores, que passam a se envolver mais com as causas apoiadas, e amplia o reconhecimento da empresa por parte de comunidades, organizações sociais e até do poder público.

Além disso, o investimento social estratégico gera outros benefícios, como a melhora da reputação da empresa, o fortalecimento da relação com clientes, a abertura para novas parcerias e inovações em soluções sociais e ambientais e a ampliação da capacidade de influência em agendas políticas e institucionais.

 

O IDIS na agenda de sustentabilidade e ESG

Em 2023, foi oficializada a criação de uma célula ESG no time de consultoria do IDIS, oferecendo apoio técnico a empresas que desejam aprimorar suas estratégias ESG e conectá-las a suas práticas de investimento social. 

Entre os serviços oferecidos estão: 

  • Diagnóstico, planejamento e definição de planos de ação para alinhar o investimento social à estratégia ESG e de sustentabilidade;
  • Desenho estratégico com base em Teoria da Mudança (TdM), arquitetura de atuação e metodologias complementares;
  • Pesquisas, estudos e benchmarking sob medida, adaptados ao contexto e às necessidades da organização;
  • Facilitação de workshops, treinamentos e programas de capacitação para engajamento e fortalecimento institucional;
  • Estruturação de planos de monitoramento e avaliação, com definição de indicadores e métricas para reporte integrado e consistente;
  • Mensuração e alinhamento do valor gerado pelo investimento social, destacando benefícios para a sociedade e para o negócio.

 

Conheça alguns dos nossos cases: Ação da cidadania, BTG Pactual, Ella Impacta, Instituto Alpargatas e Brametal e saiba como o IDIS pode apoiar sua empresa na conexão entre propósito e sustentabilidade corporativa.

Confira aqui outros conteúdos sobre Agenda ESG e ISP. 

REFERÊNCIAS

AMCHAM, Humanizadas. Panorama Sustentabilidade Corporativa, 2025. Disponível em: <https://mkt.amcham.com.br/materiais/panorama-sustentabilidade-2025.pdf>. Acesso em: 11 jun. 2025.

B3, Sistema B. Negócios responsáveis: Um olhar para o futuro. Conexões de Valor, São Paulo, 2025. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=OdorlwbCqVw>. Acesso em: 11 jun. 2025.

Comunita. Reflexões e Tendências do ISC: Caminhos para o engajamento da alta liderança empresarial no investimento social corporativo. Comunitas, 2025. Disponível em: <https://comunitas.org.br/publicacao/reflexoes-e-tendencias-do-isc-caminhos-para-o-engajamento-da-alta-lideranca-empresarial-no-investimento-social-corporativo/>. acesso em: 22 jul. 2025.

COUTINHO, Leandro de Matos. O Pacto Global da ONU e o desenvolvimento sustentável. In: R. BNDES, Rio de Janeiro, v. 28, n. 56, p. 501-518, 2021. Disponível em: <https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/bitstream/1408/22029/1/13-BNDES-Revista56-PactoGlobalONU.pdf>. Acesso em: 11 jun. 2025.

FABIANI. Rethinking strategic corporate philanthropy: the donation chain approach. Tese de doutorado, FGV, 2024. Disponível em: <https://repositorio.fgv.br/items/7c8143ee-9098-44b7-a8f0-b519131e5854>. Acesso em: 01 jul. 2025.

IDIS. Investimento Social Privado: Estratégias que alavancam a Agenda ESG, 2024a. Disponível em: <https://www.idis.org.br/estudo-aponta-correlacao-entre-boas-praticas-de-investimento-social-privado-e-agenda-esg/>. Acesso em: 11 jun. 2025.

IDIS. O que é ESG e como ele se relaciona com o Investimento Social Privado?, 2024b. Disponível em: <https://www.idis.org.br/o-que-e-esg-e-como-ele-se-relaciona-com-o-investimento-social-privado/#:~:text=Antes%20de%20mais%20nada%2C%20%C3%A9,que%20circundam%20a%20atividade%20empresarial.%E2%80%9D>. Acesso em: 11 jun. 2025.

PAGOTTO, et al., Entre o público e o privado caminhos do alinhamento entre o investimento social privado e o negócio. São Paulo: GVces, 2016. Disponível em: <https://sinapse.gife.org.br/download/entre-o-publico-e-o-privado-caminhos-do-alinhamento-entre-o-investimento-social-privado-e-o-negocio>. Acesso em: 11 jun. 2025.

 

Da base para o topo: como a Nossa Cidade fortalece comunidades em Brumadinho e na Grande BH

Às margens do Rio Paraopeba, em Brumadinho (MG), a artesã Maria dos Anjos viu sua comunidade ser devastada pelo rompimento em 2019. Pouco depois, a pandemia agravou ainda mais o cenário. Foi nesse contexto que Maria percebeu o aumento dos casos de depressão, especialmente entre as pessoas com deficiência da região – e decidiu agir. Criou, então, um projeto baseado na técnica ancestral do fuxico, uma técnica de costura para reaproveitando de tecidos, transformando colchas de retalhos em instrumentos de acolhimento, cuidado e cura.

Para dar o pontapé inicial e comprar o material necessário – mesmo que de baixo custo –, ela precisou de apoio. Os recursos vieram do Fundo Regenerativo de Brumadinho, gerido pela Associação Nossa Cidade (ANC), Fundação Comunitária Territorial composta por voluntários, com atuação em 34 municípios da Grande Belo Horizonte, incluindo Brumadinho. Hoje, o projeto de fuxico é autossustentável, e Maria dos Anjos tornou-se uma das principais lideranças da ANC. O trabalho dela simboliza a força de uma comunidade que se recusa a esquecer e que escolheu florescer.

O diretor voluntário Renato Orozco e Maria dos Anjos, liderança de projeto apoiado em Brumadinho

Essa é apenas uma das quase 100 iniciativas já apoiadas pela ANC com microgrants –pequenos financiamentos que geram grandes transformações. Fundada em 2014, a ANC implementa fundos regenerativos, uma tecnologia social que permite a criação de fundos comunitários com governança participativa. Esses fundos são geridos pelas e para as comunidades, que escolhem quais de seus projetos devem ser financiados.

Nossos fundos locais são um catalisador para iniciativas que, muitas vezes, não conseguiriam acessar editais tradicionais. Ainda há muita gente sem letramento digital. Por isso, os curadores e suas equipes atuam diretamente nas comunidades, onde conhecem as dores e os potenciais locais. Sempre há um processo claro de acompanhamento para garantir que os recursos estão sendo bem aplicados”, explica Renato Orozco, que fundou a ANC durante um MBA em Impacto Social em Boston e hoje atua como um dos diretores voluntários ao lado da líder comunitária Marlúcia Baesse (a Tia Lu) e do executivo de ESG e filantropo Eduardo Cetlin.

 

Os diretores voluntários Eduardo Cetlin e Marlúcia Baesse (a Tia Lu)

A organização atua majoritariamente como grantmaker, financiando iniciativas comunitárias em vez de executá-las diretamente. Esse modelo promove uma filantropia descentralizada, que valoriza o protagonismo local. Além da destinação de recursos de fundos locais, a ANC também oferece capacitação, apoio técnico e contribui para o fortalecimento institucional de organizações, coletivos e lideranças comunitárias.

“Depois de mais de uma década de aprendizado, está claro: as soluções já existem nos próprios territórios. Nosso papel é simples, é financiar, apoiar e celebrar essas iniciativas para que floresçam cada vez mais. Por isso, nossa governança é totalmente horizontal e participativa: um comitê curador, formado por membros voluntários da própria comunidade, avalia as propostas com base em critérios como impacto social, participação local e relevância ambiental, priorizando grupos historicamente marginalizados”, explica Orozco.

Projeto Favela em Ação, apoiado pela ANC

Ser majoritariamente grantmaker é, portanto, uma das características mais marcantes da Associação Nossa Cidade como uma Fundação ou Instituto Comunitário (FIC) e um dos 9 princípios que guiam o papel e a operação deste modelo de organizações. Na Carta de Princípios para FICs do IDIS, a diretriz é:

Grantmakers: captam, gerenciam e realizam doações de recursos financeiros para organizações sem fins lucrativos e iniciativas sociais do território, que atuam na linha de frente do atendimento às demandas comunitárias, de modo a assegurar a vitalidade do setor social local.

 

FUNDO REGENERATIVO DE BRUMADINHO 

A criação do Fundo Regenerativo de Brumadinho, em 2019, nasceu como uma resposta ao rompimento da barragem no Córrego do Feijão, que levou 272 pessoas à morte. Nas primeiras semanas após o desastre, a ANC arrecadou R$ 150 mil por meio de campanhas de financiamento coletivo e assumiu a gestão do fundo – cuidando da governança, da tesouraria e da conformidade.

Diferente de um fundo emergencial, o fundo regenerativo prioriza ações de médio e longo prazo, voltadas à regeneração social, ambiental e econômica do território. Os projetos apoiados pelos fundos da ANC recebem até R$ 3 mil e devem promover reconexão com a natureza, fortalecimento de vínculos e resiliência comunitária. Até hoje, já foram apoiadas 70 iniciativas, totalizando R$ 210 mil investidos diretamente em soluções locais.

“Um caso emblemático foi o da Brigada Voluntária Guará, de Casa Branca, distrito de Brumadinho. Eles precisavam urgentemente de um sistema de combate a incêndios. Em menos de 48 horas após a solicitação, estavam operando com os novos equipamentos”, destaca Orozco.

 

ATUAÇÃO MULTITEMÁTICA

Além de grantmaker, a ANC tem foco multitemático: a organização mantém os fundos de Brumadinho e Grande BH (que apoiam projetos nas áreas de educação, inclusão produtiva, meio ambiente e muitos outros temas) e está estruturando três novos fundos temáticos: o programa de bolsas Nossa Cidade (um programa de formação com bolsa-auxílio para líderes comunitários), o Fundo para Pessoas Migrantes e o Fundo para Pessoas com Deficiência. A característica multitemática também é uma das marcas das FICs, presente na Carta de Princípios para FICs do IDIS:

Multitemáticas: apoiam e investem em outras organizações da sociedade civil e iniciativas sociais de modo a abranger a diversidade de causas e temas relevantes para a comunidade, seu contexto e suas demandas próprias.

 

“Estamos em plena expansão na criação de novos fundos e na prospecção de doadores, tanto dentro quanto fora dos territórios em que atuamos. Sentimos a necessidade de estabelecer parcerias estratégicas para consolidar essa trajetória. Nosso plano é alcançar, até o fim de 2025, um total de dez fundos ativos”, adianta Orozco.

Renato Orozco, Marlúcia Baesse (a Tia Lu), Eduardo Cetlin, Maria dos Anjos Silva e Samantha Feres, dentre outros membros da Associação Nossa Cidade, no retiro da organização, na cidade de Esmeraldas (MG), em 2023

 

Um exemplo recente é o projeto de mapeamento das condições de vida da população migrante na região de Belo Horizonte. Anos atrás, a ANC apoiou o Coletivo Cio da Terra, formado por migrantes que utilizaram os recursos para criar uma feira de comercialização de produtos agroecológicos. Agora, o coletivo é parceiro na nova iniciativa: ouvir e compreender os desafios enfrentados pela população migrante local.

“Dez bolsistas estão conduzindo as entrevistas — cinco são estudantes de um programa de extensão da PUC Minas, o LER, voltado para o letramento de migrantes e parceiro no mapeamento, e os outros cinco são migrantes. O objetivo final é transformar esse diagnóstico participativo em subsídios para sensibilizar a sociedade belo-horizontina e estruturar um fundo exclusivo de apoio à população migrante moradora da região metropolitana da capital”, acrescenta Orozco.

A trajetória de consolidação da ANC como fundação comunitária territorial foi profundamente influenciada pelo programa Transformando Territórios, uma iniciativa do IDIS em parceria com a Charles Stewart Mott Foundation. “O programa foi um divisor de águas. Por meio dele, aceitamos o desafio de nos reconhecermos formalmente como uma fundação comunitária e buscamos nossa profissionalização institucional”, afirma Orozco.

Ao longo desse processo, a ANC recebeu apoio técnico, participou de eventos estratégicos e passou a desenvolver estruturas mais robustas de governança. “A própria formulação da nossa Teoria da Mudança nasceu de um curso proporcionado pelo programa. O IDIS tem sido uma ponte para acessarmos boas práticas, referências e alternativas viáveis, sempre respeitando nossa essência”, complementa.

Segundo Orozco, a ANC quer manter a alma voluntária de sua atuação, mas reconhece a necessidade de contar com um núcleo profissionalizado para dar conta do crescimento.

“Estamos num momento de travessia. Se temos uma equipe mais estruturada, também precisamos ampliar nossa capacidade de captação de recursos. Parcerias estratégicas, como o IDIS, são fundamentais para que essa expansão ocorra de forma sustentável”, comenta Orozco.

 


Informações do Território 

  • Território de atuação: Região metropolitana de Belo Horizonte, num total de 34 municípios.
  • Nome da fundação ou instituto comunitário: Associação Nossa Cidade
  • Liderança: Marlúcia Baesse (a Tia Lu), Eduardo Cetlin e Renato Orozco são os diretores entre 2024-27.
  • População: 5,1 milhões de habitantes (Censo 2022, IBGE)
  • Causas prioritárias mapeadas pela FIC: Empoderamento comunitário, cultura de doação e engajamento cívico das pessoas na resolução de nossos problemas coletivos.
  • Desafios regionais: Reconexão, resiliência, resistência e regeneração em um contexto de desafios socioambientais e desintegração do senso de comunidade.

 

A Associação Nossa Cidade integra o programa Transformando Territórios, uma iniciativa do IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social – com a Charles Stewart Mott Foundation para fomentar a criação e o fortalecimento de Institutos e Fundações Comunitárias no Brasil.

 

Quer saber mais sobre a Associação Nossa Cidade? Acesse o site.

Para conhecer mais sobre os Princípios e características das Fundações e Institutos Comunitários, acesse a Carta de Princípios através deste link.

Saiba mais sobre o programa Transformando Territórios e como apoiá-lo.

 

O monitoramento como caminho para diversidade e inclusão

Artigo originalmente publicado no Nexo, 02/08/2025

Por Ana Paula Otani, analista de monitoramento e avaliação do IDIS

Diversidade e inclusão são expressões que ecoam cada vez mais nos discursos institucionais de empresas privadas, governos e organizações da sociedade civil. Mas até que ponto esses princípios se traduzem, de fato, em práticas cotidianas? Transformar a agenda em experiências efetivas exige mais do que boas intenções: requer método, intenção e, sobretudo, monitoramento.

Mesmo quando não aparecem nomeadas como causas centrais ou eixos programáticos, diversidade e inclusão com frequência atravessam iniciativas de outras pautas, como educação, cultura, esporte ou meio ambiente, influenciando a definição de seus públicos, territórios e formas de atuação. No entanto, a simples declaração de compromisso com esses princípios não garante que práticas consideradas inclusivas não acabem, sem perceber, incorrendo em exclusão. Isso porque múltiplos fatores subjetivos, contextuais e estruturais moldam a forma como diferentes grupos vivenciam uma intervenção, sem muitas vezes serem percebidos.

É justamente nesse sentido que o monitoramento pode ser um instrumento importante para organizações que defendem a diversidade e inclusão como prática. Originalmente concebido para medir resultados e aprimorar políticas e programas, o monitoramento, assim como a avaliação de impacto, deixou de ser apenas uma ferramenta técnica de prestação de contas, podendo também atuar como instrumento de combate às desigualdades.

Monitorar é lançar luz sobre: quem está sendo excluído? Quem demonstra resistência ou insatisfação com determinadas iniciativas? E, sobretudo, por quê? De modo que rotas possam ser corrigidas a tempo.

Para isso, é fundamental que a intenção da diversidade e inclusão se manifeste desde o planejamento, na definição de objetivos claros, na escolha de públicos-alvo e no estabelecimento de indicadores de modo que um plano de monitoramento relevante e sensível às desigualdades seja elaborado.

Mais do que descrever o público de interesse, é fundamental que sua definição oriente estratégias de mobilização e comunicação, com a escolha clara dos marcadores de diversidade a serem priorizados para garantir a participação de perfis diversos. Esse cuidado permite formular perguntas que aprofundem o compromisso com a equidade. Em um programa de empregabilidade para mulheres, por exemplo, é importante ir além da taxa geral de inserção no mercado e investigar: qual a proporção de mulheres negras e brancas empregadas? Pessoas com deficiência têm acesso pleno às atividades? Moradoras de periferias enfrentam barreiras de transporte? Sem uma investigação, empecilhos que perpetuam desigualdades se mantêm inalterados, mesmo em iniciativas que buscam promover a inclusão.

Outro ponto fundamental é a existência de uma base de dados estruturada sobre os participantes de uma iniciativa, um grande desafio para muitas organizações. Dados dispersos, registros incompletos e sistemas que não se integram comprometem a capacidade de ter uma base de dados organizada e atualizada que permita não apenas acompanhar os participantes durante e após o projeto, mas avaliar as desigualdades na forma como diferentes grupos vivenciam a iniciativa. Com essas informações, as organizações conseguem tomar decisões mais embasadas e promover ajustes ao longo da implementação da iniciativa para promover, sempre que possível, uma vivência mais equitativa para diferentes perfis de participantes.

Além disso, quando se trata de diversidade, é necessário um cuidado adicional. Marcadores identitários como raça, gênero, dentre outros, devem sempre ser autodeclarados e jamais presumidos. Preservar a autonomia das pessoas sobre sua identidade é um compromisso para qualquer iniciativa. Respeitar como cada indivíduo se reconhece e se posiciona diante da sociedade não é apenas uma questão ética, mas parte central do processo de inclusão.

Diferentemente do que muitos pensam, o monitoramento não se resume somente a números. Ouvir as histórias, contextos e percepções dos beneficiários amplia a compreensão do impacto real de uma iniciativa. Conversas, entrevistas e grupos focais revelam nuances que os dados quantitativos não mostram, ajudando a identificar engajamentos e evitar que participantes sejam deixados de lado. Esse acompanhamento atento fortalece vínculos e, quando há abandono, permite investigar as causas e aprimorar as ações, tornando as iniciativas mais acolhedoras e eficazes.

Essa escuta deve alcançar também as equipes gestoras dos projetos e programas. Quando diversidade e inclusão deixam de ser temas isolados e passam a integrar metas institucionais claras, elas se tornam compromissos compartilhados em todas as esferas de uma organização. Isso exige diálogo e capacitação contínua para que a equipe possa refletir sobre suas próprias práticas e desafios, dando espaço para a construção de um ambiente proativo, onde todos estão dispostos a identificar e corrigir falhas internas que poderiam reproduzir exclusões.

Finalmente, tudo isso se reflete na avaliação de impacto, cuja demanda cresce, mas que, sem monitoramento contínuo e dados confiáveis, resulta em análises frágeis e enviesadas. Para garantir que os efeitos positivos alcancem a todos, é preciso enxergar o todo — o que exige método, trabalho e compromisso com o que não se vê à primeira vista.

Falar de diversidade e inclusão em projetos socioambientais sem investir em monitoramento é correr o risco de não enfrentar as desigualdades existentes ou até mesmo de reforçá-las. Monitorar vai além de contar participantes ou preencher planilhas, é um processo de aprendizado contínuo que possibilita ajustar e melhorar intervenções para alcançar seu potencial, assumindo responsabilidade pelos seus efeitos, sejam eles intencionais ou não.

Apesar de muitas vezes ser pouco visibilizado por ser uma atividade intermediária, o monitoramento precisa ser valorizado como prática estratégica, afinal, é o que conecta a intenção com os resultados de uma intervenção. Quando integrado à cultura organizacional, ajuda a tornar a inclusão uma prática efetiva, gerando mudanças reais na vida dos beneficiários e, consequentemente, na sociedade. Todos se beneficiam.

No fim das contas, é isso que nos permite ser mais honestos e ter coragem para refletir: nossas práticas são tão inclusivas quanto nossos discursos?

Transformando urgência em oportunidade: fortalecendo as doações emergenciais para um impacto de longo prazo

Por Patricia Mcllreavy, CEO do Center for Disaster Philanthropy (CDP)*
*Com sede nos Estados Unidos, mas com atuação internacional, o CDP tem apoiado os esforços de recuperação das enchentes no Rio Grande do Sul realizados pela Fundação Gerações, Retomada e AVSI Brasil

É crescente no Brasil a vulnerabilidade a desastres climáticos. Ocupando a 50ª posição entre 171 países no Índice Global de Risco Climático de 2025, a população brasileira tem enfrentado chuvas torrenciais seguidas de enchentes e deslizamentos de terra, ondas de calor severas, secas, além de incêndios florestais devastadores.

Felizmente, quando os desastres acontecem, os brasileiros respondem com generosidade, doando tempo, talentos e recursos. A Pesquisa Doação Brasil 2024 aponta que metade da população fez doações em resposta a emergências no ano passado, sendo que 60% dessas doações em dinheiro foram destinadas a locais fora do seu próprio estado. Isso demonstra não apenas solidariedade nacional, mas um instinto profundo de agir, mesmo quando a necessidade está distante de casa.

No entanto, diante dessa generosidade, surge uma pergunta: como podemos canalizar o poder das doações imediatas também para a prevenção e a recuperação de longo prazo?

No Center for Disaster Philanthropy, que lidero, reconhecemos que os três principais motivadores para doações em desastres — além da empatia — são a escala da crise, a cobertura da mídia e a proximidade. Também entendemos como os desastres e os riscos que os causam agravam vulnerabilidades pré-existentes e podem gerar maior destruição e uma recuperação mais prolongada.

As doações emergenciais imediatas, especialmente para desastres menores ou que recebem pouca atenção, muitas vezes refletem a carga emocional do momento. Essa generosidade instintiva é poderosa: as doações para alívio imediato são mobilizadas rapidamente, mas tendem a diminuir à medida que o foco da mídia muda ou os esforços de recuperação se prolongam.

No entanto, a recuperação não é uma linha do tempo nem uma fase — é uma abordagem. Ela exige mais do que reconstruir estruturas ou restaurar sistemas: requer o enfrentamento das causas profundas das vulnerabilidades, investimento em saúde mental e a capacitação das comunidades para liderarem suas próprias soluções. À medida que os desastres relacionados ao clima se tornam mais frequentes e intensos, a recuperação torna-se ainda mais complexa. O segredo para uma recuperação bem-sucedida está em uma preparação eficaz, financiamento flexível e contínuo, e um compromisso com a equidade que permita às comunidades não apenas retornar ao que eram, mas avançar rumo ao que podem ser.

Os dados da Pesquisa Doação Brasil iluminam perspectivas de avanço. Embora apenas 10% dos doadores emergenciais digam doar exclusivamente em contextos de desastre, 40% também doam em outros contextos. Isso representa uma oportunidade. Se mesmo uma parcela desses doadores, que já contribuem em momentos não emergenciais, for incentivada a investir na recuperação contínua e na preparação, o potencial de impacto sustentável é enorme.

A confiança, no entanto, é a barreira que precisamos enfrentar. Apenas 30% dos brasileiros acreditam que a maioria das ONGs é confiável, e quase metade parou de doar após se deparar com notícias negativas. Transparência, prestação de contas e narrativas envolventes são fundamentais, não apenas para captar recursos nas primeiras semanas, mas para conquistar a confiança do público nos meses e anos seguintes. Os doadores querem ajudar; mas também querem entender para onde vai seu dinheiro e qual diferença ele faz.

Os próprios doadores estão nos apontando o caminho: investir em uma sociedade civil local forte. Apoio flexível (incluindo despesas operacionais gerais) ajuda as ONGs a desenvolverem sistemas financeiros, práticas de prestação de contas e capacidades de comunicação necessários para receber recursos e relatar impactos programáticos. As organizações mais próximas das comunidades afetadas são também as mais capacitadas para oferecer soluções, mas precisam de recursos antes, durante e depois dos desastres. Ao encarar a recuperação como algo que vai muito além da emergência imediata, conseguimos ver as oportunidades que temos para investir em uma recuperação equitativa e de longo prazo.

Não podemos impedir todos os desastres, mas podemos construir sistemas que tornem nossa resposta mais equitativa e eficaz. Isso começa com o reconhecimento de que emergências não são apenas momentos de perda; são momentos de escolha. Vamos doar apenas uma vez, ou vamos doar de forma a construir algo duradouro?

A mídia a serviço da cultura de doação

*Por Vinicius de Oliveira Barrozo, analista sênior de valor social na Globo

É inegável que, historicamente, a mídia exerce impacto na relação da sociedade com as causas sociais. Quando o assunto é cultura de doação, os meios de comunicação, principalmente a TV aberta com seu massivo alcance de público, são capazes de gerar grandes mobilizações através do estímulo à solidariedade e à empatia, sentimentos que despertam a conscientização sobre a necessidade do outro. E ainda, o trabalho da mídia pode ser um potente combustível para que o desenvolvimento dessa cultura seja acelerado.

A Pesquisa Doação Brasil mostrou que a procura por informações se tornou uma das peças-chave na trajetória da doação: 83% dos entrevistados afirmam que gostam de estar bem-informados sobre as organizações antes de doar. Nesse sentido, a mídia, em geral, tem potencial de ser uma forte aliada da cultura de doação, já que dentre as redes que mais impactaram a decisão de doar no ano passado, campanhas, anúncios, programas na TV, rádio, revistas etc., figuram em terceiro lugar, após as redes pessoais do doador, com um aumento expressivo em relação à edição de 2022.

Considerando o valor de uma boa comunicação a serviço de brasileiros que precisam de ajuda, é fundamental a atenção na construção de narrativas positivas que superem estigmas sobre a doação. Isso porque, por outro lado, a pesquisa destacou que quase metade dos doadores brasileiros (49%) afirma que já deixou de fazer alguma doação ao ver notícias negativas na mídia sobre o assunto. É fundamental o cuidado para que o caminho da mensagem, mesmo que negativa, ainda seja capaz de contribuir para que o doador se sinta informado em tom de alerta, sem que isso enfraqueça o estímulo a futuras doações, mas reforçando o olhar atento para a boa reputação de uma organização como um dos seus principais motivadores. Na pesquisa de 2024, a confiança na instituição apoiada aparece como importante fator para doar (81%), o que confirma a relevância da cautela no comportamento do doador.

Entretanto, para não-doadores, a desconfiança cresce. Com aumento de mais de 15 pontos percentuais na comparação com a pesquisa anterior, a falta de transparência é o segundo motivo para não doar, após as condições financeiras. Vale ressaltar que, aqui, também é essencial refletir sobre como as organizações podem expressar mais  clareza de seus processos e informações através de seus canais de comunicação disponíveis. Para a mídia, isso resultaria em mais insumos na construção de narrativas inspiradoras, que podem até mesmo atrair não-doadores e ajudar a reverter o quadro de desconfiança para esse perfil.

Mas, construir confiança e clareza para mobilizar é desafiador. Segundo a Pesquisa, apenas 30% dos entrevistados acreditam que a maioria das ONGs é confiável e somente 33% acham que elas deixam claro o que fazem com o dinheiro. Credibilidade é uma palavra que precisa caminhar permanentemente com os esforços de comunicação. Em 2020, durante a pandemia do coronavírus, a Globo criou a plataforma ParaQuemDoar para unir quem quer doar a quem precisa receber. Era uma maneira de dar visibilidade ao trabalho das principais organizações sociais frente ao cenário. O apoio da área de Compliance da Globo e da Benfeitoria, foi também a forma encontrada para dar confiança ao público de que o dinheiro iria diretamente para organizações de referência e com boa reputação.

De lá pra cá, a Globo vem ampliando seu engajamento e o ano de 2024 foi particularmente de grande aprendizado. Se na pesquisa, dentre as causas que mais receberam doações, as situações emergenciais ocupam o segundo lugar, num crescimento de 17 pontos percentuais em relação ao ano de 2022, isso tende a se conectar, por exemplo, com a contribuição da ParaQuemDoar que, durante as enchentes no Rio Grande do Sul, convidou o brasileiro a doar através de uma plataforma segura e chancelada por uma marca de mídia já reconhecida como a Globo. Apenas em maio de 2024, 34 milhões de reais foram arrecadados para as vítimas no Sul.

É inquestionável que nas situações mais críticas o potencial do doador brasileiro se eleve. Mas, e quando a comoção nacional diminui e outros assuntos passam a ganhar visibilidade? De que a maneira também a confiança e clareza das informações pela mídia também pode contribuir para tornar a cultura de doação regular da mesma maneira quando exerce um forte impacto nas emergências? É hora de a mídia se perceber como aliada constante no desenvolvimento da cultura de doação, dando visibilidade ao trabalho de organizações sociais, gerando transformação e promovendo um país mais solidário.